Foi recentemente anunciada pelo Ministro Adjunto e da Economia, Pedro Siza Vieira, no âmbito do Portugal Real Estate Summit, a apresentação para breve, até final do ano, de uma proposta de lei para introduzir no nosso mercado as sociedades de investimento imobiliário semelhantes aos REITs (Real Estate Investment Trusts), veículos que surgiram nos Estados Unidos e que existem já, não só em Espanha – sob a designação de SOCIMIS –, mas também noutros países europeus, como a Holanda, Bélgica, Itália, França, Alemanha e Reino Unido..Estes veículos caracterizam-se por constituírem entidades – geralmente sob a forma de sociedades de responsabilidade limitada – de investimento imobiliário cotadas com um regime fiscal próprio, com um objeto social geralmente limitado ao investimento em ativos imobiliários (quer seja de forma direta ou indiretamente através da detenção de participações sociais noutras sociedades), e com requisitos de investimento por volume de rendimentos que têm de ser distribuídos, bem como por terem períodos mínimos de manutenção dos ativos. Com estes veículos pretende-se facilitar o acesso do público em geral (e em particular do pequeno e médio investidor) às ações da sociedade que são livremente transacionáveis em mercado e, indiretamente, à propriedade imobiliária, profissionalizando ao mesmo tempo a sua gestão. Nestas sociedades é também geralmente exigido um determinado nível de liquidez e de dispersão do capital, não sendo permitido que uma parte do capital seja detida por investidores com blocos superiores a determinados limites (ex.: 25% do capital não pode ser detido por investidores com mais de 3% das ações)..O sucesso no nosso mercado destas sociedades de investimento imobiliário, cujo regime já há muito vem sendo reclamado por parte dos investidores nesta área, irá depender de diversos fatores, sendo útil atentar no exemplo espanhol, onde as SOCIMIS foram introduzidas em dois tempos (apesar de terem sido criadas em 2009, só tiveram adesão a partir da alteração ao regime introduzida em 2012). Porque falhou a primeira tentativa? Essencialmente por causa da exigência de um capital social mínimo muito elevado (de 15 milhões de euros, que foi reduzido em 2012 para 5 milhões), da limitação do nível máximo de endividamento a 70% e por terem um regime fiscal pouco atrativo para os investidores. A isto acrescia o facto de apenas se permitir que as SOCIMIS tivessem as suas ações admitidas à negociação em mercado regulamentado, implicando a aplicação de requisitos muito mais exigentes no momento da admissão à negociação (por exemplo, no que respeita ao nível de free float mínimo exigido e da necessidade de publicação de um prospeto previamente aprovado pelo regulador), mas também a assunção por parte das sociedades de deveres permanentes muito mais exigentes em matéria de divulgação de informação, com os inerentes custos..Os defeitos do regime acima referidos foram “corrigidos” em 2012, tendo também passado a permitir-se que as SOCIMIS tivessem as suas ações admitidas num mercado regulamentado no espaço económico europeu ou em sistema de negociação multilateral, como o Mercado Alternativo Bursátil (MAB), um mercado semelhante ao nosso Euronext Access+, onde, apesar de se exigir uma certa dispersão da base acionista, não só os requisitos de admissão são muito mais aligeirados, como também os deveres permanentes das sociedades admitidas são muito mais reduzidos. Com efeito, as sociedades com ações admitidas à negociação num mercado de negociação multilateral não são à partida sociedades abertas, tal como definidas na nossa legislação de mercado de capitais, a menos que tenham feito uma oferta pública, e como tal não estão sujeitas a certos deveres tais como o de divulgação de participações qualificadas e o dever de lançamento de OPA obrigatória no caso de alteração de controlo..O que é facto é que nos três primeiros anos de vigência do regime espanhol não foi constituída nenhuma SOCIMI e desde a alteração legislativa no final de 2012 surgiram já cerca de 60 dessas sociedades, quase todas admitidas no MAB..A conjuntura atual do mercado imobiliário português – onde o investimento, em especial estrangeiro, continua a crescer segundo os últimos estudos de mercado – parece favorecer a introdução destas sociedades de investimento imobiliário que certamente poderão contribuir para aumentar a competitividade do nosso mercado, a par de outros mercados europeus onde os REITs já representam uma alternativa real para os investidores. Acresce que estas sociedades surgem num contexto em que se verifica a falta de alternativas para investir em imobiliário em Portugal através de instrumentos do mercado de capitais. Com efeito, ao permitirem a colocação de ativos imobiliários junto de investidores, as sociedades de investimento imobiliário poderão contribuir para reacender o nosso mercado de capitais, começando pelos investidores de retalho – que desta forma passam a poder participar nos grandes projetos imobiliários – passando pelos players relevantes do sector e, ainda, por outros investidores institucionais relevantes, tais como bancos, que poderão ver neste veículo uma forma de rentabilizar os seus ativos imobiliários..Resta-nos aguardar que o regime das sociedades de investimento imobiliário seja efetivamente aprovado no nosso ordenamento e, sobretudo, que o nosso legislador acerte à primeira na configuração do mesmo, para que possamos voltar a ter IPOs a animar o nosso mercado de capitais, ainda que não se tratem de verdadeiras sociedades cotadas pois, se seguirmos a fórmula do sucesso espanhol, vamo-nos bastar com a admissão das ações daquelas sociedades num sistema de negociação multilateral..Marta Graça Rodrigues, advogada, Sócia da Garrigues Portugal