Reforma laboral: Mais flexíveis ou mais frágeis?

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A nova proposta de lei do trabalho em Portugal tem gerado intenso debate entre governo, empresas e sindicatos, e como sempre, traz ao de cima velhos fantasmas, e a questão de sempre. Ficamos mais fortes ou mais frágeis? Obviamente que em tese, maior flexibilização dos despedimentos, introdução de mecanismos de banco de horas e a simplificação de regras para pequenas e médias empresas, num mercado laboral ainda rígido como o português, são à partida necessárias para tornar o mercado de trabalho mais ágil e competitivo. O governo justifica estas medidas com a necessidade de tornar o mercado de trabalho mais competitivo, atrair investimento estrangeiro e apoiar a sustentabilidade das empresas num contexto de transformação económica acelerada. Mas num mundo que se está a tornar mais automatizado, e onde existem salários que são mais baixos, a reflexão permanece sobre se as medidas que estão a ser negociadas, estão preparadas para este ecossistema e garantir estabilidade no mercado.

A primeira reflexão a fazer tem exatamente a ver com proteção dos trabalhadores e equilíbrio social. O debate em torno desta lei centra-se precisamente no equilíbrio entre eficiência empresarial e segurança laboral, pois medidas que fragilizem demasiado o vínculo contratual podem aumentar a precariedade e a instabilidade social, com impactos no consumo interno e na coesão social. Os sindicatos têm vindo a defender que esta lógica pode abrir portas a vínculos mais frágeis e instabilidade social, agravando fenómenos como a precariedade e a redução do consumo interno — com impacto direto na coesão social. No entanto, governo tem vindo a defender que a lei preserva as garantias fundamentais e apenas introduz mecanismos de maior adaptação, sobretudo para setores mais expostos a variações de procura.

Um segundo ponto a considerar, contudo, e que não pode ser ignorado, é o efeito da lei na produtividade e na competitividade das empresas. A maior facilidade de ajustar horários e contratos pode permitir que as empresas se adaptem mais rapidamente a choques externos, reduzindo custos e aumentando a capacidade de resposta a novas oportunidades de mercado. Contudo, o desafio será evitar que esta flexibilidade seja usada apenas como redução de custos, sem contrapartida em inovação ou valorização do capital humano – ou seja em subida dos salários e da melhoria das carreiras, que é a tradicional reivindicação sindical.

Finalmente, e talvez o mais relevante, uma terceira reflexão prende-se com os efeitos de médio e longo prazo na economia, num mundo que está atualmente em mutação, com tecnologia a alimentar mais automação e com a Inteligência Artificial a prometerem moldar tudo o que conhecemos. A incerteza e instabilidade podem ter impactos negativos na qualificação e retenção de talento, sobretudo num país que já enfrenta elevados índices de emigração jovem. Contudo, se bem implementada, a lei pode gerar maior dinamismo empresarial e atrair investimento externo.

A avaliação dependerá de como for regulamentada e monitorizada, garantindo que beneficia tanto o tecido empresarial como os trabalhadores. Mas também da forma como o país souber dar resposta em termos de requalificações e mão de obra naquela que é a talvez, a maior transição industrial e tecnológica das últimas décadas. Uma coisa é certa, independentemente do formato final desta profunda reforma, o país precisa claramente de acelerar o passo e construir um enquadramento de trabalho que responda aos novos desafios, e que seja suficientemente ambiciosa para que Portugal possa atrair novos empregos – que serão de forma incontornável marcados por uma obrigatória transição digital e de qualificações da mão de obra.

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