Tim Vieira: “A educação é um direito, não um privilégio”

O projeto Brave Future nasceu com a missão de transformar a educação e os modelos de aprendizagem, e de empoderar as comunidades mais desfavorecidas, em diferentes pontos do globo. Está em nove países, mas ambiciona chegar muito mais longe. Agora faltam apoios para continuar este caminho.
O empresário Tim Vieira, fundador da Brave Future, uma Organização Não Governamental (ONG): Foto: Leonardo negrão/GI
O empresário Tim Vieira, fundador da Brave Future, uma Organização Não Governamental (ONG): Foto: Leonardo negrão/GI
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Em Kakuma, campo de refugiados no Quénia, entre o desânimo que contamina quem foi obrigado a deixar a sua casa ou a família para ver a vida interrompida num local onde o tempo não passa, também há histórias felizes. Bija Mukendi, 16 anos, quer ser médico e, até há pouco mais de um ano pensava que o sonho nunca seria mais do que a sua capacidade de imaginar. Hoje, o jovem queniano, tem a certeza de que a sua ambição se concretizará.

Mas, Bija não é caso único em Kakuma. Com ele, cerca de duas dezenas de jovens fazem parte do projeto ‘Empowerment for Learning’ (Capacitação para a aprendizagem), o primeiro da Brave Future, uma Organização Não Governamental (ONG) fundada em Portugal pelo empresário Tim Vieira, que acredita que a educação deve ser “mais eficiente, inclusiva e adaptável”, e que quer contribuir ativamente para a mudança necessária.

Foi com um modesto donativo que nasceu o projeto em Kukuma, materializado com o envolvimento de uma comunidade local ansiosa por criar soluções. Uma infraestrutura simples, painéis solares e baterias, 16 computadores e uma ligação à internet através do Starlink (rede de satélites do bilionário Elon Musk) abriram as portas do mundo aos jovens estudantes naquele campo de refugiados. “Os alunos começaram a ter acesso a um ensino de nível mundial, seguindo o Currículo Internacional Britânico através de uma plataforma assíncrona personalizada”, conta Tim Vieira ao Dinheiro Vivo. Atualmente, com a ajuda de um mentor de aprendizagem local e de uma equipa internacional de especialistas e de voluntários, o projeto cresceu e oferece também aulas de inglês a outros membros da comunidade, alargando o seu impacto.

A milhares de quilómetros de distância, 16 meninas afegãs, privadas do direito de estudar desde que o regime talibã tomou o poder, em 2021, estão igualmente a ser apoiadas pela Brave Future. Foi a iniciativa de uma destas jovens que contribuiu para o alargamento do projeto ao Afeganistão. Inconformada, contactou a ONG através do LinkedIn, com um pedido ajuda para criar uma plataforma de estudo numa escola ‘underground’. “Era difícil dizer que não a alguém tão motivado, essa miúda é uma heroína”, afirma Tim Vieira, que garante que a ONG contribui com toda a ajuda possível, “com os meios que temos”.

Assim nasceu a iniciativa “HerRight”, que visa oferecer educação de qualidade e possibilidades de desenvolvimento de carreiras, que o empresário espera agora poder ampliar através de apoios, donativos, parcerias e mecenato recolhidos pela Brave Future. “Pode ser desde 50 euros por mês até ao que quiserem dar porque num campo de refugiados, com este valor conseguimos alimentar e educar uma criança durante um mês, e isso é espetacular!”, sublinha, recordando que estes jovens querem lutar pelo seu futuro e que, “se tiverem as oportunidades, se conseguirmos ajudar, eles têm a oportunidade de criar negócios nos seus países de origem”.

Uma escola centrada nos alunos

Mas este projeto de empreendedorismo social, que nasceu da Brave Generation Academy (BGA), “a escola sem turmas, sem salas de aula e sem horários”, idealizada e materializada por Tim Vieira, em 2020, também apoia estudantes nacionais e internacionais através de bolsas de estudo. “Sempre tivemos a postura de que qualquer criança que quisesse vir para a BGA não ia ser pela falta de fundos que não ia fazê-lo”, diz o fundador do projeto. Inicialmente, conta, as bolsas eram suportadas pelo empresário e pela mulher, mas, como sublinha, “percebemos que não podíamos ser só nós a dar este apoio”. Atualmente são cerca de 300 crianças com bolsa na BGA em Portugal - cerca de 35% do total de alunos -, dos quais alguns recebem 100% de apoio, outros 50%, consoante a sua situação económica.

Com a criação da Brave Future, o projeto ‘Next Generation’ faz agora a gestão e atribuição destas bolsas, não só em Portugal, mas em todos os hubs que a BGA tem pelo mundo – Portugal, Espanha, Estados Unidos, Tailândia, Índia, África do Sul, Namíbia, Quénia, Moçambique, Reino Unido e Austrália. No entanto, explica o empresário, “agora estamos numa situação em que precisamos de mais pessoas e de outras fundações interessadas na educação e no futuro do país para apoiarem o projeto e serem parceiros”.

Para o futuro, que Tim Vieira espera que seja próximo, o objetivo é que a BGA possa funcionar sem o pagamento de qualquer propina. “E já estamos a conseguir ter hubs em escolas públicas em África, nos Estados Unidos, e agora a abrir em escolas privadas na Suíça, com um modelo em que as crianças que podem pagar ajudam as que não podem”. A meta passa por dar acesso a uma educação de qualidade, em qualquer local do mundo, a qualquer pessoa.

Em Portugal, a possibilidade de integração de hubs BGA na escola pública ainda não é uma realidade, uma vez que ainda não conseguiu ver reconhecida a equivalência dos currículos. Para já, quem frequenta os hubs tem equivalência ao currículo britânico internacional, o que lhes permite, por exemplo, aceder a universidades fora de Portugal, mas não em território nacional. “A ideia é lançar o currículo português, e eu acho que aí vai haver muitas crianças que vão precisar do nosso tipo de ensino, porque o nosso programa resolve mesmo os desafios da educação”, salienta Tim Vieira. O empresário reforça a importância de desmistificar o erro e de acabar com o medo de falhar, e da aprendizagem ao ritmo de cada um.

Por agora, resta ultrapassar a burocracia e esperar que exista vontade política. “Dizem-nos que não há enquadramento, mas os nossos líderes podem fazer os enquadramentos necessários”, aponta o empresário que conclui: “o ecossistema da educação vai precisar de muitos enquadramentos novos. Muitos. E vai precisar de líderes que tenham coragem para atualizar a educação, para fazer acontecer. Porque cada dia em que nada muda estamos a estragar vidas de jovens”. 

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