O grupo é a Procalçado, um dos maiores fabricantes de componentes para calçado na Europa, mas confunde-se com a For Ever, a sua primeira marca, criada em 1973, para dar corpo à vontade de José Ferreira Pinto, operário do setor do calçado, de avançar com um negócio próprio, de solas, que desenhava e subcontratava a outros. Hoje, 50 anos passados, a Procalçado não só fabrica solas para as maiores marcas europeias de calçado, como tem as suas próprias marcas, a Wock, no segmento profissional, e a Lemon Jelly, na moda. E são estas que quer escalar e torná-las "grandes". Não lhe basta ser uma referência na Europa, José Pinto, filho do fundador e atual presidente executivo, quer integrar o top 10 europeu nesta área até 2030. Em 2025, quer a fábrica a atingir a neutralidade carbónica..Esta é uma história de superação, feita de conquistas, mas também de dificuldades e de desafios e que é contada por décadas. A dos anos 80 marca o nascimento do grupo industrial, com a aquisição de uma fábrica em São João da Madeira e a criação, em 1984, da Procalçado, enquanto a década seguinte foi o tempo da internacionalização, com a presença massiva em feiras na Europa, na Ásia e na América do Norte, o que gera um processo de grande expansão, com a empresa a concorrer com "mercados mais desenvolvidos", como a Itália, a Alemanha ou a França, e a afirmar-se "não só pela inovação e design, mas também pela oferta diferenciadora", explica José Pinto..Já a entrada do novo milénio trouxe a deslocalização das multinacionais para fora da Europa, em busca de produtos mais baratos, e a Procalçado ainda considerou fazer o mesmo, acompanhando os clientes. Índia, Marrocos, Brasil e o Leste europeu foram mercados estudados, mas a aposta foi manter a atividade por cá, "o que obrigou a repensar tudo, porque não valia a pena ficar na Europa se não houvesse produção". A solução foi investir em novas tecnologias e oferecer produtos diferenciados. Começaram os primeiros ensaios na produção de calçado injetado e nasceu a Wock, marca vocacionada para ambientes hospitalares, hotelaria e restauração, e que, 20 anos mais tarde, em plena pandemia, teve um boom de procura imenso, com impacto nas exportações de calçado injetado do país..A partir de 2010, nova expansão, com novos investimentos, aumento de capacidade produtiva e "uma oferta 360º", associando o design a toda a tipologia de produtos do grupo. É a década da criação da Lemon Jelly, a marca divertida de calçado injetado com aroma a limão, e de apresentar a For Ever ao mercado de uma forma diferenciada, com colaborações com designers de renome, como Shoe Surgeon, Mr Bailey ou Concept Kicks, entre muitos outros..Já a década de 2020 tem sido marcada pela comunicação de uma estratégia de sustentabilidade que já vem de trás, mas que só agora parece ter despertado o interesse dos consumidores. Desde 2010 que a Procalçado tem painéis solares e tem vindo crescentemente a inovar no processo de reciclagem e economia circular..Hoje, o grupo ocupa quase 19 mil metros quadrados em Pedroso, Vila Nova de Gaia, onde emprega 400 pessoas, fatura qualquer coisa como 38 milhões de euros e chega a 50 mercados em todo o mundo. Mas quer ir mais longe. Não pelo propósito de crescer só por crescer, mas porque José Pinto acredita que a missão de um empresário "é fazer a diferença no país e ser um exemplo". E, por isso, sempre que o ano o permite, a Procalçado partilha os lucros com os seus trabalhadores, além de uma série de outras regalias implementadas na empresa. Não admira por isso que não tenha grande dificuldade em contratar, e a rotatividade de mão-de-obra seja baixa.."Temos uma empresa com ambição internacional, com uma clara noção que queremos ser grandes e isso atrai as pessoas. Tentamos ter as melhores condições e as melhores práticas possíveis para garantir que oferecemos a melhor proposta de valor. Não é só o salário, é muito mais do que isso", garante José Pinto, que tem colaboradores com mais de 40 anos de casa e famílias que nasceram dentro da Procalçado..Uma longevidade que se estende aos parceiros. A Ecco é o cliente mais antigo, com o qual trabalha há 50 anos, a par de outros que foram chegando depois, como a Birkenstock ou a Gabor. Nas marcas de luxo, que o empresário evita nomear, é sabido que nomes grandes como Louboutin e Balenciaga, entre outros, compram solas For Ever..E se é verdade que 2022 foi "o melhor ano de sempre" do grupo, 2023 trouxe consigo uma "viragem estratégica, com as grandes marcas a regressarem à Ásia". Por outro lado, a guerra na Europa, o disparar das taxas de juro e da inflação estão a provocar uma quebra de consumo. A crise está aí, mas é "só mais uma", diz o empresário, que recusa pensar numa eventual deslocalização. "Temos que nos ajustar à realidade, mas acredito que temos de ser capazes de criar valor acrescentado aqui. Não vou criar riqueza para outro lado quando posso criá-la em Portugal", sublinha. A capacidade de desenvolver produtos diferenciados para cada cliente e costumizar as soluções que oferece é "a grande mais-valia da empresa", que terá de continuar a inovar e a reinventar-se..Submetidos e à espera de aprovação estão já projetos de investimento na ordem dos cinco milhões de euros, para implementar até 2025, focados na eficiência produtiva e energética, com a compra de novos equipamentos e a implementação de novas tecnologias, de modo a assegurar a tão ambicionada neutralidade carbónica.."A nossa missão e visão do negócio não se alteraram. Nem as crises nem os momentos bons alteram a direção que queremos tomar. Queremos continuar a ser uma referência em inovação na nossa indústria. Continuamos a acreditar profundamente que, a partir deste canto do mundo, conseguimos fazer a diferença e criar projetos relevantes. Só temos que manter o foco", frisa o empresário. E, por isso, 2023 será um ano de "voltar um bocadinho atrás", de modo a preparar as bases para novo salto mais à frente. "É tempo de escalar os negócios. Estivemos a prepará-los para isso e agora há que representar o modelo de crescimento. É uma década super interessante que temos pela frente", promete.