
As vendas do retalho alimentar cresceram, no ano passado, 11,7% para um total de 13 551 milhões de euros. Foram mais 1418 milhões do que em 2022, com praticamente todas as categorias de produtos a cresceram a dois dígitos, com exceção das bebidas alcoólicas, cuja variação em valor foi de 5%, e dos artigos de higiene para o lar, que valorizaram 6%. Laticínios, congelados e bebidas não alcoólicas cresceram 14% em valor e os produtos de mercearia 13%.
Os dados são dos Scantrends da Nielsen IQ e mostram que, na estratificação das vendas em valor, 41% dos gastos das famílias nos super e hipermercados foram em artigos de mercearia, correspondendo a quase 5556 milhões de euros, mais 642 milhões do que no ano anterior. Já os laticínios absorveram 17,5% das faturas, ou seja, a 2371 milhões de euros, mais 284 milhões do que em 2022. Por fim, os congelados foram responsáveis por 7,7% dos gastos, totalizando 1043 milhões de euros. Em 2022, estes produtos corresponderam a 7,5% da fatura total, ou seja, a 910 milhões.
Quanto às bebidas alcoólicas, e apesar de um aumento de 5% em valor, face ao ano anterior, o peso destes artigos na fatura global baixou dos 10,4% em 2022 para 9,7% em 2023. Significa isto que, perante o agravamento dos preços das bebidas alcoólicas, as famílias reduziram as suas compras deste tipo de produtos, gastando 1314 milhões, pouco acima dos 1262 milhões de 2022.
Os artigos de higiene pessoal e as bebidas não alcoólicas mantiveram, grosso modo, o seu peso nos gastos totais das famílias, com 9,9% e 7%, respetivamente, mas, no caso dos artigos de higiene para o lar, cuja variação em valor face ao período homólogo foi de 10%, o seu peso diminui de 7,7% para 7,3%.
Destaque, ainda, para o peso das marcas da distribuição, as chamadas marcas brancas, na fatura total: era de 40,2% em 2022, passou a 44% em 2023. E no caso da alimentação, essa procura por produtos mais económicos foi ainda mais notória, com a quota das marcas da distribuição a crescerem mais de três a cinco pontos percentuais na mercearia, laticínios e congelados, atingindo quotas de 50,7%, 46,3% e 62,2%, respetivamente.
Não admira, por isso, que, num ano em que as vendas totais dos super e hipermercados aumentaram 11,7%, o aumento das marcas brancas foi de 22,3% contra os 4,5% das marcas de fabricante.
Pedro Pimentel, diretor-geral da Centromarca, a Associação Portuguesa de Empresas de Produtos de Marca, reconhece que 2023 foi um ano difícil. “Foi um ano claramente de perda, em que a marca própria ganhou quatro a cinco pontos percentuais de quota global, e conseguiu ir buscar às marcas de fabricantes um valor muito próximo dos mil milhões de euros”, diz.
No entanto, reconhece que, com o evoluir da inflação, e por efeito também do IVA zero, o consumidor “tornou-se menos ansioso” e passou a viver “mais adaptado ao contexto”. O “desacelerar” do crescimento das marcas de distribuição ao longo do ano “deixa alguma expectativa” quanto a 2024 e “alguma perspetiva” de que possa ser um ano “um bocadinho mais positivo”.
Já o diretor-geral da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição considera que os dados dos Scantrends da Nielsen mostram uma “cada vez menor fidelização” às várias insígnias, numa procura dos “melhores preços e promoções”, o que se traduz numa “procura crescente” pelas marcas próprias, resultado do menor poder de compra dos consumidores. Sem querer ainda fazer um balanço completo do ano, “numa altura em que ainda faltam muitos dados”, Gonçalo Lobo Xavier assume que “não foi um ano extraordinário” na medida em que, apesar das vendas terem aumentado, a “rendibilidade das empresas não cresceu”.
Sobre 2024, a APED destaca os aumentos de matérias-primas como o cacau ou os cereais, a instabilidade no Mar Vermelho, o prolongamento da guerra na Ucrânia e os protestos dos agricultores na Europa, para lembrar que “há um grau de incerteza muito grande e que provoca distorções no mercado, a que é preciso estarmos atentos”.
Recorde-se que o IVA zero - medida negociada pelo Governo com a produção e o retalho alimentar como forma de mitigar os efeitos do disparar da inflação no arranque de 2023 - entrou em vigor a 18 de abril, num cabaz de 46 categorias de produtos alimentares, entre hortícolas, frutas, cereais, leguminosas, carne, peixe, ovos, laticínios e gorduras. Uma medida inicialmente pensada para seis meses, que foi depois alargada até ao final do ano e que acabou, oficialmente, a 4 de janeiro, quando foram repostos todos os preços nos escaparates já com a inclusão dos 6% de IVA respetivo (só o óleo vegetal é taxado a 13%).
Um mês depois da reposição do imposto sobre o valor acrescentado sobre estas 46 categorias de produtos, que, num hipermercado, podia representar mais de 12 mil produtos distintos, a convicção generalizada é que os preços voltaram a subir.
A 9 de janeiro, a Deco Proteste avançava que, em quatro dias, 14 produtos já haviam subido acima dos 6% referentes ao IVA, com especial destaque para o iogurte líquido (+25,98%), óleo alimentar (+15,96%), atum posta em azeite (+10,53%) e pão de forma sem côdea (+9,79%).
Já a Lusa apontava ontem para um aumento de quase sete euros com o fim do IVA zero, considerando que o cabaz passou de 174,13 euros a 19 de dezembro para 180,9 euros atualmente. Um aumento de 3,89%, abaixo dos 6% da reposição do IVA.