Pelo menos 50 trabalhadores estão a receber prestações sociais com cortes depois de terem estado em lay-off, com remunerações diminuídas, pelo facto de esses cortes estarem a ser espelhados no registo de remunerações da carreira contributiva, algo que não deveria acontecer.
O alerta é dado nesta terça-feira pela Provedora de Justiça, num ofício dirigido ao secretário de Estado da Segurança Social, que lembra que o problema já tinha sido identificado no ano passado, sem contudo ter sido resolvido até aqui. Em resultado, há quem esteja a receber valores inferiores àqueles a que tem direito em prestações de subsídio de desemprego, subsídios de doença ou nas licenças de parentalidade.
"As cerca de 50 queixas que a Provedora de Justiça recebeu até ao momento revelam penalizações no subsídio de gravidez de risco, no subsídio parental, no subsídio de doença e no subsídio de desemprego", informa o gabinete da Provedora Maria Lúcia Amaral.
Apesar de o lay-off simplificado ter no ano passado implicado o corte de remunerações, esses cortes não deveriam estar a ser refletidos nos registos de remunerações das carreiras contributivas, dos quais resultam o cálculo futuro de pensões e também de outras prestações sociais. Desde início, e como prevê a lei, foi garantido que os trabalhadores não seriam penalizados.
Porém, a Provedora deteta "um alarmante aumento do numero de casos de cidadãos que se veem prejudicados no montante das prestações sociais a que, entretanto, acederam, e aos quais urge dar resposta".
Sem esclarecimento oficial para um problema que o Instituto de Segurança Social já tinha reconhecido em novembro de 2020, a Provedora de Justiça refere que "foi entretanto informada que o sistema aplicacional existente para proceder de forma automática aos registos por equivalências à entrada de contribuições nas situações de lay-off não se adequa às atuais situações de lay-off simplificado".
A falha nos sistemas de transferência de dados dentro da Segurança Social decorrerá do facto de, no lay-off simplificado, "ter sido dada às empresas a possibilidade de pagarem aos seus trabalhadores uma compensação de valor superior ao limite máximo legalmente estabelecido para o lay-off", adianta, o que terá obrigado a "parametrizar um novo modelo aplicacional, cuja implementação estará em curso". Só depois serão retificadas as "carreiras contributivas de todos os visados e o recálculo das prestações que aos mesmos hajam sido atribuídas".
Acontece que desde novembro que não há mudanças, com a Provedora de Justiça a exigir urgência na resolução do problema, e a alertar ainda para a situação de quem está a sofrer cortes de salário com o apoio excecional à família, onde se verifica agora uma dupla penalização para a carreira contributiva dos trabalhadores.
Nestes casos, as remunerações registadas como tendo sido sujeitas a descontos , para a carreira contributiva, estão a refletir apenas o valor total do apoio pago aos trabalhadores: dois terços do salário-base, sem complementos remuneratórios, até final de janeiro (algumas famílias passaram a ter acesso a 100% do salário-base desde então).
Segundo a Provedora, "os pais que beneficiem de tais apoios são duplamente penalizados nas respetivas carreiras contributivas: por um lado, pelo facto de o valor do apoio ser calculado por referência apenas à remuneração de base normalmente auferida, e, por outro, pelo facto de, não havendo registos por equivalência à entrada de contribuições relativamente à diferença entre a remuneração normal do trabalhador e o apoio pago, as remunerações registadas nas respetivas carreiras contributivas, durante o período em causa, corresponderem a um valor significativamente inferior ao da remuneração normal do trabalhador".
É destacado o caso de "uma mãe que beneficiou deste apoio entre março e junho de 2020 e que veio a ser significativamente prejudicada no valor do subsídio por risco clínico durante a gravidez a que acedeu em novembro último".
Porém, contrariamente ao que está a suceder neste apoio, o subsídio para assistência à família já não implica os mesmos cortes nas remunerações registadas na carreira contributiva por razões de "proteção na parentalidade". A mesma razão aplica-se ao apoio excecional à família, entende a Provedora.
No ofício, a Provedora diz ainda ter recebido 20 queixas de beneficiários de prestações de desemprego terminadas no ano passado, não abrangidos nos termos utilizados pela lei do Orçamento do Estado para definir as situações de prorrogação automática de subsídios - reservadas a quem perca a prestação em 2021.
O governo já veio afirmar que a renovação automática, por seis meses, dos subsídios de desemprego abrange aqueles que terminaram a 31 de dezembro. O mesmo para quem na mesma data ficou sem subsídio social de desemprego, para efeitos de acesso a mais seis de valor de prestação no âmbito do Apoio Extraordinário ao Rendimento dos Trabalhadores
"Embora se admita como possível que foi intenção do Governo abranger nas referidas medidas extraordinárias as situações dos beneficiários cujas prestações hajam cessado em 31/12/2020, a verdade é que a letra da lei, em ambos os casos, não reflete essa opção", alerta a provedora, pedindo clarificação das normas.
Por outro lado, aponta ainda, "parecem de algum modo ter sido esquecidos os beneficiários de subsídio de desemprego cujo período de concessão tenha terminado entre 30/06/2020 e 30/12/2020 e que, por não reunirem a necessária condição de recursos, não puderam aceder ao subsídio social de desemprego subsequente".
Para estes trabalhadores, resta apenas recorrer ao Apoio ao Rendimentos dos Trabalhadores, para obterem prestações por até seis meses, quando quem termine o subsídio de desemprego em 2021 terá acesso aos seis meses a mais de subsídio, bem como ao novo apoio por um máximo de 12 meses.
"A apontada disparidade na proteção social conferida a trabalhadores que materialmente se encontram em situações em tudo idênticas - apenas separadas por um curto lapso temporal - carece, ao que parece, de justo fundamento", defende o ofício assinado pelo Provedor-adjunto, Joaquim Costa, pedindo para estes desempregados "uma proteção social próxima da que se encontra prevista para os beneficiários cujo subsídio de desemprego termine em 2021".