É inevitável associarmos Donald Trump a autoritarismo, imprevisibilidade, inconstância ou mesmo caos. Tudo o que a economia global não precisa numa conjuntura marcada, também ela, pela volatilidade e incerteza. Por isso, o regresso do líder republicano à Casa Branca é um fator de instabilidade a somar à turbulência em que vive o mundo, com reflexos negativos nas relações comerciais e nas cadeias de fornecimento. .Para lá da instabilidade gerada pelo caráter bilioso de Trump, há a questão do protecionismo - um anacronismo político e económico que, ao longo da história, tem servido para escamotear a falta de competitividade dos países, nomeadamente dos EUA. Ora, sobre isto já sabíamos que, quer fosse republicana quer fosse democrata, a nova administração americana iria manter as políticas protecionistas em vigor. De resto, o presidente Joe Biden não só não revogou as tarifas anteriormente impostas por Trump como reforçou o protecionismo com o Inflation Reduction Act..Portanto, a Europa não pode dizer que foi apanhada de surpresa. Devia estar preparada para o agravamento da guerra comercial entre blocos económicos, mesmo que Kamala Harris fosse a vencedora das eleições. O protecionismo veio para ficar, dado que os EUA tudo farão para proteger a sua indústria e a sua tecnologia da concorrência externa. Ainda que isso possa provocar um agravamento dos preços e consequentemente da inflação..É verdade que, embora se afigurem consensuais nos EUA, as práticas protecionistas podem ainda ser mais vigorosas com a administração republicana. Durante a campanha, Trump defendeu a aplicação de uma tarifa universal de 10% a 20% sobre todos os produtos importados, o que teria um impacto brutal numa economia aberta e exportadora como a europeia. Se a UE retaliar, como fez com a China, temos os blocos económicos cada vez mais fechados sobre si próprios..Perante isto, é crucial que a Europa desperte para a necessidade de: 1) aumentar a competitividade da sua economia; 2) aprofundar o mercado único; 3) reduzir a dependência externa de matérias-primas e tecnologias. A questão da competitividade passa necessariamente por mais investimento público e privado em fatores críticos como o conhecimento, o talento, a inovação e a tecnologia. Já o mercado único, para ser mais dinâmico, precisa de ver simplificado, otimizado e harmonizado o quadro legal em que operam as empresas europeias. Por seu turno, a redução da dependência externa exige celeridade na transição verde e energética, diversificação das cadeias de abastecimento, exploração sustentável de recursos naturais na Europa e desenvolvimento de tecnologias inovadoras..Estes mesmos desafios aplicam-se à economia portuguesa. O nosso país não pode estar à espera de uma reação europeia, habitualmente vagarosa, para responder a um mundo mais protecionista. Importa criar condições para reforçarmos a nossa competitividade internacional e diversificarmos os mercados de destino das nossas exportações. Isto passa, a meu ver, por termos um Estado facilitador da atividade económica. Ou seja, os decisores públicos devem criar um enquadramento administrativo, legal e fiscal que descomplique o investimento e torne os nossos produtos mais competitivos..Não vale a pena “panicar”. Há que reagir com inteligência a um mundo mais desglobalizado, até porque Portugal pode atrair investimento com a relocalização de negócios em países próximos (nearshoring) e a regionalização das cadeias de abastecimento.