
Depois de seis anos consecutivos a crescer e bater máximos históricos, as exportações de vinhos portugueses caíram 1,16% em 2023 e ficaram-se pelos 928 milhões de euros, aquém dos mil milhões estabelecidos pela ViniPortugal no seu plano estratégico 2019-2022, estendido por mais um ano por causa da pandemia. Mas já há nova meta em análise, a de chegar aos 1,2 mil milhões de euros até 2030, com o preço médio a subir para os 3,19 euros por litro.
Estes números fazem parte da proposta de plano estratégico que a ViniPortugal apresentou aos seus associados em finais do ano passado, mas cuja análise e debate foi adiado para a assembleia geral da instituição que se realizará a 22 de março.
Sobre os números de 2023, o presidente da organização interprofissional que é responsável pela promoção da marca Wines of Portugal, fala numa quebra inferior à esperada, num contexto mundial negativo. No total, Portugal vendeu ao exterior 319,5 milhões de litros no valor de 928 milhões de euros, o que dá um preço médio por litro de 2,90 euros, um cêntimo acima do ano anterior.
“O comércio mundial de vinhos caiu muito em 2023, por razões diversas, desde a inflação ao aumento das taxas de juro e do custo de vida, sem esquecer o efeito das duas guerras e a instabilidade económica com que as famílias viveram, o que levou a que as nossas exportações tenham baixado. Ainda assim, os dados dos nossos concorrentes a nível mundial apontam para quedas muito superiores à nossa, significando que, apesar de tudo, Portugal aumentou a sua quota no mercado mundial de vinhos”, diz Frederico Falcão.
Para este responsável há, no entanto, algumas “leituras positivas” a fazer dos dados do INE, a começar pela performance no Brasil, para onde seguiram quase 26 milhões de litros no valor de 80 milhões de euros, mais 8,91% em volume e 12,58% em valor do que no ano anterior. O preço médio subiu 3,36% para 3,09 euros o litro. “O Brasil correu-nos bastante bem. Ultrapassamos novamente a Argentina e tomamos o segundo lugar nas importações em volume. Num mercado que aumentou cerca de 1% as suas importações, Portugal conseguiu um bom acréscimo, de quase 9%, ao contrário do Chile e Argentina, que baixaram as suas vendas”, frisa.
Sem contabilizar o vinho do Porto, este foi, em 2023, o maior mercado de destino dos vinhos portugueses, acima dos EUA e Reino Unido. Com vinho do Porto, o top 3 é ocupado por França, EUA e Reino Unido, dos quais só este último cresceu no ano passado, mais 4,49% em valor e 6,67% no preço médio, apesar de uma quebra de 2% em volume.
Frederico Falcão destaca ainda, como fatores positivos, a “manutenção da tendência de subida” do preço médio de exportação dos vinhos portugueses e de, descontando o vinho do Porto, as exportações de vinhos nacionais terem ficado “praticamente em linha” com o ano anterior. Foram 620,6 milhões de euros contra os 621 milhões de 2022.
Quanto a 2024, janeiro não terá corrido muito bem e fevereiro parece ir pelo mesmo caminho, mas este responsável espera que as exportações retomem o trajeto ascendente, assente na recuperação de mercados importantes, como os EUA, Canadá e China. Quanto à meta para 2030, remete para a discussão do plano estratégico em março.
Entre os associados da ViniPortugal, as opiniões dividem-se. Para a Associação de Vinhos e Espirituosas de Portugal (ACIBEV), a meta de 1,2 mil milhões até 2030 “é bastante ambiciosa” atendendo ao contexto atual de retração do comércio mundial. “Não é de esperar um crescimento do consumo no mercado interno e há aqui alguns sinais de alterações de comportamentos dos consumidores que podem significar uma quebra do consumo mundial. Neste contexto acho que 1200 milhões é uma boa ambição”, diz o presidente, Jorge Monteiro, que acrescenta: “Não é fácil, mas não é impossível”.
Quanto ao documento propriamente dito, a ACIBEV está ainda a analisá-lo com os seus associados e só depois fará chegar à ViniPortugal a sua posição. Sem entrar em mais pormenores, Jorge Monteiro admite apenas que os tempos “estão um bocadinho complicados”, com alguns mercados a darem sinais de retração, situação agravada pela “perseguição” que a Organização Mundial de Saúde tem vindo a fazer ao álcool. “O importante é educar os consumidores e educar não é proibir”, considera.
Já a Associação Nacional dos Comerciantes Exportadores de Vinhos e Bebidas Espirituosas (ANCEVE) não discute a meta definida para 2030, preferindo debruçar-se sobre o plano, encomendado pela ViniPortugal à EY, e que considera que “fica muito aquém” daquilo que o setor necessita.
“Mais do que um estudo parcelar necessitaríamos de um novo estudo Porter [apresentado em 2004], que deu um boost brutal à fileira. O mundo mudou, e continua a mudar, a geopolítica, a economia, o clima, os hábitos dos consumidores, a geografia da distribuição e dos retalhistas e importadores, tudo está sempre a mudar e Portugal devia adaptar-se melhor a esta evolução brutal, inovando”, diz Paulo Amorim.
Para este responsável, os vinhos portugueses “têm hoje, fruto da revolução que se verificou na viticultura e na enologia nos últimos anos, uma qualidade que justifica um preço mais pujante e um valor acrescentado que também remunere os viticultores de uma forma mais generosa”.
Já a Associação Nacional das Denominações de Origem Vitivinícola acredita que o objetivo dos 1200 milhões em 2030 é “um valor plausível”, defendendo que é preciso “explorar outras vias” de promoção. “As grandes feiras são incontornáveis, mas precisamos de, supletivamente, ver o que podemos fazer para nos destacarmos, maximizando as tecnologias digitais”, diz Francisco Toscano Rico.
O presidente da Andovi considera ainda que “é preciso perceber como é que, debaixo deste chapéu da Vinhos de Portugal, se consegue dar mais notoriedade e visibilidade às diversas regiões”.
Sobre 2023, Toscano Rico fala num ano "especialmente difícil", em que a elevada quantidade de stocks, apesar da destilação de crise efetuada - a terceira em quatro anos, lembra - pressionou o setor. "Há uma quebra de consumo no mundo, em especial de vinhos tintos, que não é de agora mas que se está a acentuar e Portugal ressente-se. No mercado nacional, a situação é atenuada pelo turismo, mas a quebra de rendimentos das famílias não ajuda a contrabalançar a estagnação das exportações. Mas isto tem a ver com os volumes que estamos a importar, porque, apesar dos stocks estarem elevados, continuamos a fazer recordes de importação todos os meses e o vinho de mesa nacional está todo a ficar em 'casa' e a ser substituído por vinho espanhol", diz.