Retoma ganha força no fim de 2021, mas 45% do país continua sem recuperar da pandemia

Analistas diziam, antes de eclodir a guerra na Ucrânia (no passado dia 24 de fevereiro), que apenas no segundo trimestre é que Portugal limpa totalmente o referido atraso económico.
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A retoma da economia portuguesa ganhou força no último trimestre de 2021, crescendo 5,8% em termos reais (descontando a inflação) face ao último trimestre de 2020, confirmou ontem o Instituto Nacional de Estatística (INE). O avanço tinha sido de 4,4% no terceiro trimestre, portanto, houve aqui um balanço mais favorável na reta final do ano passado.

No entanto, mesmo este balanço, que levou o produto interno bruto (PIB) anual de 2021, a subir 4,9%, (o ritmo mais elevado desde 1990), não é de todo suficiente para apagar os danos destrutivos provocados pela pandemia covid-19 em 2020. Neste ano, a recessão anual chegou a 8,4%, também esta uma marca histórica. E contas feitas, cerca de metade ou mais de metade da economia portuguesa ainda estará abaixo da linha de água marcado pelo começo pandemia.

De acordo com cálculos do Dinheiro Vivo a partir dos dados novos do INE, a economia portuguesa ainda está 3,9% abaixo do nível anterior à covid-19. Já era assim no terceiro trimestre, mas a reta final do ano passado apesar do maior dinamismo, não veio alterar o quadro de atraso.

Vários analistas diziam, antes de eclodir a guerra na Ucrânia (no passado dia 24 de fevereiro), que apenas no segundo trimestre é que Portugal limpa totalmente o referido atraso económico.

No entanto, a realidade é bastante diversa consoante os agregados da procura ou os setores da oferta considerados (onde a medição é feita através do valor acrescentado bruto ou VAB).

Ótica da procura

Na ótica da procura, as despesas de consumo familiares estão 3,1% abaixo de 2019 e as exportações totais mais de 8% aquém dos níveis pré pandémicos, muito por causa da pesada destruição de valor nas atividades de serviços ligadas ou expostas ao turismo, como alojamento, comércio, viagens.

O valor exportado em mercadorias está com um atraso de 1,6%, mas nos serviços a quebra ainda era de quase 22% face ao final de 2019.

O investimento fixo (o que foi efetivamente realizado com projetos novos ou reforçados) é o agregado que destoa. Aqui, de facto, já foram superados os níveis pré-pandemia, mostra o INE. Está 3,2% acima de 2019, em termos reais.

Apesar dos investimentos em equipamentos de transporte acusarem um tombo monumental de quase 26%, as restantes categorias acabam por compensar.

O investimento em "recursos biológicos cultivados", no fundo o investimento em agricultura, já superou em 1,8% o patamar alcançado em 2019.

O segmento designado "outras máquinas e equipamentos e sistemas de armamento" registam uma recuperação de 4,4%. O investimento expresso em "produtos de propriedade intelectual" avançou 11,5%.

Mas o mais decisivo é a construção. É o setor que maior peso tem no investimento total e supera já 5,1% os níveis anteriores à pandemia.

Ótica da oferta, por setores empresariais

A outra ótica é a da oferta. Aqui, a medição é feita, como referido, através dos VAB setoriais (ver infografia em baixo).

O VAB total a preços de base ainda se encontra mais de 3% abaixo do nível pré-covid. Para este atraso contribui o setor definido pelo INE como "comércio e reparação de veículos; alojamento e restauração". O atraso ainda é superior a 12% face ao final de 2019.

O trio "energia, água e saneamento" regista uma quebra de 4,4%, a segunda maior.

A indústria transformadora está com um atraso de 3,5%.

O setor "transportes e armazenagem; atividades de informação e comunicação" encontra-se quase 2% abaixo do ponto anterior à crise pandémica.

Estes quatro setores mencionados foram responsáveis por uma criação de valor de 77 mil milhões de euros em 2021, isto é 45% do VAB total. Ou seja, metade da economia portuguesa ainda está a caminho da saída dos efeitos nefastos da pandemia.

A compensar positivamente, está o valor acrescentado da construção, que rodará cerca de 6,6% face ao final de 2019.

Menção positiva também para o setor primário, composto por "agricultura, silvicultura e pesca", que já avançou ligeiramente e supera a crise em 0,5%, em termos reais.

"Apesar do choque sanitário e económico abrupto que levou a economia a cair 8,4% em 2020, teve início no ano passado uma recuperação saudável e espera-se que a economia volte ao seu nível pré pandémico no segundo trimestre de 2022", dizem os analistas da agência de rating DBRS, que estão mais otimistas quanto à tendência na nota da dívida soberana.

"A crise não parece ter inflingido danos económicos graves a longo prazo. Além disso, as perspetivas de crescimento são fortes nos próximos anos, apoiadas por uma maior estabilidade política após a maioria [absoluta do PS] nas eleições legislativas de janeiro de 2022, pelo facto de a população ter das taxas de vacinação mais elevadas da Europa e pelas grandes transferências [fundos] da União Europeia que visam melhorar a capacidade produtiva do País", rematam os economistas, que fecharam este diagnóstico a 22 de fevereiro, dois dias antes da nova guerra eclodir.

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