
As candidaturas à destilação de crise terminaram a 16 de agosto e, embora o prazo oficial estabelecido para a divulgação dos dados tenha terminado na segunda-feira, o Instituto da Vinha e do Vinho (IVV) ainda não avançou com a sua publicitação. Aguarda, sabe o DN/Dinheiro Vivo, pelo cruzamento e validação de informação com a Autoridade Tributária, já que os produtores que importaram vinhos, ou comercializaram vinhos do exterior, nos últimos três anos, estão impedidos de candidatar excedentes à destilação, que é apoiada por Bruxelas com 15 milhões de euros. As candidaturas submetidas abrangem mais de 40 milhões de litros de vinhos tintos com denominação de origem ou indicação geográfica, o que excede as verbas disponíveis de apoio. Fontes do setor admitem, no entanto, que o rateio venha a ser mínimo na medida em que uma parte dos vinhos candidatados não cumprem as regras definidas. Decisões são esperadas nos próximos dias.
A falta de anúncio dos dados oficiais gerou polémica num setor que está já a colher uvas em praticamente todo o país, mas que continua com as adegas cheias de vinho de anos anteriores e não sabe onde vai guardar o deste ano. Para contornar a situação, o IVV informou ontem as comissões vitivinícolas regionais (CVR) que os produtores que submeteram pedidos de entrega de vinhos para destilar - darão origem a álcool destinado exclusivamente a fins industriais ou energéticos e serão pagos a 42 cêntimos por litro em todo o país e a 75 cêntimos no Douro - poderão avançar já com a entrega dos mesmos em fase prévia à aprovação da candidatura. O controlo caberá às CVR, sendo que o uso deste procedimento de entrega antecipada está condicionado a pedido expresso dirigido ao IVV.
Uma medida que a Associação Nacional das Denominações de Origem Vitivinícolas (Andovi) considera simultaneamente positiva, na medida em que “é urgente libertar espaço de armazenamento nas adegas”, mas arriscada, porque “coloca o ónus nos operadores de, sob sua responsabilidade, poderem começar já a fazer entregas, sem saberem ainda se vai ou não haver rateio”, diz Toscano Rico, presidente da Andovi e da CVR da região de Lisboa. Recorde-se que no ano passado - esta é a quarta destilação de crise em Portugal nos últimos cinco anos - o rateio foi de quase 50%, ou seja, não houve dinheiro para metade da quantidade de vinho que o setor queria mandar destilar.
No Alentejo, a região que mais vinho se propõe destilar, com 12 milhões de litros candidatados (Lisboa terá submetido cerca de 9,5 milhões de litros e o Douro mais de 11,3 milhões), a entrega antecipada foi bem recebida e Francisco Mateus, presidente da CVR local, admite saber de casos de produtores que já fizeram esse pedido ao IVV. “Havendo capacidade do destilador para receber o vinho, quanto mais depressa este sair das adegas melhor, porque vão já libertando espaço, o que é importante nas regiões onde a vindima está já mais avançada”, sustenta.
No Douro, sabendo-se que as verbas disponíveis - oito milhões de euros no total, sendo 4,5 milhões de fundos de Bruxelas e 3,5 milhões de saldos de receitas próprias do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto - dão para destilar 10,7 milhões de litros, assume-se que não haverá rateio ou que será diminuto. António Filipe, da Associação das Empresas de Vinho do Porto, admite que o vinho candidatado “peca por ser baixo” face ao que é o excedente crónico de vinhos DOC Douro. Rui Paredes, representante da produção, assume que a destilação “não é a solução, mas vai ajudar alguma coisa”, conjuntamente com “o fecho da região à entrada de vinhos de fora”.
Contactado, o presidente do IVV lembra que “França, Alemanha e Portugal enfrentam uma grave crise no setor, devido ao declínio do consumo global de vinho, em simultâneo com a venda, abaixo do preço de custo, de vinhos a granel, desde a maior região produtora espanhola, Castilla-La Mancha, cuja área de vinha (450 mil hectares) é duas vezes e meia a área total de vinha em Portugal (180 360 hectares)”.
Bernardo Gouvêa dá ainda nota de esforços concertados de aumento da fiscalização no setor, além de uma alteração que o IVV se propõe fazer nas regras de rotulagem, de modo a tornar claro para o consumidor qual a origem dos vinhos. Ou seja, em vez da menção vinho da UE, terá de indicar quais os países de proveniência. O IVV aguarda os contributos do Conselho Consultivo do setor, onde estão representadas todas as organizações, até 13 de setembro.
Destaca ainda, entre outras iniciativas, que o IVV "propos, dentro da mais recente reprogramação PEPAC, novas medidas de apoio ao investimento e de reforço das já existentes, de forma a manter a vitalidade e modernidade do setor". Lembra que houve, desde o início de 2023, de um reforço das verbas para o controlo das Comissões Vitivinícolas Regionais executarem os planos de controlo que o IVV materializou, em conjunto com as referidas entidades, bem como da dotação para a promoção dos vinhos de Portugal, nos próximos avisos de abertura a serem lançados, ainda em 2024. "Os objetivos, na exportação, podem e devem ser mais ambiciosos", defende Bernardo Gouvêa.