A panela de pressão chegou aos lares portugueses no início dos anos 60, pela mão da Silampos. A empresa de Cesar, Oliveira de Azeméis, foi a responsável pelo fabrico do primeiro espécime em Portugal, que tornou famoso com o célebre spot televisivo da "Linda Carochinha e do João Ratão". Mais de meio século depois, é hoje líder nacional da loiça metálica com a marca Silampos, e líder no mercado britânico com a Stellar. Mas o segmento de panelas de pressão continua a ser determinante para a empresa, valendo, no mínimo, 30% da faturação.
Porquê Silampos? É o resultado da junção dos apelidos dos dois sócios fundadores: Silva e Campos. Em 1978, a Silampos passou a sociedade unifamiliar e, em 2001, a sociedade anónima, mas totalmente controlada pela família Campos. Hoje, "é gerida pelo filho do fundador, Aníbal Campos, e a terceira geração está já na empresa, nas áreas comercial, de operações e de marketing.
Todos os meses saem da fábrica de Cesar 100 mil peças. Clientes e encomendas são coisas que não faltam. Bem pelo contrário. "Estamos a trabalhar em overbooking. Produzimos muito, mas estamos a trabalhar com margens muito baixas. A concorrência asiática obrigou a baixar preços e agora há que inovar. Temos de produzir artigos de maior valor acrescentado", diz o empresário. Aníbal Campos garante que a empresa não aumenta preços "seguramente há mais de dez anos" e que a solução tem sido aumentar a produtividade e reduzir custos. O que não é fácil, atendendo ao peso "absolutamente descomunal" da energia nos custos de produção de uma empresa metalúrgica. "Trabalhamos mais, mas ganhamos menos dinheiro", garante.
E quem são os principais clientes da Silampos? Embora o mercado nacional seja, ainda, determinante, as exportações vão ganhando peso crescente nas vendas da empresa. Em 2014, os mercados externos valeram já mais de 50% da faturação e este ano deverão aproximar-se dos 60%. A empresa, que conta com cerca de 200 funcionários e que continua a contratar gente, estima este ano crescer, pelo menos, 10% face aos 13 milhões faturados em 2014. "Podíamos crescer mais se tivéssemos capacidade produtiva", reconhece Aníbal Campos. Mas também isso está a ser tratado. A verdade é que a Silampos nasceu, já lá vão 64 anos, num local onde não havia nada. Hoje, a fábrica está rodeada de casas, o que gerou "graves problemas no lay-out" da empresa. Mas nem por isso pensa deixar Cesar e procurar novas paragens.
Deslocalizar é palavra proibida no vocabulário de Aníbal Campos, embora reconheça que o problema da falta de competitividade energética da Europa vai levar a uma transferência muito grande de indústrias de ponta para os EUA. Mas essa é uma hipótese que jamais colocou. "Nunca! E cheguei a ter grandes discussões com os economistas que achavam que o futuro era esse. Eles pensavam que o saber ficava aqui, em laboratórios, mas eu sou engenheiro e sei que o saber se desenvolve nos locais onde se produz. E foi isso que se foi dar aos asiáticos", frisa.
Construir uma fábrica nova, de raiz, seria o ideal. Mas está fora de questão. "Isso obrigava-me a parar e não tenho hipótese. Temos, ainda, uns milhares de metros quadrados de terreno disponível para crescer e é isso que vamos fazer, mas por fases, sistematizando e rentabilizando os layouts e a organização", diz. Até porque "os aumentos de produtividade não podem ser feitos só à custa de pessoas e máquinas".
E como imagina a Silampos daqui por dez anos? "Temos de estar atentos e acompanhar as novas tecnologias no segmento dos eletrodomésticos. E a descoberta de novos materiais, designadamente na área dos polímeros, pode mudar muito o sector", refere o empresário.
No entretanto, a Silampos continua a crescer. No último ano contratou 30 pessoas e vai continuar. A laboração contínua, incluindo sábados e domingos, será uma realidade em breve, sobretudo na estampagem e polimento. E, a partir da segunda metade do ano, todos os produtos que saírem da fábrica de Cesar ostentarão a nova etiqueta, em que por baixo da palavra Silampos passa a surgir, em destaque, o Made in Portugal. Uma exigência dos mercados asiáticos e do Médio Oriente.
Empresa de Cesar analisa parcerias na distribuição em Angola e na Argélia
Inovação não é uma palavra vã na Silampos. Não só é líder de mercado no fabrico de loiça metálica como os recentes investimentos realizados ao nível energético e na gestão da cadeia de fornecimento, da flexibilidade e da rastreabilidade de produtos, tornam-na líder na adoção de tecnologia. E não fica por aqui. Até 2017, a Silampos vai investir, entre dois a três milhões de euros, em áreas tão distintas como a expansão da fábrica, a compra de novos equipamentos, o aumento da eficiência energética, a economia digital ou a internacionalização. Tudo em conjunto acabará por permitir, estimam os responsáveis da empresa, um aumento da capacidade produtiva na ordem dos 25%.
"Temos de nos preparar para desenvolvimentos futuros, apostando crescentemente na customização, em fazer muito à medida do cliente", explica Aníbal Campos.
No imediato, a Silampos está apostada em ser mais eficiente e tem, inclusive, um estagiário contratado para trabalhar na melhoria contínua e na implementação dos processos Kaizen Lean. Garantidas que estão a certificação da qualidade e a certificação ambiental, Aníbal Campos arrancou, agora, com a certificação energética: "A loiça metálica é um produto ecológico porque ajuda a poupar energia. Mas, para isso, tem de ser fabricada numa unidade ambientalmente responsável."
O ano passado, a empresa ganhou o título de líder tecnológica ao instalar uma unidade-piloto de demonstração de integração de energias renováveis, utilizando tecnologias solares térmicas com concentração para alimentação direta de energia térmica a processos industriais. "Só no final do ano é que conseguirei avaliar totalmente os benefícios, mas julgo que pouparei cerca de dez toneladas de gás ao ano", diz o empresário. Que reconhece que a questão energética pesa cerca de 5% nos custos de produção. "Estamos a tomar medidas para melhorar os consumos, designadamente num projeto que estamos a preparar com a EDP no âmbito das redes de ar comprimido e da alteração de redes de iluminação, etc.".
E ao nível da internacionalização? Mais do que alargar o número de mercados em que está presente, a Silampos está apostada em consolidar a marca naqueles em que já está e naqueles que começam a ter uma importância crescente, como a Arábia Saudita, a Jordânia, o Egito, as Filipinas, Hong Kong ou a Indonésia. Isto sem esquecer mercados como a Argélia e Angola, onde admite vir a estabelecer parcerias na área da distribuição. "Nalguns casos poderemos entrar no capital de empresas de distribuição que são nossas parceiras", afirma Aníbal Campos. E, quando se justificar, em alguns países poderá haver pequenas unidades de acabamentos.
Em 2000, e na sequência da aquisição de um distribuidor em Inglaterra, nasceu a Silampos UK, que, com apenas 60 pessoas, já fatura mais do dobro que a casa-mãe: 20 milhões de libras, em 2014, ou seja, cerca de 28 milhões de euros. Mas a Silampos UK não vende, apenas, o produto Made in Portugal, também importa da Ásia.
Exportar obrigou a abandonar a Carochinha e o João Ratão
Criada em 1951, a Silampos assume--se como uma das primeiras empresas em Portugal a criar um gabinete de design. Foi nos anos 80, ainda, e esta aposta resultou da necessidade de reformular toda a imagem da marca para poder conquistar os mercados externos. Porquê? Porque a Silampos desenhou toda a sua estratégia de comunicação em Portugal em torno do conto infantil A Carochinha e o João Ratão e, em parte alguma do mundo, loiça de cozinha combina com ratos e carochas.
"Olha a linda Carochinha que casou com o João Ratão, diz a história tão velhinha que caiu no caldeirão; Se fosse hoje tudo mudava nas cidades e nos campos, João Ratão não se queimava pois já tinha uma Silampos." Este era o jingle do anúncio dos anos 60, que tornou popular a primeira panela de pressão desenvolvida em Portugal. Ainda hoje muitos consumidores se recordam do célebre anúncio. Mas, duas décadas depois, quando a Silampos tenta exportar os seus produtos para a Dinamarca, a estratégia revelou-se um desastre e obrigou à criação de toda uma nova imagem.
Mas o gabinete de design nasceu desde logo vocacionado para o desenvolvimento de produto, diz Aníbal Campos. E a prova disso é a linha Domus, produto que ainda hoje é líder de vendas. "É uma panela mais bojuda, que foi desenvolvida internamente para replicar o tradicional pote de ferro fundido de três pés e que ganhou uma série de prémios de design", explica o empresário.
Hoje, o desenvolvimento de produto assume uma importância acrescida e todos os departamentos se reúnem, quinzenalmente, para discutir a inovação e a criação de novos produtos. "E apostamos muito, também, na ligação com os chefs de cozinha", refere Aníbal Campos, dando exemplo da linha gourmet, na qual se incluem as cataplanas ou o grill que pode ir à mesa. Hotelaria e restauração, jardim e mobiliário urbano são alguns dos segmentos em que a Silampos também atua.