Patrícia Barão está a marcar o seu primeiro ano como partner da área residencial da Dils Portugal, que detém, atualmente, um portfólio de 47 nacionalidades entre os seus clientes. Na sequência do anúncio do novo plano do Governo para a Habitação, a executiva avalia que a proposta de aumentar o Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) para os não-residentes - exceto os emigrantes - pode “passar para o mercado” a imagem de que “Portugal já não precisa de estrangeiros”, quando o cenário, aponta, é precisamente o contrário. No que toca ao cenário da imigração em geral no país, afirma que é um contexto que “não nos devia espantar” e que é este movimento que vai ajudar “a fazer crescer a nossa economia”.Temos os anúncios do Governo para a Habitação, numa estratégia que dizem que quer trazer um 'abanão' para esse mercado da construção, do arrendamento, da habitação. Como é que vocês avaliam algumas dessas medidas que foram colocadas? O IMT mais caro para não-residentes, um IVA que desce na construção e no arrendamento, licenciamento com menos controlo prévio?A Habitação é claramente um tema do dia e é muito bom ver que, de facto, o nosso Governo está a olhar, veio trazer medidas consideradas de choque, e é exatamente isso que também o mercado espera, que haja medidas que possam claramente mudar, no fundo, aquilo que é o setor da Habitação para melhor. Basicamente, o grande objetivo que está por trás de todas estas medidas é trazer oferta, oferta nova, para o mercado, de casas que os portugueses possam pagar, quer para comprar, quer para arrendar. Portanto, quando nós falamos dessas medidas, nomeadamente a descida do IVA de 23% para 6%, naquilo que for construção considerada, no fundo, de rendas moderadas, que são até 2.300 euros, e para a aquisição até 648.000 euros, são, de facto, no fundo, o segmento onde as famílias portuguesas conseguem chegar. Se nós olharmos para aquilo que foram os dados do INE do último trimestre deste ano, nós vemos que o valor dos imóveis teve um aumento de 17,2%. Ou seja, houve um aumento considerável naquilo que são os valores do imobiliário residencial. E isso deve-se, precisamente, ao desequilíbrio que existe entre aquilo que é a dinâmica da procura e aquilo que é a oferta existente. Nós vemos que as famílias portuguesas são as que mais compram habitação e nós temos que trazer uma oferta que responda àquilo que são as necessidades dos portugueses. Portanto, estas medidas vêm responder a isso.Nesses dados do INE mais recentes também, 88% da compra dos imóveis para residências são de compradores nacionais, para a finalidade de habitação própria. Isso também dá sinais de qual é a necessidade do mercado nesse momento.Muitas vezes, nós que somos players do mercado ouvimos o comentário de que os estrangeiros que são os causadores deste aumento de preços. Quando nós olhamos para os factos, para os números, vemos que 95% das compras de imóveis, pelo menos neste último trimestre, são portugueses. Ou seja, temos apenas 5% de clientes estrangeiros a comprar casa. E nós também sabemos que o ticket de um cliente internacional é muito superior àquilo que é o ticket normal de compra de habitação de um cliente doméstico. Portanto, o mercado imobiliário tem vários segmentos, nós temos que trazer oferta para todos.Esse 5% que ficaram com os estrangeiros, por exemplo, agora no final do primeiro semestre deste ano, houve inclusive uma redução em comparação com o período homólogo de 2024. Não é que os estrangeiros não tenham mais interesse, porque, por outro lado, Portugal continua sendo extremamente atrativo para esses investidores. Mas o que pode significar então essa quebra?O ticket médio de um cliente internacional ronda os 750 mil euros. Não é este o ticket médio do cliente nacional. Em 2024, foram 6,5% os clientes internacionais e os números dizem-nos que estamos [este ano] nos 5% de clientes internacionais. É muito porque realmente o mercado doméstico está a ganhar expressão. Nós temos efetivamente uma grande procura e um aumento da procura de habitação pelos portugueses. Os estrangeiros continuam muito interessados em investir em Portugal. Nós somos um ótimo exemplo disso, porque grande parte dos nossos clientes são clientes estrangeiros e vemos cada vez mais nacionalidades a olhar para Portugal. Somos um país seguro, temos uma qualidade de vida única, nós oferecemos condições excelentes para que os estrangeiros se apaixonem pelo nosso país. E nós precisamos do investimento estrangeiro também para dinamizar a nossa economia. A medida do aumento do IMT é um sinal que não é positivo neste momento. Nós podemos estar a passar para o mercado internacional a dizer que Portugal já não precisa dos estrangeiros, ou pelo menos que está a aumentar aquilo que é um imposto com algum impacto na aquisição de casas por estrangeiros em Portugal. Portanto, quanto a nós, essa é uma medida que deve ser reavaliada e que nós esperamos que, efetivamente, venha a ser repensada..Pode fazer chegar uma mensagem negativa? Se nós falamos aqui numa redução na área residencial, na área comercial, o cenário, quando olhamos para os estrangeiros, é completamente diferente. Das dez maiores negociações que houve este ano em Portugal, as dez são de investidores estrangeiros na área do imobiliário comercial.Exatamente. No imobiliário comercial, já vai em 1,2 mil milhões de euros investidos. Já é um indicador que, de facto, o imobiliário comercial está com uma expressão muito superior, pelo menos, àquilo que foi o ano passado. E temos claramente o mercado internacional a dominar esses números. E isso é mais uma vez uma prova que Portugal continua no radar daquilo que são os investidores imobiliários, das grandes empresas que, no fundo, querem investir em projetos imobiliários com grande dimensão. E olhando para todo o panorama, percebemos que, cada vez mais, Portugal precisa de investimento estrangeiro e tem que olhar para os estrangeiros de uma forma mais cuidada, não lançar estas medidas sem medir o impacto que isso pode ter depois naquilo que é a dinâmica do setor.Ou seja, na sua opinião, é preciso ainda refletir a questão do imposto para os não-residentes, no impacto que isso poderá ter?Exatamente. Na maioria, as medidas são efetivamente boas e são medidas que o mercado aceitou de uma forma muito otimista. O tema do agravamento do IMT é uma medida que nós esperamos que possa ser reavaliada no futuro.Entre os principais compradores, um em cada cinco clientes é brasileiro.O brasileiro é o nosso principal cliente, quando olhamos para os clientes estrangeiros. E tem muito a ver também com o portfólio que a Dils comercializa. O brasileiro e o português têm uma ligação muito forte, falamos a mesma língua, conhecemos muito bem aquilo que são as dinâmicas uns dos outros. Nós vivemos sempre um pouco em contraciclo. Quando Portugal está, falando de nível de macroeconomia, em alguns picos, às vezes o Brasil está no pico oposto, e isto também tem ajudado de alguma forma a dinâmica dos brasileiros a comprar a casa. E os brasileiros continuam apaixonados por Portugal, no sentido em que continuam a olhar para localizações como Cascais, como Estoril, como Lisboa, como a Comporta, o Algarve, e de facto há uma oferta de imóveis que é muito atrativa para nós continuarmos a ter essa nacionalidade connosco.Qual é o top cinco de clientes estrangeiros na vossa cartela?Os norte-americanos têm também descoberto Portugal.Perceberam uma tendência nesse último ano?Sem dúvida. Estão até muito próximos daquilo que são os negócios com os clientes de nacionalidade brasileira. Depois também temos os europeus. Os franceses, os belgas, os alemães, que continuam a comprar também muitas casas. No total temos 47 nacionalidades diferentes e estão sempre a aparecer clientes vindos de países com contextos completamente diferentes e que continuam a chegar a Portugal e a ver que realmente viver ou passar temporadas em Portugal faz sentido naquilo que é o seu contexto..Medidas para a habitação. "Queremos abanar o mercado da construção e do arrendamento", diz Montenegro .Uma outra discussão que está completamente ligada à questão do estrangeiro em Portugal, que são as políticas para imigração, a lei de estrangeiros. Notam alguma preocupação da parte de quem ainda não está em Portugal, mas faz o seu planeamento para um investimento? A vossa equipa tem elementos que prestam assessoria neste tema?Nós temos consultores e consultoras de várias nacionalidades, isso faz com que haja uma certa proximidade quando nós olhamos para pessoas que vêm de outros países viver para Portugal. O contexto da imigração é um contexto não nos devia espantar. Nós estamos habituados na nossa história também a emigrar, portanto, receber imigrantes para nós deve ser visto como um tema muito positivo. Nós precisamos muito destes 1,5 milhões de imigrantes que temos e cada vez mais o aumento destes imigrantes é maior. Temos que olhar para este tema com muita frontalidade, porque isso faz com que nós cheguemos mesmo à conclusão de que temos que criar condições e temos que ter uma oferta de habitação que vá ao encontro desta nova população que chega ao nosso país. Essa é uma obrigação dos portugueses, é uma obrigação nossa. Nós olharmos e prepararmos o país para receber estes imigrantes que são quem nos vai ajudar depois a fazer crescer a nossa economia, porque se não fossem os imigrantes nós não íamos conseguir sequer manter uma série de... Nem vou entrar em promenores, mas nós olhamos para o setor da construção. Construímos 26 mil casas por ano e se formos olhar para quem está a construir estas casas, vamos certamente chegar à conclusão que não são, ou pelo menos que a maioria, não são portugueses, são efetivamente estrangeiros que nos vão ajudar neste desafio..A Patrícia agora marca um ano da posição como partner na área residencial da Dils, trazendo 20 anos de experiência de trabalho na área. Qual é a sua avaliação do mercado ao longo deste ano em Portugal?Olho para este ano comparativamente ao ano passado e o que eu posso dizer é que sinto o mercado mais profissional, mais preparado. Eu sinto que já se passou um pouco aquilo que era a euforia que houve há uns anos atrás, porque se olharmos para os números, nós realmente tivemos aqui uma grande dinâmica do mercado residencial e realmente havia muitos players no mercado, havia algum ruído. E eu agora sinto que o mercado está a ficar mais profissional, mais consolidado, onde de facto vender um ativo imobiliário exige uma grande preparação, exige tempo, exige dedicação. Noto realmente uma grande evolução nesse sentido e eu acho que este ano fica muito marcado por isso. Eu já comecei a minha vida no imobiliário há muitos anos atrás e, cada vez mais, sinto mais que é o espaço onde eu gosto de estar e onde eu me sinto realizada.A Patrícia é fundadora e diretora da WIRE, que é a Women in Real Estate aqui em Portugal, ou seja, mulheres no imobiliário. Essa profissionalização também podemos dizer que vem daí, da maior presença de mulheres também nesse setor?Não tenho dúvida absolutamente nenhuma. Eu acho que quando nós olhamos hoje para o mercado, quando comecei éramos muito poucas mulheres no setor. Eu comecei a minha carreira na promoção imobiliária e realmente quando nós olhávamos para os boards das empresas eram maioritariamente homens, para não dizer na totalidade homens. Hoje em dia já não, já vemos as mulheres a ter algum destaque e eu acho que isso é claramente um indicador muito positivo. Porque quando nós olhamos agora para esta nova realidade da Inteligência Artificial, que eu gosto de chamar 'inteligência alternativa', nós vemos que, muito em breve, este mercado vai mudar, até, se calhar, mais rápido do que nós pensamos, e nós estamos a caminhar para que, de facto, as máquinas possam substituir aquilo que nós fazemos nesta componente intelectual. Nós olhamos para a Revolução Industrial e tínhamos as máquinas a substituir aquilo que era o empregado, e agora, nas funções mais rotineiras, esta nova realidade é para substituir o homem naquilo que são funções onde efetivamente a inteligência vai ser, no fundo, substituída. E o que nos vai restar é esta capacidade humana. Há quem chame soft skills, mas eu acredito que é a humanidade, esta componente humana de nós trazermos o humanismo às relações e esta humanidade às empresas. Portanto, quem conseguir, no fundo, trazer esta relação humana, criar esta relação com o outro, vai conseguir, no fundo, sobreviver àquilo que vai ser esta revolução que nos vai trazer a Inteligência Artificial - barra - alternativa. E as mulheres estão mais preparadas para isso. A mulher tem, enfim, não temos só uma série de características diferentes dos homens, até pelas questões hormonais, mas a mulher está mais preparada para trabalhar a questão da relação com o outro. Nós somos mais desafiadas a fazer isso. E então, vamos estar certamente mais preparadas para lidar com esta mudança que vai haver no mundo do que os homens, assim espero.caroline.ribeiro@dn.pt.Imigrantes do Brasil inscritos para votar nas eleições municipais portuguesas sobem 111% .Montenegro responde ao PS e avisa que a habitação “não pode ficar dependente” de dividendos de qualquer banco