
No atual ambiente de quase estagnação da Europa, em muito ditada pelas dores da Alemanha, que entrou em recessão este ano e com um futuro complicado pela frente, Espanha voltou a aparecer como o vizinho de sempre que melhor pode acudir à economia portuguesa, com o seu crescimento musculado (3% este ano, segundo a Comissão Europeia) e o peso indisputado, já histórico, de maior investidor estrangeiro e maior mercado exportador.
As empresas espanholas têm investido em Portugal (posição ou stock de IDE - Investimento Direto Estrangeiro) uns impressionantes 29,2 mil milhões de euros (situação no final do terceiro trimestre deste ano, segundo o Banco de Portugal), valor que está a crescer 6% em termos anuais.
É a maior fonte de IDE da economia portuguesa, que deixa bem para trás os 20 mil milhões de euros em investimentos franceses, os 12,1 mil milhões da China ou os 8,7 mil milhões de euros em capitais alemães.
O investimento espanhol é feito por milhares de empresas, onde pontuam nomes da banca, como Santander, Bankinter, La Caixa (BPI), BBVA, uma plêiade de grandes fundos imobiliários, um rol enorme de construtoras e grupos de engenharia, energia (Repsol, Acciona, FCC, Ferrovial, Sacyr, CME), gigantes do retalho, como Mercadona, El Corte Inglés ou o valioso grupo Inditex, que detém as marcas Zaraa, Massimo Dutti, Pull & Bear, entre outras.
São grandes investimentos e operações, mas com um senão: engrossam as importações portuguesas, o que come crescimento à economia interna.
"Espanha vende mais para Portugal do que para toda a América Latina", diz o gabinete de estudos da Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP).
"A forte complementaridade entre os tecidos produtivos português e espanhol, e o expressivo grau de integração ibérica em inúmeras cadeias de abastecimento e serviços, reforçam indiscutivelmente o valor estratégico e único das relações bilaterais Portugal‑Espanha", acrescenta a mesma agência do governo português.
Para compensar, as empresas portuguesas têm no vizinho secular um mercado de vendas invejável.
É também o maior e, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), está a crescer bem e é avaliado em mais de 25 mil milhões de euros em exportações de mercadorias e serviços (com o precioso contributo do turismo espanhol, também ele um dos maiores mercados emissores).
Sobre isto, a AICEP sublinha que "o mercado espanhol continua a ser uma importante fonte de oportunidades para as 6.775 empresas exportadoras portuguesas, assim como o segundo principal destino do investimento português no exterior" e que "ao nı́vel das comunidades autónomas espanholas, Portugal vende mais a Madrid, Galiza ou Catalunha do que para mercados como Bélgica, Angola, Polónia ou Suécia".
No meio da crescente consternação e dúvida sobre o que há-de ser da Europa sem o motor alemão a dar o máximo, Espanha têm recebido elogios e especial atenção de muitos economistas e analistas.
O país que já partilhou com Portugal, Itália e Grécia o famigerado lugar de mau aluno por causa das contas desequilibradas e endividadas, parece hoje um farol do crescimento europeu. É, em todo o caso, como sempre foi, a quarta maior economia europeia a seguir a Alemanha, França e Itália. Tem peso e dimensão interna relevante.
Charles Seville, o economista principal da agência de ratings Fitch que segue Espanha, considera que "embora a economia da Zona Euro tenha um desempenho modesto e enfrente numerosos riscos externos, a Fitch reviu em alta as perspetivas e o potencial crescimento de Espanha". "Esperamos que a economia espanhola se expanda cerca de 3% em 2024 e continue a avançar mais de 2% em 2025-2026".
A "forte recuperação" em Espanha "articula-se com o rápido crescimento do emprego", é uma economia "muito rica em emprego", aponta Seville. Apesar de o desemprego aparecer sempre muito elevado, o economista da Fitch desdramatiza: "a taxa de desemprego estrutural é quase de certeza inferior aos atuais 11,2% da população ativa".
Assim, "esperamos que a situação de Espanha melhore à medida que os motores do crescimento mudam", sendo que o investimento privado "deverá recuperar, impulsionado pela descida das taxas de juro, a par dos investimentos públicos financiados" pelos fundos europeus, nomeadamente o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), conclui o analista.