Ramirez já recebeu a sexta geração e quer manter-se nas mãos da família

Os EUA valem 15% das exportações da empresa. Para já, nenhum cliente suspendeu encomendas, mas é preciso aguardar pelos novos episódios desta guerra tarifária. No horizonte, há outras oportunidades.
Manuel Ramirez,  tetraneto do fundador e presidente da conserveira.
Manuel Ramirez, tetraneto do fundador e presidente da conserveira. D.R.
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A sexta geração da família Ramirez já se senta à mesa da administração da mais antiga conserveira de peixe em laboração do mundo. É um sinal claro que a empresa lançada em 1853 por Sebastian Ramirez irá continuar sob a alçada dos descendentes. Mas, se dúvidas houvesse, Manuel Ramirez - tetraneto do fundador e presidente da empresa -, rapidamente as dissipa: “Enquanto cá estivermos, não há hipótese nenhuma de venda”. E sublinha: “O meu filho António agarrou com muita força e paixão as responsabilidades. Está tudo a funcionar muito bem”. Aliás, defende, neste clima de volatilidade económica “modelos como estes podem ser vencedores”.

Na Ramirez, a instabilidade provocada pela guerra tarifária desencadeada pelo presidente dos EUA, Donald Trump, ainda não se fez sentir, apesar do mercado norte-americano valer 15% das exportações. “Continuamos a receber as encomendas com normalidade”, mesmo com a ameaça de uma taxa alfandegária de mais 20%, diz Manuel Ramirez. No entanto, “um cliente para o mercado anglo-saxónico, que está nas principais cadeias, escreveu-nos a demonstrar alguma preocupação”, conta. “Tínhamos um projeto de distribuição em desenvolvimento, onde teríamos alguma participação, e agora vamos estudar”, acrescenta.

Até porque, “os preços vão explodir, toda a gente vai tentar negociar com Trump”. Para os EUA, a conserveira portuguesa vende “bastante sardinha, algum atum para comunidade portuguesa e ainda saladas de atum e salmão”. No primeiro trimestre deste ano, as vendas da Ramirez estavam em crescimento, mas “agora está tudo muito convulso”. Esta situação com os EUA “é preocupante”, reconhece o empresário.

Mas há oportunidades na calha. Em Marrocos, a indústria está sem saída, diz. “Andaram a sugar o fundo dos mares para fazer farinhas e atualmente têm pouca biomassa da sardinha [peso da espécie no mar]. Portugal tem aqui uma possibilidade real”, frisa. Por exemplo, Marrocos não está a conseguir abastecer o mercado inglês, o que abre uma porta ao crescimento da conserveira neste destino. Há também possibilidades de reforçar as vendas para França e Alemanha, admite.

Com 50 mercados de exportação, a Ramirez tem por onde diversificar. O Brasil continua a crescer, os destinos em África, mesmo com o foco no preço, estão bem, assim como França, Canadá e a América Latina, diz. Na Bélgica, a marca própria Cocagne mantém-se líder no mercado. No entanto, as vendas para o exterior caíram ligeiramente em 2024, quebra que foi compensada pelo crescimento de 14% em Portugal. Feitas as contas, a faturação manteve-se na linha dos 34 milhões de euros, com a sardinha e o atum a representarem 90%. O EBITDA atingiu os três milhões.

Mais verde

A campanha da sardinha está prestes a arrancar e, no verão, a indústria deverá voltar a ostentar a certificação da sustentabilidade da pesca Marine Stewardship Council (ou MSC). O processo de avaliação iniciou-se no ano passado, depois da retirada em 2014 do rótulo devido à forte quebra de stocks no mar. Como lembra Manuel Ramirez, “de 80 mil toneladas, passámos para cerca de sete mil. Hoje, Portugal terá perto de 34 mil”. Na sua opinião, esta gestão de biomassa deveria ser estendida à cavala.

A preocupação com a sustentabilidade estende-se também à produção. A fábrica da Ramirez está a caminho de garantir 60% das necessidades de energia. Como explica o empresário, a unidade instalou painéis fotovoltaicos, recorreu a tubos solares para garantir luz natural na fábrica e nos escritórios e tem ainda uma central de biomassa que alimenta as caldeiras. A água das chuvas é também retida em cisternas para reutilização e os subprodutos do peixe são vendidos para rações de animais.

A componente social é outra das preocupações da empresa, Com 220 trabalhadores, 80% mulheres, a Ramirez continua a ter nas suas instalações uma creche para receber os filhos das funcionárias até aos três anos. Também disponibiliza transporte para a unidade. Como frisa o empresário, a Ramirez 1853 (assim se designa o polo industrial inaugurado em 2015, em Lavra, Matosinhos) quis ser “um lugar de excelência a todos os níveis”.

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