Visabeira: "Muito do nosso crescimento virá da África Austral"

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Qual é a sua maior preocupação?

A recessão em Portugal. Por muito internacionalizados que

estejamos, é fundamental termos um mercado interno forte e robusto,

onde possamos desenvolver competências, até porque exportamos mais

serviços do que produtos. É impossível uma empresa ir fazer fora

uma coisa que não faça bem no seu país. Estamos por isso ansiosos

que chegue o momento em que a nossa economia vai parar de cair, se

faça a inversão do ciclo e possamos olhar o futuro com mais

Angola e Moçambique é que compensam as dificuldades internas?

A África Austral é um dos pilares de crescimento futuro do

grupo. É onde estamos a crescer mais, em volume de negócios, como

em contribuição para o EBITDA. Temos um projeto de expansão, de

alargar a nossa geografia aos países limítrofes de Angola e

Moçambique, nomeadamente Tan-zânia, Malawi , Zimbabué e Zâmbia.

Em que sectores?

Telecomunicações, eletricidade e gás são o nosso veículo de

internacionalização. África é a parte do globo em que o

crescimento é maior e o continente onde há mais trabalho para fazer

em infraestruturas: energia, estradas, ferrovias e comunicações.

Muito do nosso crescimento virá daí.

E na Europa?

França e Bélgica, onde já estamos, e Alemanha e Suécia, onde

estamos a começar. Não obstante serem mercados maduros e com menor

crescimento, são países em processos de investimento em redes de

nova geração, uma área onde temos muitas competências e gente

formada, uma vez que em Portugal a migração para essas redes já

está praticamente feita.

Isso traz vantagem competitiva.

Sim. Portugal ter um dos mercados de telecomunicações mais

avançados do mundo tem-nos permitido estar um passo à frente da

concorrência. Trabalharmos para grandes operadores mundiais como

France Telecom, Vodafone ou Deustche Telekom decorre muito da

experiência e competências que temos capitalizado por estarmos

muito à frente nas telecomunicações, sejam redes móveis, fibra

ótica e serviços de televisão como a Zon Iris e o Meo, que são

das plataformas mais avançadas do mundo.

Planeiam alargar a vossa geografia na Europa?

Agora vamos para o Reino Unido. O processo de expansão é natural

e deriva das relações fortes com os operadores de telecomunicações

e fabricantes de equipamentos com quem mantemos parcerias

estratégicas duradouras. Começámos a trabalhar com a France

Telecom em 2003, em Lyon. Hoje não só estamos em todo o território

francês como também fomos com eles para a Martinica e a República

Dominicana. São eles que nos abrem portas. Com os chineses da Huawei

começámos em Portugal e agora estamos com eles em Angola,

Moçambique e Alemanha.

A Visabeira Global pesa 72% no volume de negócios do grupo. Não

seria melhor que o peso do turismo e indústria crescessem?

Turismo e indústria estão a crescer bem e o seu peso na nossa

carteira só não é maior em termos relativos porque a Global cresce

mais, o que é natural pois é a área em que temos mais competências

competitivas.

Na hotelaria vão manter-se apenas em Viseu e Moçambique?

Temos o objetivo de estar em Lisboa com a marca Montebelo.

Acreditamos que isso vai acontecer. Basta que apareça uma boa

oportunidade. Em Moçambique vamos continuar a investir na cadeia

Girassol, pelo menos durante os próximos quatro ou cinco anos, para

fazer face ao crescimento da procura, que está com uma boa dinâmica.

Em Tete, começámos agora a construção de um hotel de 140 quartos

que começará a funcionar dentro de ano e meio.

E em Angola?

Em Angola não há tanto espaço como em Moçambique para

construir novos hotéis. Mas se houver uma boa oportunidade podemos,

com parceiros angolanos, assumir a gestão de algumas unidades.

Estamos e já colaboramos com grupos de investidores locais em

Benguela e Lubango, com contratos de gestão para o arranque de

unidades. Demos formação, testámos o mercado e percebemos as

dinâmicas.

Qual é a estratégia para a indústria?

Temos duas fábricas de mobiliário de cozinha, uma em Arganil e

outra em Viana (Angola). E estamos a ter muito sucesso com a

Pinewells, que a partir de biomassa produz pellets que são usadas

como substituto de carvão e no aquecimento. Como a capacidade de

produção, de 100 mil toneladas, está toda tomada vamos aumentá-la

50%. Mas o nosso principal negócio é a cerâmica. Em parceria com a

Ikea, estamos a fazer um investimento industrial de 20 milhões de

euros em Ílhavo, na Riostone, onde vamos fabricar 30 milhões de

peças/ano, todas para exportação - o que representará um

crescimento de 40% nas vendas do grupo Vista Alegre Atlantis. Estamos

a fazer a nossa parte para a reindustrialização e o aumento das

exportações.

Como é que a recessão está a afetar o negócio da hotelaria?

Os efeitos da queda do consumo interno, são particularmente

visíveis na componente empresarial. Há cinco anos, o Montebelo de

Aguieira tinha uma procura muito importante de reuniões, incentivos

e congressos. Como esse mercado está deprimido, alterámos o padrão

da procura fazendo protocolos. No ano passado estiveram lá todos os

medalhados de canoagem nos Jogos Olímpicos de Londres. Centenas de

atletas do Norte e Leste da Europa passam lá o inverno a treinar,

acabando por garantir uma ocupação muito interessante. Adaptamos o

nosso produto à procura que é possível mobilizar.

É esse o segredo para crescer num momento de crise?

Construímos uma estrutura pendular, sólida, segura e adaptável,

cuja velocidade é medida pela nossa capacidade de renovação, de

forma a os impactos exteriores serem absorvidos, processados e

utilizados para otimizar a capacidade de reação. A resiliência que

o nosso modelo de negócio tem vindo a demonstrar tem que ver com a

flexibilidade e a capacidade de reagir às circunstâncias do

mercado. Dou-lhe um exemplo. Assim que tivemos aqui uma quebra

significativa no sector da construção, fomos capazes de reorientar

a nossa capacidade de produção e realocá-la a Moçambique, na sua

esmagadora maioria. É fundamental ser rápido na adaptação das

nossas estruturas produtivas às circunstâncias concretas do

negócio.

A internacionalização ajudou?

O facto de estarmos em várias geografias com ritmos assimétricos

de crescimento - mercados maduros e outros menos desenvolvidos -

ajudou-nos muito a não perder o equilíbrio e a manter o

crescimento. Mas, como é evidente também somos afetados por este

contexto de quebra da procura interna, aumento dos custos financeiros

e falta de confiança em relação ao futuro. Este enquadramento

deixa-nos apreensivos, mas o que é facto é que temos vindo a

encontrar o nosso caminho e soluções que nos permitem em cada

momento desenvolver os nossos negócios.

Perfil: Advogado e filho de militar

Paulo Varela, 44 anos, nasceu em Águeda mas por mero acidente

derivado das andanças do pai, um militar nascido em Santa Comba Dão

que casou com uma rapariga de Vale de Cambra. O ceo da Visabeira

Global cresceu em Viseu, onde fez todo o Secundário, mudando-se

depois para Coimbra onde se demorou cinco anos (1987-1992) a

completar o curso de Direito, opção que tinha a ver com a sua

paixão pela dialética. "Via-me a argumentar em tribunal",

explica.

De Coimbra trouxe não só o canudo, mas também uma relação com

Isabel, uma colega curso, de Braga, com quem começou a namorar e

viria a casar quatro anos depois, após um período em que tiveram o

Indico e o Mar da China a separá-los (ela trabalhou em Macau no

Gabinete de Tradução Jurídica) .

Regressado a Viseu, fez o estágio de advocacia (ainda é membro

da Ordem, se bem que com a inscrição suspensa), enquanto que na

segunda semana de julho de 92 começava a ganhar os seus primeiros

dinheiros a trabalhar, colaborando no gabinete jurídico do único

patrão que teve até agora - a Visabeira.

Pouco meses volvidos, em janeiro de 1995, estava de malas feitas a

voar para o Maputo, com a missão de confecionar a roupagem jurídica

da Imovisa, um fundo de gestão imobiliária em que a Visabeira

estava associada ao Banco de Moçambique.

Estava para ficar quatro meses, o mais tardar cinco, mas acabou

por se demorar onze anos. Estreou-se na gestão, como diretor geral

da Imovisa, e foi pulando de setor em setor, da gestão automóvel

até à construção, até que em 1999, ainda antes do dobrar do

milénio, com apenas 31 anos, ser escolhido, presidente do Conselho

de Administração da Visabeira Moçambique, cargo que desempenharia

até 2006.

No âmbito do esforço de diversificação geográfica da

Visabeira, em 2002, o ano da morte de Savimbi, abriu a frente de

negócios do grupo em Angola, enquanto que no ano seguinte tratou da

expansão europeia, iniciada na França.





O sucesso do esforço de internacionalização que ele liderou não

foi de todo estranho ao facto de, em 2006, Fernando Nunes, o maior

acionista e presidente do Conselho de Administração o tenha chamado

de volta a Viseu, nomeando-o seu vice-presidente - e presidente da

Visabeira Global, a subholding que gere as participações nas

telecomunicações, tecnologias, energia e construção, garantindo

72% dos 534 milhões de volume de negócios consolidado do grupo.

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