
Neste artigo teço algumas reflexões sobre as tendências, perspetivas e escolhas de Portugal no contexto da União Europeia (UE) à luz das principais conclusões de um recente estudo da Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP).
Meticulosamente desenvolvido, o estudo propõe uma abordagem inovadora para compreender a relação entre o crescimento económico, o nível de vida e a evolução populacional nos países da UE entre 1999 e 2022. Os resultados da estimação econométrica do modelo desenvolvido, muito significativos, permitirem o estabelecimento de projeções para Portugal em retrospetiva e em perspetiva (o foco do trabalho), sendo apresentados vários cenários que robustecem a análise.
As conclusões têm implicações profundas para as políticas que Portugal deve adotar nos anos vindouros em função do grau de ambição preconizado para o nosso nível de vida face à UE e a nossa dinâmica populacional, o que deve merecer a atenção de todos os cidadãos. O estudo mostra que é a criação de condições de crescimento económico que retém e atrai população (e capitais) para gerar riqueza, dado o nível de vida relativo de partida.
Aponta-se como objetivo ambicioso, mas realizável, que Portugal atinja a 13.ª posição em nível de vida na UE em 2033, entrando assim na metade de países mais prósperos (com a atual configuração de 27 países), o que levará ainda a uma população superior. Para tal, o nosso crescimento económico anual terá de atingir taxas de crescimento médias anuais na casa dos 3% ou, o que é mais robusto (face a choques simétricos e à entrada de novos países na UE), superar a média simples dos valores de crescimento dos países da UE – o novo referencial estratégico proposto no estudo – entre 1,4 e 1,7 pontos percentuais (p.p.), consoante os cenários.
Olhando para as propostas dos dois principais partidos candidatos à vitória nas eleições do próximo dia 10 de março, resulta que apenas o cenário macroeconómico da AD está alinhado com esse contexto ambicioso de acelerar a colocação do país entre os mais prósperos.
Alternativamente, diferenciais de apenas entre 0,4 e 0,6 p.p. acima do novo referencial média simples, implicando valores absolutos de crescimento na casa dos 2% ao ano,só permitem alcançar a metade de países mais ricos da UE em 2043, o que claramente não é ambicioso e, além disso, comporta perda de população. Este quadro está em linha com o cenário macroeconómico do PS.
Considerando a atratividade do cenário proposto pela AD, torna-se alcançável mediante adequadas reformas estruturais. Estas incluem, nomeadamente, a necessidade de:
Note-se que, em democracia, Portugal conseguiu ritmos de crescimento económico nas décadas de 1980 e 1990 que, a serem repetidos na próxima década, mediante políticas adequadas, tendo em conta o contexto nacional e internacional de agora – onde se incluem as reformas e fatores de competitividade acima referidos –, nos poderão colocar no pelotão da frente da UE em nível de vida e bem-estar em 2033, ou seja, no espaço de uma década, que é um período de tempo que se pode considerar razoável para que as políticas atinjam todos os seus efeitos de forma coordenada.
A não adoção reformas estruturais resultou numa economia pouco mais que estagnada entre 1999 e 2022, em empobrecimento (queda de posições em nível de vida na UE) e numa perda relativa de população, que passará a perda absoluta nas próximas décadas dado o baixo nível de vida a que chegamos. Na verdade, a manter-se este desempenho medíocre, Portugal pode cair para a 25.ª posição em nível de vida em 2033 e registar uma perda bastante significativa de população.
Outro resultado importante mostra que um baixo nível de vida de partida (abaixo da UE), como no caso de Portugal, ao refletir-se numa perda populacional relativa subsequente, traduziu-se num efeito de convergência ‘automático’ positivo sobre a dinâmica do nível de vida relativo (pois a evolução relativa da população entra com sinal negativo na sua determinação), o que atenuou o impacto desfavorável sobre o nível de vida do nosso baixo ritmo de crescimentoeconómico, contribuindo para a complacência dos nossos governantes e a ausência de reformas nessamatéria.
Quanto às projeções em retrospetiva (cenáriocontra factual), se a nossa economia tivesse crescido ao ritmo da média simples dos países da UE desde 1999 (2,4% ao ano, em vez de 0,9%), em 2022 teríamos alcançado a 12.ª posição em nível de vida (em vez da 20.ª, a 7.ª pior), claramente na metade de países mais ricos, e teríamos mais um milhão de pessoas. Crescendo ao ritmo da UE (1,5%), teríamos ficado na 19.ª posição, pouco melhor.
A média simples de crescimento dos países da UE, o novo referencial estratégico base proposto, em que cada país pesa o mesmo, continuará a ser mais ambicioso nas próximas décadas do que crescer ao ritmo da UE e (pior ainda) a Área Euro, os referenciais dos nossos governos, cuja dinâmica é travada pelo forte peso das três maiores economias da UE (Alemanha, França e Itália), há muito estagnadas.
A substituição de referencial de crescimento é uma reforma estrutural, apontando para um novo rumo em termos de nível de vida e dimensão populacional, como proposto. Se o novo referencial tivesse sido seguido desde 1999, bastaria para ficarmos consistentemente na metade dos mais ricos até 2043, ao contrário do referencial UE, que nos colocaria sempre perto do fundo da tabela.
Dado o baixo desempenho passado (o nosso crescimento económico de 0,9% ao ano em 1999-2022 foi o 3.º pior entre os países da UE), crescer em linha com o novo referencial estratégico base proposto após 2022 apenas trava a perda de posições em nível de vida até 2033, pelo que atingir a metade de países mais ricos exige os diferenciais adicionais acima apontados.
Isto confirma que alcançar um nível de vida e uma população mais elevados requer políticas ambiciosas e consonantes tendo em vista um maior crescimento económico, o que implica, desde logo, escolher um referencial com uma dinâmica mais ambiciosa para nos compararmos.
O estudo conclui ainda que o recente surto de crescimento económico socialista não é estrutural, mas um resultado de impulsos temporários do turismo e do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), tendo em conta projeções separadas da Comissão Europeia.
Apostar em reformas estruturais que elevem o potencial de crescimento da economia, incluindo aproveitar melhor os apoios europeus disponíveis (cujo impacto é reduzido e temporário, atendendo às projeções da Comissão Europeia para o nosso crescimento potencial), é a melhor estratégia para melhorar o nosso nível de vida relativo e preservar a dimensão populacional – bem como a soberania do País, que não existe sem povo –, preparando o fim previsível desses apoios.
Com efeito, à medida que se aproxima um previsível corte profundo nosapoios europeus após 2030, é claro que Portugal precisa de se preparar para um novo paradigma económico. As reformas estruturais tornam-se, assim, ainda mais prementes, pois o país deve focar-se na criação de condições internas para o crescimento económico, tornando-se menos dependente desses apoios.
Os resultados deste estudo não são apenas números, são chamadas à ação. A responsabilidade recai sobre os cidadãos eleitores no sentido de exigirem, escrutinarem e responsabilizarem os governos no que diz respeito a reformas estruturais que promovam o crescimento económico, que é instrumental para a geração de receitas fiscais e a sustentação do Estado social. Estou certo de que as metas de crescimento e nível de vida apresentadas, de fácil escrutínio (com base nas projeções do estudo, aqui resumidas) elevarão a exigência dos cidadãos.
São as condições de vida de todos nós que estão em jogo. O estudo referido é um repto à sociedade para exigir uma chamada à ação dos governos no sentido de adotaremmelhores políticas públicas. O estudo não informa apenas sobre a trajetória passada de crescimento económico, nível de vida e dinâmica populacional, mas traçatambém um mapa do futuro com linhas mais risonhas ou sombrias consoante o grau de ambição das políticas.
Cabe à sociedade, aos eleitores, avaliar cuidadosamente as propostas políticas, moldando assim o caminho que Portugal tomará nos próximos anos. O nosso destino coletivo está nas mãos de todos e a escolha determinará o curso da nação nos anos vindouros. Por isso, as próximas eleições legislativas de 10 de março oferecem uma oportunidade única para os cidadãos influenciarem de forma decisiva o rumo do país em prol de todas as gerações – as atuais e as vindouras –, pensando em simultâneo no impacto sobre os mais jovens, os trabalhadores no ativo e os reformados.
Apelo, por isso, ao voto de todos os cidadãos eleitores, mas também à capacidade de reflexão e influência dos mais novos, em particular os estudantes, que ainda não podem votar, sobre aqueles que o podem fazer (nomeadamente os familiares), uma vez que o que se decidir agora, com impacto no desenvolvimento do país, será proporcionalmente mais relevante nas suas vidas, dado que têm um caminho maior pela frente. O meu mais profundo desejo é que, em resultado de melhores políticas públicas, os atuais e futuros estudantes, bem como os demais jovens já no ativo, encontrem condições propícias para constituir família e criarem riqueza no nosso bonito País, sem terem necessidade de emigrar. Será o melhor sinal de que o País estará, finalmente, a prosperar!
Óscar Afonso, professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, e sócio fundador do Observatório de Economia e Gestão de Fraude (OBEGEF)