A vitória do Leave no referendo sobre a saída do Reino Unido da União Europeia, com o Brexit a recolher 52% dos votos, cria um período de incerteza e de trabalho profundo na reorganização política e económica..O primeiro passo passa pela saída de David Cameron, primeiro-ministro britânico que hoje se demitiu após terem sido conhecidos os resultados. Contudo, Cameron vai ficar pelo menos três meses em funções para "aguentar o barco", afirmou, citado pela Bloomberg. O objetivo é que o UK tenha um novo líder na altura da reunião do seu partido, em Outubro, e que terá de ser o próximo primeiro-ministro a arrancar com as negociações formais com a UE..Estas decorrerão durante dois anos e este compasso de espera conseguido por Cameron permite ganhar algum tempo para reequilibrar os mercados..[caption id="attachment_586826" align="aligncenter" width="2200"]. O primeiro-ministro David Cameron, e a sua mulher, no momento em que anuncia a sua saída do governo. Fotografia: REUTERS/Phil Noble[/caption].O ainda primeiro-ministro britânico vai a Bruxelas na próxima semana para falar com os líderes da União Europeia sobre a situação no Reino Unido. Antes, os seus membros fundadores da União Europeia vão encontrar-se em Berlim este Sábado. Também poderá haver uma reunião de emergência dos ministros das Finanças europeus durante o fim de semana, segundo a Bloomberg. David Cameron afirmou que não avançará com o processo tendo em conta o Artigo 50 do Tratado de Lisboa: isso ficará a cargo do próximo primeiro-ministro britânico..Assim que o Artigo 50 (que define como é que um Estado-Membro pode sair da UE) for posto em marcha o UK tem os referidos dois anos para negociar a saída do bloco europeu. Os analistas dizem que é improvável que este tempo seja suficiente para encontrar soluções nos acordos comerciais mais complexos e que as conversações decorrerão muito depois do Reino Unido sair oficialmente..[caption id="attachment_586825" align="aligncenter" width="4989"]. Fotografia: REUTERS/Neil Hall[/caption].O tipo de acordo que o UK quer ainda não está definido e não foi respondido concretamente pela campanha pelo Brexit. Há três questões em particular para investidores e executivos. Que acordo vai regulador os cerca de 550 mil milhões de euros anuais gerados na relação comercial entre o UK e o resto da Europa? Em que termos irão as empresas do Reino Unido aceder ao mercado único europeu, que vale mais de 13 biliões de euros? Os bancos com sede no UK vão continuar a fazer negócio com o resto da União Europeia?.Leia também: Como os mais velhos tramaram os mais novos e os expulsaram da UE.Há três modelos possíveis em cima da mesa, segundo a Bloomberg..O UK pode decidir aplicar o modelo norueguês, ficando na zona económica europeia continuará a ter acesso ao mercado único europeu e a ter livre circulação de trabalhadores, contribuindo para o orçamento da União Europeia. Este é o modelo preferido dos banqueiros porque preservará o acesso aos clientes da União Europeia..Pode ser aplicado um novo acordo de livre circulação, que limitará as taxas entre o UK e os 27 Estados-Membro mas demorará anos até que esta nova legislação esteja implementada no mercado. Por exemplo, o acordo comercial entre o UK e o Canadá demorou sete anos a negociar e ainda não foi ratificado..O terceiro modelo pressupõe a aplicação das regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), o que evitaria um acordo complexo e que o UK possa definir as suas próximas taxas, como já faz a Rússia e o Brasil. Contudo, este acordo não teria qualquer relação preferencial com a UE..Uma das perguntas que se impõe é: o que é que a União Europeia vai oferecer?.As políticas domésticas têm impacto nestas negociações e alguns líderes não quererão ter um acordo extensivo com o Reino Unido porque usso poderá encorajar movimentos separatistas semelhantes nos seus próprios países. A Escócia, por exemplo, deverá avançar com um novo referendo à independência..Poderão ocorrer duas vias: a Alemanha deverá provavelmente reconhecer que a Europa precisa de continuar a ser o maior parceiro comercial do UK; a França liderará outro grupo uqe acredita que a saída não deve ser facilitada e que os países que estão fora da UE não merecem as mesmas condições favoráveis que os Estados-Membro..A este cocktail junta-se o sentimento anti-Europa cada vez mais crescente e a simpatia pela decisão do UK nos governos nórdicos. Os próximos anos serão difíceis de prever..[caption id="attachment_586824" align="aligncenter" width="3543"]. Bolsas reagiram negativamente ao Brexit. (Fotografia: EPA/SIMELA PANTZARTZI)[/caption].A outra pergunta prende-se com o que querem os bancos..As empresas de serviços financeiros têm uma lista longa de preocupações mas a mais importante prende-se com o regime legal que permite que um banco se domicilie num país da UE e ter negócios noutro. Sem isso, os bancos deverão ter de mudar uma parte substancial das suas operações para fora do Reino Unido, nomeadamente para Frankfurt, Dublin ou Paris..Outro tema prende-se com o acordo de comércio da zona euro, em que a União Europeia está a procurar que estas transações continuem sem restrições e fora do alcance dos seus reguladores. Os gestores de fundos podem agora vender ativos em toda a Europa, o que pode deixar de acontecer. Estas regras serão um foco fundamental para o UK uma vez que o sistema financeiro é essencial para a economia do país..Mesmo no mercado laboral existirão impactos. Algumas grandes cadeias britânicas estão muito dependentes de trabalhadores europeus e cerca de três quartos dos trabalhadores do sector do turismo em Londres nasceram no estrangeiro. A campanha da saída prometeu o fim da livre circulação de cidadãos europeus nas próximas eleições, o que provocará uma contração do setor hoteleiro e do retalho, que terão de encontrar mão de obra britânica, com salários mais altos. Ainda não se sabe o que acontecerá a quem trabalha no UK já que não foram implementados critérios e as novas regras dependem de legislação futura mas o líder do partido independente já disse que os estrangeiros que trabalham no Reino Unido devem poder ficar no país..Já do lado dos produtores e fabricantes a preocupação está no acesso aos mercados, sobretudo para os fabricantes automóveis, que avisaram as consequências de uma saída da UE, que recebe 44% das exportações. Um acordo comercial é essencial para manter o fluxo em ambas as direções, especialmente em empresas integradas em cadeiras de fornecimento, com fábricas noutros países..E para a Europa, qual é o impacto? É ainda difícil de prever mas o que é certo é que a União Europeia precisa rapidamente de preencher o "buraco" de sete mil milhões de euros no seu orçamento anual de 145 mil milhões de euros fixado até 2020, que perderá com o fim da contribuição do Reino Unido..A UE também terá de clarificar o mais rapidamente possível o estatuto de empresas e particulares que estão a usar as regras comerciais da UE, que vivem ou trabalham em qualquer dos lados desta nova fronteira..O Reino Unido deverá também abdicar da liderança por seis meses do Conselho Europeu, que deveria começar em julho do próximo ano. Será substituído pela Estónia ou talvez por Malta ou pela Croácia..Os líderes europeus podem tentar mostrar rapidamente unidade na região, mantendo o bloco coeso face aos euroceticistas, inspirados nos resultados do referendo - nomeadamente em França, que tem eleições presidenciais em Abril e onde a extrema-direita Frente Nacional de Marine Le Pen tem ganho apoiantes..As divisões entre a Alemanha e Paris na forma como se deve gerir a zona euro deverão provavelmente afastar uma grande mudança até que os dois países tenham eleições, no próximo ano. Uma colaboração europeia mais estreita, sem o ceticismo do UK, pode voltar a nascer. Já está em cima da mesa uma revisão das políticas de segurança da UE, para apertar o controlo à crise dos migrantes.