Projeto do PS sobre teletrabalho "não facilita" aplicação da lei, dizem coordenadores do Livro Verde

Coordenadores científicos do Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho defendem opção técnica de concentrar alterações no Código do Trabalho e não em legislação à parte.
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Os coordenadores científicos do estudo promovido pelo governo para a regulação de novas formas de trabalho, o Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho, consideram que a criação de legislação autónoma para regulamentar o teletrabalho, conforme propõe um projeto apresentado pelo PS no parlamento, não facilita a aplicação da lei.

A preferência dos coordenadores, Guilherme Dray e Teresa Coelho Moreira, foi manifestada esta terça-feira no parlamento, numa apresentação junto dos grupos parlamentares das linhas de reflexão propostas no Livro Verde que esteve em discussão na Comissão Permanente de Concertação Social e que serão sujeitas a consulta pública.

"Do ponto de vista técnico, como aplico o Código do Trabalho diariamente, obviamente prefiro que a legislação esteja concentrada no Código do Trabalho. Sem dúvida", considerou Guilherme Dray, questionado pelo deputado José Soeiro, do Bloco de Esquerda.

"Em termos de segurança jurídica, em termos de transparência, em termos de maior facilidade do ponto de vista da aplicação do direito é mais fácil - e, por isso, é que houve um caminho para a codificação - do que termos legislações avulsas, extravagantes, que vão concretizando. Se não chegamos à situação que tínhamos antes do Código do Trabalho, em que tínhamos dezenas de leis avulsas sobre várias matérias, e não facilita muito do ponto de vista técnico", considerou o especialista.

"Temos uma codificação, temos um Código do Trabalho. Creio que a regulamentar sobre esta matéria deve ser no próprio Código do Trabalho", defendeu também Teresa Coelho Moreira.

Os deputados procuraram sondar as opiniões dos coordenadores do Livro Verde num momento em que a comissão parlamentar de Trabalho e Segurança Social analisa e procura fazer convergir na especialidade dez projetos de lei para regulamentação do teletrabalho e do direito a desligar, apresentados por PS, PSD, BE, PCP, CDS-PP, PAN, PEV e pela deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

A proposta do PS, defendida a 5 de maio no parlamento pela líder parlamentar Ana Catarina Mendes, faz a opção por uma lei "extravagante", no sentido em que será legislada enquanto regime autónomo do Código do Trabalho, ao invés de colocar "pensos rápidos nos sete artigos do Código do Trabalho". O PS argumenta que essa autonomização já existe na legislação laboral relativa, por exemplo, à segurança e saúde no trabalho.

O projeto socialista também prevê a definição em acordo de teletrabalho de um horário no qual o trabalhador aceita ser contactado pelo empregador, que poderá ser diferente do horário de trabalho. Recebe também as críticas do Bloco de Esquerda, que também sobre este ponto quis saber as opiniões do coordenadores do Livro Verde.

Para Guilherme Dray, "se for para legislar não pode ser para pôr o foco nas exceções". "Seria contraproducente. A preocupação que manifestámos foi a do direito a desligar, e com a preocupação de legislar para tirar exceções ao direito a desligar", indicou sobre as linhas de reflexão do Livro Verde.

Teresa Coelho Moreira considerou também que a possibilidade de se regulamentar exceções "desfigura completamente o que se pretende com o direito a desligar ou o direito à desconexão". "Não seria a ideia de (haver) dois tempos: de existir um tempo de conexão e um tempo de trabalho. Não é essa a ideia que está na linha de reflexão para as políticas públicas", esclareceu a jurista e investigadora.

O Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho está nesta terça-feira em debate no parlamento, estando prevista a audição dos parceiros da Comissão Permanente de Concertação Social durante a tarde.

O documento, cuja discussão foi iniciada no ano passado, propõe orientações para o que poderão ser alterações no enquadramento legislativo do teletrabalho, do trabalho em plataformas digitais, da inteligência artificial, dos nómadas digitais, da contratação coletiva e da segurança e saúde no trabalho, entre outros aspetos do mundo do trabalho.

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