O salário base médio de praticamente um quarto dos trabalhadores da função pública ficou, em julho deste ano, a apenas um euro e 20 cêntimos daquele que será o valor do salário mínimo nacional no próximo ano: 705 euros. Os assistentes operacionais - um contingente de mais de 167 mil trabalhadores públicos, equivalente a 23% do total - recebiam em média 706,2 euros, naquelas que são, no conjunto do setor público, as remunerações que menos descolam da base salarial.
A evolução do salário mínimo nacional tem significado, nos últimos anos, suporte de ganhos salariais percentualmente mais elevados para este grupo de trabalhadores, face àquela que é a estagnação generalizada das remunerações da função pública. Desde 2011, os salários dos funcionários públicos foram atualizados em apenas 0,3% em 2020, mas para coveiros, trabalhadores do lixo, auxiliares de escolas e de hospitais, entre outros operacionais, o salário base subiu desde então dos 485 aos 665 euros. São mais 37%, ou 180 euros, que se ampliarão já no próximo ano com um incremento adicional de 6% (40 euros).
No mesmo período, o salário médio destes trabalhadores cresceu 13%, ou 80 euros, face aos 626,1 euros registados pela Direção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGAEP) em outubro de 2011.
Os dados das remunerações médias, publicados nesta última semana pela DGAEP, mostram, aliás, a quase ausência de leque salarial efetivo neste grupo de trabalhadores. Isto, apesar das garantias de progressão na carreira dadas pelo sistema de avaliação de funcionários públicos. O valor baixo do salário médio - a 6% da atual retribuição mínima, e prestes a ser consumido por ela - indica que a maioria dos trabalhadores poucas oportunidades terá tido de subir nos patamares que conduzem ao topo da carreira e a um máximo de 1256,73 euros (após vários saltos salariais que implicam por regra dez anos de trabalho, e se vierem a assumir posições de chefia).
A incapacidade de os assistentes operacionais descolarem da base remuneratória resultará de vários fatores. Desde logo, da opção do Ministério das Finanças de, em 2019, "apagar" os pontos que muitos trabalhadores tinham reunido para progressão ao recolocá-los com um salário de 635,07 euros. Terão sido perto de 70 mil os trabalhadores nesta situação num momento em que eram descongeladas as carreiras. Nesse ano, e também no seguinte, os salários mais baixos da função pública estiveram, excecionalmente, acima do valor do salário mínimo, situação que se reverteu já neste ano. A perda de pontos tem mantido muitos colados aos valores da retribuição mínima legal por mais tempo.
Outro dos fatores que poderá contribuir para a aproximação cada vez maior do salário médio será a dinâmica das contratações e cessação de contratos entre estes profissionais. Em contexto de pandemia, por exemplo, foram um dos grupos da função pública com maior crescimento. Segundo os dados da DGAEP, o universo de assistentes operacionais subia em setembro 4,1%, com mais 6616 trabalhadores que um ano antes. Quantos mais trabalhadores em início de carreira, mais baixas serão as remunerações médias.
Mas, estes não são os únicos trabalhadores da função pública cuja remuneração base média pouco foge aos mínimos fixados para as respetivas carreiras. Nas carreiras especiais, bombeiros, enfermeiros, técnicos superiores de saúde e técnicos de diagnóstico e terapêutica, e ainda o pessoal de investigação científica enfrentam o mesmo.
Além dos assistentes operacionais, os técnicos de diagnóstico e terapêutica são, entre os grupos de trabalhadores com remuneração média calculada pela DGAEP, aqueles que menos fogem à base salarial. Com os vencimentos a arrancarem em 1205 euros, conhecem uma média salarial apenas 8% acima, nos 1305 euros.
Contudo, esta é uma das médias salariais que, ao invés de avançar, tem recuado ao longo do tempo. Há uma década, os técnicos de diagnóstico e terapêutica ganhavam em média 1333 euros, mais 28 euros do que agora.
Também entre os bombeiros se observa o mesmo esmagamento. A diferença do salário mínimo ao médio vale 14%, indo de 952 a 1081 euros (mais 89 euros, ainda assim, que em 2011).
O pessoal da investigação científica tem também a remuneração média a valer apenas mais 14% do que o vencimento base à entrada da carreira. O mínimo a receber são 2298 euros, com os trabalhadores a receberem em média 2613 euros.
Já nos técnicos superiores de saúde, a diferença entre o mínimo que se pode receber e os valores médios pagos por trabalhador também vale apenas 16%, indo dos 1628 aos 1882 euros.
É ainda na saúde que se encontra outro dos grupos mais encostados à base remuneratória: o dos enfermeiros (também eles um dos efetivos mais numerosos da função pública, com mais de 53 mil profissionais em setembro). Com o salário inicial de um enfermeiro a arrancar nos 1205 euros, a média salarial não vai além dos 1455 euros, mais 21%.
A situação destes profissionais contrasta com as de médicos ou professores, carreiras específicas listadas isoladamente pela DGAEP nas quais o salário médio pode valer o dobro do salário inicial. As maiores diferenças são, no entanto, observadas entre grupos de trabalhadores muito diferentes agregados numa mesma média salarial, como na Administração Tributária e Aduaneira, onde a diferença entre salário mínimo e médio chega aos 133%. Estão em causa trabalhadores com posições remuneratórias muito díspares, sendo que o salário de um verificador auxiliar aduaneiro, o mais baixo, começa nos 892 euros, mas um analista de laboratório entra a ganhar cerca de 1326 euros.
A generalidade destes trabalhadores terá, em 2022, uma nova atualização salarial, de 0,9% ou mais, depois de o governo se ter comprometido nesta semana a acompanhar a inflação que se registar em novembro (mas descontando uma décima, por conta da inflação negativa de 2020).