1,2 milhões de portugueses recebem o subsídio de almoço em cartão de refeição. Falta de regulador dificulta uniformização de regras, admite a Sodexo, que tem acordo com 50 mil estabelecimentos.
Atribuído como um benefício para apoiar a alimentação dos trabalhadores durante o horário de trabalho, o subsídio de refeição acaba, muitas vezes, no tapete de supermercado. O que não pode é ser usado para encher o depósito do carro ou comprar tabaco, como muitas vezes ainda acontece, esclarece Nelson Lopes, da Sodexo Portugal. As empresas estão a operar sem regulador e é preciso regras definidas e maior controlo do que pode ser feito.
“Não faz parte da intenção da Sodexo defender nem promover a separação dos produtos que podem ser comprados com cartão de refeição, por exemplo, num supermercado”, afirmou o CEO da marca que nasceu em 2015, na sequência do fim do cartão Free, do Millenium BCP. “Mas se me perguntar se isso pode um dia vir a acontecer, sim, poderá. Em Espanha, o regulador decidiu que as empresas que quiserem podem trancar o consumo aos fins-de-semana. Não foram as empresas que disseram isso, foi o regulador que permitiu que isso acontecesse.
Um dia o regulador português pode vir a achar que temos mesmo de filtrar os produtos ao nível do detalhe”, assumiu em entrevista ao JN/Dinheiro Vivo, lembrando, no entanto, que quase oito anos depois do boom de empresas a pagarem o subsídio de refeição em cartão, ainda não existe qualquer entidade a regular este negócio que tem na Sodexo, Edenred e UP as principais marcas.
“Faz falta regulação e supervisão. O que eu quero dizer é que quem está a fazer a supervisão são as próprias empresas de titularização, e não devem ser. Nós fazemos cumprir as regras porque é nossa obrigação, mas não sou eu que tenho de definir as regras do jogo, deve ser uma autoridade independente e com capacidade para as fazer e depois fazê-las cumprir”, destaca Nelson Lopes.
No entendimento da Sodexo só quando houver uma entidade que agregue todo o setor dos benefícios extrassalariais é que será possível dizer, de forma geral, que os cartões podem ou não ser utilizados, por exemplo, nos postos de combustível ou, num futuro mais 'radical', para comprar bens não-alimentares no supermercado. “Eu sinceramente acho que não é isso que verdadeiramente se pretende. E acho que não beneficiaria ninguém. O facto de alguém ir ao supermercado e num cabaz ter lá incluídos bens que não são alimentares, não desvirtua exatamente as coisas. O que desvirtua é eu de repente usar o cartão de refeição e só meter combustível. Isso sim, não faz o o menor sentido. Ou ir a um estabelecimento onde não há nenhum alimento. Agora ir a um supermercado, sabendo que a esmagadora maioria das pessoas que vão ao supermercado compram um cabaz que tem alimentos, e estar numa linha de caixa a separar coisas, seria uma entropia”, acrescenta.
Sem regulador, resta a Portugal olhar para o que se faz lá fora. Mas, diz Nelson Lopes, as regras estão longe de ser as mesmas. “No Brasil, o operador separa os produtos na linha de caixa, e não é possível comprar álcool com cartão de refeição. Em Espanha, não se usa ao fim-de-semana, e nos dias úteis há uma faixa horária, que se situa entre o meio dia e as quatro da tarde, em que é possível utilizar o cartão de refeição, refere o responsável.
A aceitação de cartões de refeição está dependente de um acordo entre os estabelecimentos e as empresas que fazem a titularização destes cartões, por isso, é que nem sempre todos os cartões são aceites nos mesmos estabelecimentos. Se um restaurante antes aceitava cartão e agora não aceita é porque deixou de ter acordo com uma ou várias marcas de cartão refeição, exemplifica a Associação Portuguesa das Empresas de Títulos Extrassalariais (EBFS).
A Sodexo garante que, desde a sua criação, em 2015, não aumentou preçários. A empresa tem acordo com cerca de 50 mil estabelecimentos, num universo total que se situa em torno dos 70 mil, e assegura que o número tem vindo a crescer.
A AHRESP - Associação de hotelaria, restauração e similares de Portugal está a fazer um levantamento junto dos associados para saber qual o impacto que os cartões de refeição têm no negócio.
Dados de 2018 mostram que existem em Portugal 1,2 milhões de beneficiários, ou seja, de trabalhadores a receber por cartão de refeição.