Aalta dos preços da energia tem pesado nos orçamentos familiares, uma situação que foi agravada pela guerra e que contribuiu para que a cotação do gás natural disparasse. Para mitigar o agravamento da fatura energética, o governo relançou em abril deste ano o Programa Bilha Solidária, que previa a comparticipação de dez euros por garrafa, por mês, aos beneficiários da tarifa social de energia elétrica e de prestações sociais mínimas. Durante os três meses em que vigorou, o apoio abrangeu 25 542 botijas no montante de 255 420 euros, de acordo com os dados fornecidos ao DN/Dinheiro Vivo pelo Ministério do Ambiente.
O valor total gasto pelo Executivo corresponde a 6,3% da verba de quatro milhões de euros que tinha reservado para este programa que iria abranger os mais de 800 mil beneficiários da tarifa social de energia. Em maio, o apoio foi ainda alargado a todas as famílias titulares de prestações sociais mínimas. Mas, em média, o programa foi procurado por cerca de oito mil famílias por mês. Em abril abrangeu 7512, em maio 9518 e em junho o número recua para 8512.
A explicar a fraca adesão estiveram fatores como a falta de divulgação deste apoio e a burocracia do processo para as famílias serem ressarcidas, segundo a Deco. "O principal feedback foi a ausência de divulgação junto de quem podia ter direito ao programa, nem sabiam da sua existência", explicou Elisabete Policarpo ao DN/Dinheiro Vivo.
A jurista da associação de defesa dos consumidores referiu ainda que o outro ponto que pode explicar o baixo número de apoios prende-se com a burocracia desta medida temporária que foi criada para responder à atual crise energética. "O processo em si não é facilitador e estruturado", comentou.
Para aceder a este apoio, os consumidores tinham de dirigir-se a um balcão dos CTT e apresentar uma fatura que comprovasse a aquisição da bilha de gás, com data posterior a 1 de abril de 2022, assim como um documento de identificação do titular do contrato de eletricidade beneficiário de tarifa social ou documento comprovativo do recebimento de uma das prestações sociais mínimas. O pagamento era depois efetuado em numerário no momento da apresentação da documentação e após confirmação da elegibilidade.
Uma política que segundo a jurista da Deco não é a mais indicada. "Muitas destas famílias, abrangidas pelo apoio, estão a contar os tostões todos os meses e pagar em avanço pode ser um problema", sublinhou.
Face a esta situação e ao contexto atual que mantém a alta dos preços, a Deco considera que o governo deveria equacionar avançar com outras medidas mais estruturadas como a introdução de um apoio semelhante à tarifa social para os consumidores de gás de botija.
"Metade das famílias com tarifa social usam gás de botija", relembrou a responsável, acrescentado que, tal como houve a extensão da tarifa social aos consumidores de gás natural no ano passado, é algo que faz sentido para aquele segmento.
Para mitigar o aumento dos preços da energia, na sexta-feira passada o governo voltou a fixar preços máximos para o gás engarrafado, tal como já tinha acontecido durante a pandemia da covid-19. Uma decisão que teve por base a proposta recebida do regulador do setor energético (ERSE) e o parecer da Autoridade da Concorrência. Isto apesar de o regulador da concorrência ter alertado para os "riscos" da fixação de preços administrativos pelos governos em contexto de aumento de inflação, defendendo que podem funcionar como "ponto focal de conluio".
Com os novos tetos máximos, que entraram em vigor esta terça-feira, uma garrafa de butano de 13 quilogramas (kg) terá como valor máximo 29,47 euros, enquanto as garrafas de 12,5 kg vão custar até 28,34 euros, o que permitirá uma poupança entre 3,180 euros e 6,206 euros por garrafa, segundo as contas do Ministério do Ambiente.
As duas introduções administrativas no mercado, como forma de forçar uma revisão em baixa do preço de venda ao público, foram defendidas pela ERSE tendo em conta o "grau de concentração dos mercados grossista e retalhista" e a e estratégia de preços semelhante.
De acordo com a análise do regulador, o mercado de gás engarrafado, que corresponde a 54% do consumo total de gás de petróleo liquefeito (GPL), é dominado por três operadores: a Galp Energia, a Rubis e a Repsol representaram cerca de 70% a 80% do mercado este ano.
Além disso, os preços de venda (PVP) "evidenciam pouca aderência à evolução dos mercados internacionais", sendo este um aspeto recorrente já apontado pela ERSE no relatório de análise ao setor do GPL embalado 2018-2020. "Em períodos de grande volatilidade, como o atual, são percetíveis atualizações de preço em base mensal. Todavia, em períodos de alguma estabilidade, como os dois anos que antecederam a pandemia de covid-19, designadamente em 2018 e 2019, foi notório o não-ajustamento dos PVP do GPL embalado à variação das cotações nos mercados internacionais", segundo o parecer do regulador.
Outro dos aspetos destacados pela ERSE, e que também tinha sido apontado no relatório de 2020, é a "muito baixa diferenciação das ofertas comerciais". Segundo as conclusões do regulador, as três principais marcas em atividade no mercado - Galp, Repsol e Rubis - "têm estratégias de pricing praticamente coincidentes".