Vai ser preciso mais que IA para reavivar o Bing

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Em Março de 2002, o motor de busca mais utilizado na Internet era o da Yahoo, com 36% de quota num mercado bastante repartido. Havia o Alta Vista, MSN, Lycos, AOL, Overture, Excite, Hotbot e vários outros regionais, como o pioneiro SAPO em Portugal. Além do Google, claro, que desde 2000 vinha fazendo um caminho ascendente.

Dois anos depois, em maio de 2004, o Google tinha passado para a frente com 29,5% de quota e o Yahoo caíra para segundo, nos 28,9%. A partir daí foi sempre a subir: o Google passou como um rolo compressor e alcançou um domínio sem precedente, ultrapassando os 90% de quota. Em 2023, domina cerca de 92% das buscas em todo o mundo, enquanto o Yahoo tem menos de 1,5%. E o Bing, que a Microsoft reinventou em Fevereiro com uma injecção mediática de Inteligência Artificial, não vai além dos 3%.

Era assim antes da grande investida da Microsoft na OpenAI (criadora do ChatGPT) e é assim agora. Pior, segundo os dados do Statcounter, o Bing até caiu ligeiramente: tinha 3,03% de quota global em Janeiro, antes da nova "fórmula", e registou 2,99% em Julho.

No mínimo, ficou tudo na mesma. Seis meses e 10 mil milhões de dólares depois, o Bing com novas capacidades IA não conseguiu fazer qualquer mossa no domínio do Google. Toda a tinta que correu sobre como a casa-mãe da Google (Alphabet) se sentiu ameaçada e acelerou projectos de Inteligência Artificial secou rapidamente. O Google tem um algoritmo feito de titânio, que está constantemente a ser trabalhado, e até ver dá aos consumidores e empresas aquilo que procuram.

É também um produto da escala. Quanto mais buscas mais dados para alimentar e melhorar o algoritmo, o que por sua vez leva a mais buscas.

O notável quando se olha para os números de 2023 é perceber que nem toda a atenção dada ao ChatGPT e à IA generativa conseguiu captar a curiosidade dos utilizadores. Poderia ter havido um pico de interesse no Bing AI Chat, o tal produto que a Microsoft lançou em Fevereiro, seguido de uma quebra do tráfico (por exemplo, como aconteceu com a rede social Threads). Mas as estatísticas não apontam nesse sentido. Não parece ter havido uma diferença quantificável antes e depois.

A liderança da Microsoft tinha dito, aquando do lançamento, que as suas receitas aumentariam 2 mil milhões de dólares se o novo Bing conseguisse ir buscar 1% de quota ao Google. Isso está por materializar, apesar de a empresa ter uma leitura diferente das coisas.

"Embora não possamos comentar em dados de terceiros, podemos partilhar que o Bing cresceu para exceder 100 milhões de utilizadores diários activos", disse um porta-voz à ZDNet. "O nossos sinais de utilização mostram forte crescimento desde Fevereiro e por causa de novos pontos de acesso, como o Bing Chat Enterprise, tivemos um dos meses de crescimento mais forte desde que lançámos as novas experiências Bing e Edge."

Talvez a Microsoft esteja a ver algo que não tem tradução nas estatísticas, mas parece pouco tendo em conta o investimento e a atenção dada no início do ano. O que isto parece demonstrar é que, mesmo com o buzz que rodeou o ChatGPT e a IA generativa nos últimos meses, o status quo permaneceu.

A história lembra-nos que não há domínio na tecnologia que não possa desmoronar-se, mas que é igualmente difícil desmontar um monopólio. A Microsoft sabe bem disso, do alto dos seus 72% de quota nos sistemas operativos para computador, que nenhuma Apple, Linux ou Chrome conseguiu impactar.

Agora, percebemos claramente que vai ser preciso mais que IA para reavivar o Bing e destronar o Google.

Se é que isso alguma vez será possível.

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