Bhout. Como ir ao ginásio jogar boxe e não querer sair de lá mais?

Startup que nasceu numa garagem inventou sacos de boxe com inteligência artificial que permitem jogar e fazer desporto ao mesmo tempo. Prometem viciar quem foge dos ginásios.
Mauro Forte, CEO da Bhout. Foto: D.R.
Mauro Forte, CEO da Bhout. Foto: D.R.
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Foi aos 11 anos que começou e nunca mais deixou de praticar artes marciais. Por paixão, a vida levou-o a formar-se em desporto. Chegou a ser dono de um ginásio. Mas há nove anos, sonhou – literalmente – que estava a jogar um videojogo através de um saco de boxe e isso mudou-lhe a vida. Surgia assim a ideia da Bhout, um saco de boxe com inteligência artificial.

Mauro Forte arriscou, deixou o emprego, fez uma segunda hipoteca da casa, estoirou cartões de crédito, usou as poupanças e fechou-se na garagem. Foi autenticamente na garagem, em 2019, que gizou uma inovação, que até ali só estava na sua cabeça e que foi partilhada com um arquiteto, Pedro Barata (cofundador e chief experience officer), que a desenhou para fabricarem um protótipo na China. “A resiliência é o que diferencia um sonhador de um empreendedor”, ajuíza Mauro Forte, CEO da Bhout – ele que podia ter perdido tudo na vida, ou melhor, não podia porque não tinha alternativa que não fosse vencer. “Não desistir é o segredo”, confessa.

“Nós inovámos a sério, no sentido em que criámos e estamos a liderar um segmento novo e que não existia”, começa por explicar o empreendedor, hoje com 47 anos. “É um segmento que coloca um smart punching bag, nós dizemos the first boxing bag ou the first punching bag with AI, o primeiro saco de boxe com inteligência artificial, no centro de um ecossistema. Isto é uma mensagem muito importante: nós não estamos a desenvolver apenas um produto físico, o produto físico é o centro, depois há um ecossistema que tem diferentes aplicações.”

Vamos por partes. Primeiro o produto físico. O hardware do saco foi finalizado a 100% na semana passada, quando chegaram de Londres. Já tinham feito um tour pelos Estados Unidos e um lançamento em Paris, mas na altura foi com o que chamaram de sacos Frankenstein, que ainda estavam em desenvolvimento. Este sábado, pela primeira vez, vão levar a Las Vegas (EUA) um produto já finalizado.

Para vermos qual é a tecnologia que está lá dentro, este saco de boxe tem apenas quatro sensores, com machine learning, que medem a quantidade de golpes, a precisão, a potência e a velocidade em unidades internacionais, e mede a biomecânica da técnica de quem está a utilizar, que recebe pontos por estes cinco elementos, num jogo onde se perdem pontos à medida que se acusa maior cansaço (exertion, em inglês). Exatamente como numa luta real. Quem ganha mais pontos muitas vezes não é a pessoa mais forte ou com a melhor técnica, mas sim aquela que se cansa mais tarde.

“É tipo a visão da Tesla: mínimo de sensores, máximo de computador, máximo de treino, de machine learning. Nós chegámos a um nível de precisão extraordinário, a nossa margem de erro é de 3%, é completamente negligenciável. E há três anos diziam-nos que não era possível, mas nós fomos teimosos e insistimos”, explica o CEO da Bhout.

E é à volta deste jogo (gamificação) associado ao exercício físico que se cria o tal ecossistema de que Mauro falava. “Tu vais ter de aguentar cinco rounds, oito rounds, 12 rounds, dependendo da modalidade, e nós damos-te pontos por cinco elementos e retiramos pelo teu exertion, pelo teu nível de cansaço”, resume. “É uma versão extremamente qualificada, o mais próximo de uma luta, sem correr o risco de apanhar. E esse é exatamente o nosso público-alvo. Os desportos de combate são, sem sombra de dúvida – e os dados são muito claros – os que mais crescem no mundo. Já há 650 milhões de fãs de MMA, 50% mais ou menos da geração Z é hoje fã de MMA e de boxe, e não havia um produto deste tipo no mercado. Estamos à procura da esmagadora maioria das pessoas que sabe racionalmente que tem de se mexer, mas experimenta um ginásio e três meses depois cancela. E isto tem muitos elementos lá dentro de gamificação e de psicologia positiva.”

Foi num ginásio na avenida de Roma, em Lisboa, que se estrearam ao público, ainda com a versão Frankenstein em 16 sacos. Se já fez sucesso com este, melhor será quando estrearem os sacos finalizados em dois novos ginásios prontos para abrir este mês, em Odivelas e em Almada. E depois segue-se o Laranjeiro, Miraflores, Porto (na zona das Antas), em Lisboa (no Oriente). E até já negociaram abrir em Nova Iorque, para depois franchisarem nos EUA. “Nós estamos a acelerar muito nos clubes, cada clube leva 16 sacos. Temos 20 clubes em pipeline, mas em negociação, neste momento, temos cerca de 500 clubes para serem franchisados”, avança Mauro Forte, adiantando que Espanha é o primeiro país onde vão abrir um clube com marca própria (é sempre assim com o primeiro em cada geografia), e estão em negociações também com França, Luxemburgo, Suíça, Arábia Saudita, entre outros.

Já levantaram 11 milhões em rondas de investimento. Em novembro do ano passado fecharam a segunda maior ronda seed levantada em Portugal, no valor de 10 milhões de euros, em exclusivo pela Lince Capital e pela Explorer Investments. Um mês antes tinham sido considerados, pela revista norte-americana Time, como uma das 200 inovações do ano. Com 43 colaboradores, até agora gastaram cinco milhões. O próximo passo é fazer arrancar a produção, com capacidade máxima para mil sacos por mês, na região de Leiria, onde a Bhout tem também o laboratório de engenharia e um armazém. A partir daqui irão começar a faturar.

Além dos clubes, vai ser possível comprar e ter um destes sacos nas empresas – a LinkedIn será das primeiras – ou em casa (entre seis mil e dez mil euros). Mauro Forte e a sua mulher estão ansiosos para serem os primeiros a instalar um em casa, em Alcochete. Ele, que é o mais competitivo de todos os utilizadores, não descansa para manter o seu nome no topo dos recordes de utilizadores deste saco, que o software permite jogar contra qualquer pessoa do outro lado do mundo, desde que tenha também um saco. Já têm até um primeiro protocolo assinado com a Global Sports Federation para criarem ligas de competição de e-boxing, kickboxing e muay thai, na versão de exergaming, ou de virtual simulated sports, o termo oficial, que são desportos virtuais imersivos. É uma mistura entre um desporto físico e um jogo.

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