"Miranda, I love you", grita um fotógrafo durante o photocall-que-parece-nunca-mais-acabar. Um muro de fotojornalistas empurra-se. Uns, de pé, outros, empoleirados em cadeiras e bancos roubados da audiência da sala - um bunker forrado de espelhos e pedra num hotel em pleno Paseo de la Castellana, em Madrid. Todos querem dar a volta à desvantagem: 1,75 metros de mulher em cima de um estrado e de uns saltos altos. . "São bons genes, sim. Mas isso não chega, não pode ser só isso", diz Miranda Kerr ao Dinheiro Vivo. "Nunca levei muito a sério o facto de ser modelo. Para mim, é apenas um meio para atingir um fim. Ser capaz de escrever um livro, encorajar jovens mulheres a terem confiança em si próprias, a gostarem delas mesmas. Isso é o que faz de ser modelo uma coisa importante para mim. Dá-me a cara, a exposição. E depois dá-me a voz." . Miranda Kerr está sentada num sofá, num quarto quase às escuras. As calças brancas, justas, e o blazer branco debruado a cetim pérola que vestiu na conferência de imprensa foram substituídos por um macacão preto com as costas e os ombros à mostra. Aos 29 anos, é a sétima modelo mais bem paga do mundo, segundo o ranking da Forbes (ganhou 4 milhões de dólares entre maio de 2011 e maio de 2012), e foi escolhida para ser a imagem da Mango, substituindo Kate Moss, um investimento de 30 milhões de euros. . Miranda Kerr nasceu em Gunnedah, uma pequena cidade australiana. "Cresci entre cavalos e motos, a trepar às árvores, a fazer tartes e a ver a minha avó cozinhar." Filha de adolescentes - a mãe tinha 16 anos quando ela nasceu -, foi criada pela avó. Foi na casa dela que Miranda teve o primeiro contacto com a moda. "Ela tinha uma grande mala, uma arca, cheia de roupas antigas com as quais podíamos brincar, despir e vestir, e fazer tudo. Lembro-me de que gostava de vestir sempre um vestido comprido vermelho de veludo. Devia ter 5 ou 6 anos: vestia-o e andava pela casa como se fosse uma rainha ou algo parecido. Experimentávamos os sapatos dela, as carteiras. Ela era uma mulher com muito estilo, muito elegante. Sem dúvida, foi a primeira a influenciar a maneira como eu me visto, desde muito cedo." . A carreira de Kerr começou uma semana antes de fazer 14 anos: sete dias depois de ganhar o concurso de beleza da Dolly Magazine Impulse Model Competition, estava a fazer a primeira sessão fotográfica profissional. Durante anos, foi cara demarcas associadas ao surf - Billabong, Roxy e One Teaspoon - e de outras como Roberto Cavalli, Banana Republic e Levi's, para as quais desfilou e fotografou campanhas. . A maioria dos trabalhos como modelo aconteceu depois de 2004, quando assinou contrato com a agência de modelos nova-iorquina Next Model Management. Em 2007, a modelo foi convidada para desfilar para a Victoria's Secret, a marca de lingerie americana que transforma as modelos em "anjos", em substituição da brasileira Gisele Bündchen. . O convite foi feito três anos depois de Miranda se ter mudado de armas e bagagens da Austrália para Nova Iorque. "Parece que foi ontem. A diferença entre hoje e há 11 anos é uma loucura, porque eu não acho que tenha mudado tanto assim. Fisicamente, se olhar para uma fotografia de quando tinha 14 anos e outra agora, há algumas pequenas mudanças, sim, mas não há alterações substanciais." . Mas, a imagem de Miranda Kerr não vende só outras marcas. Em 2009, a modelo criou a sua própria empresa - Kora Organics (www.koraorganics.com), uma linha de produtos orgânicos e amigos do ambiente para o cuidado da pele, de-senvolvida durante quatro anos por especialistas e feita com ingredientes naturais como óleos e sais da Austrália. "É muito bom quando pensamos nas coisas e as conseguimos concretizar", diz. A empresa familiar de Miranda Kerr tem sede na Austrália e é gerida pela mãe da modelo, Therese. . Pelo caminho, escreveu o livro Treasure Yourself, um incentivo de autovalorização às mulheres. "As pessoas dizem 'para ti é fácil dizer isso', mas qualquer pessoa tem desafios na sua vida, obstáculos que é preciso ultrapassar todos os dias. São artistas incríveis, são escritoras, seja o que for. Incentivo as mulheres a descobrirem aquilo em que são boas, únicas, e a conseguirem construir-se todos os dias. Em vez de se de ficarem em baixo. É esse o meu meio para um fim." . Nos corredores do hotel, as responsáveis pela comunicação da Mango ainda não acreditam na simpatia. Miranda Kerr fala do marido - o ator Orlando Bloom - e do filho, Flynn, aos jornalistas, como se estivesse a falar com uma amiga. Elogia--se no papel de mãe - o mais importante e mais bem desempenhado da sua vida - mas queixa-se da falta de tempo para as amigas. E para as compras. "Escolho a maioria da minha roupa nas sessões fotográficas. Vou pedindo o que gosto." Diz que o segredo da boa forma está na escolha dos alimentos. Mas garante que o ioga e a dança fazem parte das dicas de beleza. . "A moda é uma manifestação criativa e artística para mim, tal como dançar. Divirto-me com isso", diz. O making of da campanha da Mango é indicativo: é fácil ver que as fotografias foram tiradas enquanto Miranda dançava. "Estou dedicada ao meu trabalho, mas ao mesmo tempo nunca me levo demasiado a sério. Acho que é uma questão de acreditarmos em nós próprios. Há muitas mulheres bonitas por aí, mas não há assim tantas que, mesmo sendo bonitas, acreditam nelas mesmas. Acredito mesmo que podemos criar a nossa realidade. Isso sou eu." Por isso, afasta comparações. "Ia odiar que alguém dissesse a uma jovem modelo 'Tu vais ser a próxima Miranda Kerr.' Não! Ela vai ser a próxima... ela!" . O tempo também fez desaparecer o glamour das viagens entre a Austrália e Nova Iorque e os sonos com "pescoço torcido em classe económica". Agora, Miranda dedica-se à família. "Temos um sítio no campo que ninguém conhece. É para lá que vamos e é lá que o meu filho tem contacto com coisas que eu tive na Austrália. Sapatos fora, pés na erva." . A jornalista viajou a convite da Mango