Quem tudo quer, às vezes, tudo deita a perder

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Esta semana assinalaram-se os 100 dias da presidência de Donald Trump e, curiosamente - ou não - nessa precisa data, o Bureau of Economic Analysis (BEA) do Departamento do Comércio revelou que o Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA registou uma contração de 0,3% durante o primeiro trimestre de 2025, face a igual período do ano passado. No último trimestre de 2024, a economia americana tinha crescido 2,4%. A última vez que a economia dos EUA tinha registado uma contração homóloga em termos trimestrais foi em 2022, também nos primeiros meses do ano. Os analistas do BEA justificaram esta evolução com o aumento das importações, uma consequência direta da imposição de tarifas por parte da nova administração norta-americana. “Em comparação com o quarto trimestre, o abrandamento do PIB real no primeiro trimestre refletiu um aumento das importações, uma desaceleração das despesas de consumo e um abrandamento das despesas públicas, que foram parcialmente compensados por aumentos do investimento e das exportações”, leu-se no comunicado libertado no passado dia 30 de abril.

A juntar-se a isto, houve ainda uma forte volatilidade a marcar os mercados acionistas, tal como temos dado a saber aos leitores ao longo das últimas semanas, com os principais índices de Wall Street a entrar em bear market, com os investidores a dar sinais claros de desconforto perante as políticas económicas que têm sido anunciadas. No mesmo sentido, a inflação naquele país também subiu, com o índice de despesas de consumo pessoal (PCE) a registar uma taxa homóloga de 3,6% no primeiro trimestre. “Excluindo os preços dos produtos alimentares e da energia, o índice de preços PCE aumentou 3,5% [no primeiro trimestre], em comparação com um aumento de 2,6%” no trimestre anterior, lê-se no mesmo documento.

Já durante o dia de ontem a McDonald’s revelou que tinha registado uma surpreendente queda nas vendas globais do primeiro trimestre do ano (-1%), quando era esperado um aumento de 0,95%. No mercado dos EUA, a queda foi a maior desde a pandemia: -3,96%. O CEO da maior cadeia de fast-food, Chris Kempczinski, afirmou que a empresa está a enfrentar as “mais difíceis condições de mercado”, com os consumidores a retrair-se tanto em visitas quanto em gastos. Outras cadeias de restauração como a Domino’s Pizza, a Chipotle Mexican Grill e o Starbucks já tinham avisado de que os consumidores norte-americanos estão a gastar menos - o que, num país onde sobretudo nas grandes cidades se vive de jantares fora, diz muito sobre o ambiente que se vive.

Mas o presidente Donald Trump já veio garantir que não é da sua responsabilidade sua o que está a acontecer na economia - a culpa é de Joe Biden, diz. “Este é o mercado acionista do [ex-presidente Joe] Biden, não de Trump. Eu não assumi o controle até 20 de janeiro “, escreveu o presidente da maior economia do mundo na sua conta no Truth Social. “Isto vai demorar algum tempo, não tem nada que ver com tarifas, apenas com o facto de que ele nos deixou com números maus, mas quando o boom começar, será como nenhum outro. Tenham paciência!!!” escreveu .

Importa recordar que as empresas de Trump-empresário perderam, entre 1985 e 1994, cerca de 1,17 mil milhões de dólares. E que muitas delas foram à falência, apesar de o presidente norte-americano se considerar um gestor de sucesso. Tal como já aqui escrevi, nada disto pode surpreender - Trump está a governar os EUA segundo a sua própria “Arte da Negociação”. Uma das coisas que defende é que “as pessoas querem acreditar que uma coisa é a maior, a melhor e a mais espetacular. É o que chamo de hipérbole verdadeira. É uma forma inocente de exagero e eficiente de promoção”. O problema é que, de momento, nem investidores, nem empresários, nem sequer consumidores estão a acreditar no ‘boom’ de que fala Trump. E não há nada pior para a economia global do que o drescrédito generalizado na maior economia do mundo. Não será por acaso que os antigos dizem que “quem tudo quer, tudo perde”. O que é dramático é que quem mais vai perder, aqui, não é quem tudo quis - é quem apanha com os efeitos colaterais da ambição desmedida.

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