Os custos da energia estão a começar a "queimar" as carteiras dos consumidores, mas o especialista Luís Pinho, Diretor-Geral da Helexia, estima que os preços poderão voltar aos níveis anteriores, dentro de ano e meio. A explicação e visão de Luís Pinho, gestor que coloca as renováveis no centro da discussão na primeira "Welectric Talks" conduzida pelo jornalista Adelino Dinis.
Este primeiro episódio tem como título: "Energia, crise ou oportunidade?". O Diretor-Geral da Helexia Portugal fala sobre a atual instabilidade dos preços da energia, a importância das energias renováveis, a polémica do nuclear, o potencial do hidrogénio e o desafio da eficiência energética.
Preços de energia a subir: porquê?
Para Luís Pinho, são várias as condicionantes que estão a levar ao aumento de preços da energia na Europa. Este especialista entende mesmo que "estamos a falar de uma tempestade perfeita" e explica o motivo: "Temos, por um lado, uma menor produção de energia das fontes renováveis (solar, eólica e hídrica), fruto das condições meteorológicas; depois temos, em paralelo, o aumento explosivo do preço do gás e das licenças de emissão de CO2. Outro fator a que assistimos, de forma generalizada na Europa, tem a ver com o fecho de centrais de produção de energia a carvão e também o encerramento de grande parte da capacidade nuclear alemã. Toda esta combinação de elementos, associada ao efeito que estamos a viver neste momento na Europa por força da pandemia, de um consumo e de uma procura que é, de certa forma errática, coloca alguma indefinição nos mercados", com Luís Pinho a não ignorar o efeito da tensão vivida na Ucrânia que pressiona o preço do gás.
Neste contexto volátil, o responsável da Helexia aponta ainda o dedo à organização do mercado ibérico da energia: "Tudo isto é potenciado pelo funcionamento do mercado em Portugal e Espanha, o MIBEL, replicando aquilo que acontece em muitos mercados, que o é o mercado marginalista. Ou seja, é a última capacidade necessária a entrar para suprir as necessidades do sistema elétrico nacional que define o preço para todos os outros; e isto quer dizer que, mesmo que as primeiras fontes de energia a entrar no sistema elétrico nacional tenham um custo zero, se a última capacidade a entrar no sistema tiver um preço €300/MWh, todas as outras anteriores vão receber €300/MWh. Eu antecipo que, mais tarde ou mais cedo, se calhar mais cedo, haverá uma discussão mais profunda sobre o método deste mercado marginalista, por forma que estas capacidades que são necessárias para assegurar o funcionamento contínuo e estável do sistema elétrico nacional não impactem de forma tão violenta no preço de todas as outras fontes de produção".
Preço de energia voltará aos valores de há um ano e meio, aponta especialista
O Country Director da Helexia Portugal considera, no entanto, que esta conjuntura de alta terá tendência a passar e, inclusivamente, poderemos vir a beneficiar de preços mais favoráveis: "Diria que, tendencialmente, os preços de energia voltarão aos preços que nós conhecíamos há um ano ou há um ano e meio, devido ao facto de termos uma incorporação cada vez maior de fontes de energia renovável, as quais vão compensar o fecho de centrais a carvão como a do Pego, de Sines e de outras na Europa, e o fecho de grande capacidade nuclear alemã. A incorporação de fontes de energia renovável que têm um preço marginalmente mais baixo vão acabar também por forçar os preços para baixo".
Para Luís Pinho, o sistema elétrico nacional é robusto, garantindo estabilidade e segurança de fornecimento de energia ao país. "O fecho das centrais de carvão está a ser mais do que compensado pela nova capacidade que está a entrar em produção", refere este especialista que cita, a propósito, os leilões solares dos últimos anos e a "crescente capacidade de armazenamento" que vão equilibrar o sistema.
O especialista considera que a descarbonização "é necessária" e "é hoje que deve ser feita": "Não devemos deixar espaços para gerações futuras; faz parte daquilo que é a nossa missão e o nosso legado. É uma mudança que é dura e cria discussão e medo, mas temos de a fazer e temos de a fazer agora. Às vezes, é preciso criar tensões para forçar também o desenvolvimento, nomeadamente, no caso do armazenamento de energia" para que se torne mais eficiente e mais competitiva em preço.
"Quando temos uma fuga solar, temos apenas um bom dia de sol. Quando temos uma fuga nuclear..."
Para o Diretor-Geral da Helexia, o nuclear, que voltou à baila recentemente, não é uma opção para Portugal: "Apesar de reconhecer que o nuclear tem um peso importante no mix energético, os custos e os riscos associados são demasiado preocupantes. Também não acredito muito na ideia de que o nuclear é mais barato. Além de que, como eu costumo dizer, quando temos uma fuga solar nós temos apenas um bom dia de sol. Portanto, eu prefiro que apostemos em fontes renováveis, como o vento, o sol ou o hídrico, que temos em abundância, e em sistemas de armazenamento articulados com centrais de ciclo combinado, que possam ser alternativas".
"Portugal tem condições muito interessantes, senão mesmo ótimas, para o hidrogénio"
Na perspetiva de Luís Pinho, o que se afigura como alternativa credível para Portugal é o hidrogénio: "Portugal tem condições muito interessantes, senão mesmo ótimas, para o hidrogénio, se compararmos com o resto da Europa". O Diretor-Geral da Helexia Portugal alerta, todavia, para a importância de não nos esquecermos "de que precisamos de muita energia para produzirmos hidrogénio verde. O fundamental é que esta produção de hidrogénio verde seja através da energia de fonte renovável. Apenas e só através de energia de fontes renovável. É uma condição fundamental e nós temos, comparativamente com o resto da Europa, condições para termos a energia renovável mais barata, bastando ver que que temos muito mais horas de radiação solar".
Luís Pinho declara que gostava também que em Portugal não se falasse apenas no hidrogénio verde como um produto final, mas que se pensasse de uma forma mais global em capturar todo o valor associado a esta fileira: "Neste momento, o "bottleneck" está na capacidade de produção dos eletrolisadores e acho que esta também é uma oportunidade para Portugal" que deverá investir na industrialização, pois "temos engenharia e capacidade industrial".
Eficiência energética impacta com rentabilidade
No plano das empresas, a eficiência energética impacta com a rentabilidade dos negócios e Luís Pinho diz que há muitas firmas a deitar dinheiro e recursos para a rua, devido a comportamentos de ineficiência: "Frequentemente passamos por indústrias em que não está ninguém e vemos as luzes ligadas, os ares condicionados a funcionar ao fim de semana e feriados". Luís Pinho destaca ainda que, nas auditorias que a Helexia faz, vê empresas "que têm necessidade de produzir frio e calor, mas depois no seu processo estão a desperdiçar ambos" e indústrias que estão a gastar energia no sítio errado: "Temos zonas mal iluminadas e zonas super iluminadas, mas verifica-se que as pessoas vão trabalhar em zonas mal iluminadas. Nalgumas indústrias não há ainda um conhecimento detalhado de onde é que estão a consumir energia. Não estamos a falar em investimento, mas sim de pequenas mudanças; às vezes, pequenas configurações ou reconfigurações do sistema permitem poupanças".
Carregadores Helexia diferenciadores
Relativamente à Helexia, Luís Pinho faz notar que Portugal foi a primeira geografia da Helexia a desenvolver um modelo para a mobilidade elétrica, que está a implementar, podendo agora este negócio "Born in Portugal" ser replicado nas outras geografias onde está a empresa.
Aspeto diferenciador neste modelo de mobilidade elétrica da Helexia é que os carregadores da empresa não estão posicionados na via pública. "A nossa preocupação foi, essencialmente, que os nossos carregadores estejam em locais que não sejam ponto de carga, mas que sejam um local onde o utilizador já vai com naturalidade - vai fazer as suas compras de mercearia ou para realizar obras em casa, para visitar um cliente um fornecedor, por exemplo. Isso para nós é fundamental: ser um ponto de comodidade mais do que um ponto de carga. Preocupa-nos também que nestes locais existe produção de energia de fonte renovável para garantir que esta energia elétrica e esta mobilidade elétrica seja efetivamente sustentável".
Consciência para o tema da energia
Este especialista diz que a consciencialização em torno do tema da energia será cada vez mais importante, até porque assistiremos a um "aumento contínuo do consumo de energia através da digitalização que está na nossa economia, nas nossas casas, nas nossas vidas, na nossa indústria, nos automóveis". Mediante esta realidade, Luís Pinho refere o imperativo de eficiência "nos nossos processos diários, seja na nossa casa, na nossa indústria, nos nossos escritórios", o que permitirá "alocar uma parte desta energia que não consumimos a esta crescente demanda de energia".
O responsável da Helexia no nosso país sublinha que todos os cidadãos terão de ter a noção de que, através de formas simples e pequenos gestos, é possível alterar alguns dos padrões de consumo e "com isso já sermos mais eficientes". Luís Pinho dá o seu próprio exemplo: mudou para a mobilidade elétrica ("um desafio e medo, inicialmente", assume), instalou painéis fotovoltaicos que lhe aquecem a água e lhe iluminam a casa. "Deixar as luzes desligadas é uma coisa muito simples, parece banal, mas tem um impacto muito importante. Todos temos que fazer a diferença com pequenos gestos", conclui.