Mais de um quinto dos trabalhadores independentes portugueses que recorreram a apoios de emergência na primeira fase de impacto da pandemia, em 2020, viram pedidos de ajuda indeferidos, mostram dados da Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (Eurofound).
Num estudo sobre o impacto da covid-19 no emprego e atividade dos vários tipos de trabalhadores, a nível europeu, a agência da União Europeia recolheu os dados das várias medidas implementadas pelos governos do bloco nos primeiros meses da pandemia, avaliando o nível de resposta assegurado e a efetiva absorção das medidas pelos beneficiários. A avaliação incide sobre o período de março a setembro de 2020.
O documento, publicado neste mês, reporta números obtidos junto dos vários governos e constata que "o nível de apoio a rendimentos disponibilizado a trabalhadores por conta própria ficou aquém daquele que foi concedido a trabalhadores por conta de outrem", através de medidas de redução dos tempos de trabalho - o chamado lay-off simplificado. Alerta também para a desproteção maior de alguns tipos destes trabalhadores e antecipa a necessidade de continuar a assegurar ajuda a muitos destes profissionais, que enfrentam "ameaça existencial".
No caso português, os dados reportados à Eurofound dão conta de 209 mil pedidos de apoio feitos por trabalhadores independentes até setembro do ano passado, dos quais apenas 163 mil foram deferidos nesse período. Ao certo, 22% dos pedidos de acesso ao apoio extraordinário à redução de atividade foram chumbados, adianta o documento.
Até ao final do ano, e segundo dados já divulgados pelo Ministério do Trabalho, houve um total de 174 mil recibos verdes abrangidos, numa despesa total de 189 milhões de euros (era de 137 milhões de euros em fins de julho de 2020), mas sem que se conheça o número total de pedidos rejeitados no conjunto do ano.
Os apoios portugueses aos recibos verdes comparam com um conjunto de ajudas muito variável a nível europeu, sem dados quanto a número de pedidos de apoio chumbados em muitos países, no relatório da Eurofound.
No caso de Itália, por exemplo, onde foi garantido um subsídio de entre 500 a mil euros, foram aprovados 4,1 milhões de pedidos num total de cinco milhões, igualmente com a taxa de rejeições a rondar um quinto. Na Roménia, foram aprovados 279 mil apoios de entre 354 mil pedidos (com 21% de chumbos), e na Letónia os apoios chegaram a 4176 trabalhadores, de entre 9658 pedidos, entregues até final de junho, com a maior taxa de rejeições. Mais de metade dos pedidos foram chumbados por não cumprirem o mínimo de contribuições sociais exigido no acesso à medida.
O documento da Eurofound mostra que Portugal é o sétimo país da UE com menor absorção de apoios a recibos verdes, com pouco mais de 25% dos trabalhadores independentes a receberem ajudas.
Itália lidera, por outro lado, a lista dos que mais apoios afetaram a trabalhadores independentes nesse período (80%), seguida pela República Checa (mais de 60%), França (mais de 50%), Bélgica, Espanha e Eslovénia, três países onde o peso de apoios a quem está por conta própria alcançou 50% no bolo total de ajudas.
A Eurofound assinala que, ao contrário do que sucede com os dados de execução de medidas de lay-off (que implicaram maiores custos na maioria dos países que os adotaram), há falta de informação da parte dos Estados-membros que permita perceber a razão pela qual a tomada de apoios foi baixa em muitos casos.
O estudo refere que, no caso da Áustria, onde a obtenção de apoios dependia de que os beneficiários fizessem prova de quebra mínima de rendimentos em 30%, governo e parceiros sociais admitiram que esse terá sido um dos fatores a limitar a disponibilização das ajudas, a par com procedimentos complexos. Para o caso português, onde se exigiram quebras mínimas de 40%, não há razões apontadas.
Segundo a Eurofound, é necessária mais informação detalhada sobre a absorção de apoios e uma explicação das diferenças entre os vários mecanismos disponibilizados pelos países, para retirar lições que guiem os decisores políticos.