Há histórias que se escrevem a si próprias nos momentos em que o acaso encontra a sorte e a determinação, e esta é uma delas. Seis meses depois do lançamento do ChatGPT em versão beta, uma ousadia da OpenAI que vai mudar o rumo da Inteligência Artificial, um empreendedor português descobriu como usar o bot conversacional para criar um negócio super lucrativo em poucos dias..Parece coisa de anúncio de influenciadores suspeitos do Instagram. Ou de gurus que querem vender o segredo para se reformar aos 40. O que parece bom demais para ser verdade normalmente não é verdade, ou tem ali uns espinhos de fraude que mais tarde vão picar..Mas não. Tudo isto surgiu quando João Ferrão dos Santos, que estava a trabalhar como nómada digital em Banguecoque, leu um tweet interessante de Jackson Fall sobre pedir ao ChatGPT que criasse uma empresa. Ferrão dos Santos mudou as variáveis e achou que seria interessante perceber o que a máquina faria com mil euros de capital inicial e apenas uma hora de trabalho por dia do seu co-fundador humano..A máquina criou um negócio escalável e fácil de começar, mas nada na AIsthetic Apparel é disruptivo ou estupidamente inovador. É um negócio simples, que oferece um produto que há no mercado aos pontapés, e ainda assim tornou-se viral. Vendeu mais de 12.500 euros de produto no primeiro mês sem qualquer marketing nem grande equipa, apenas João, dois amigos dinamarqueses e o fiel ChatGPT, que a cada semana parece afiar melhor as suas respostas e interações. Como se explica isto?.O diferenciador é o elemento humano. O João pegou na ideia e escreveu sobre ela na sua conta de LinkedIn, usando o que estudou sobre o algoritmo da rede social para maximizar o alcance da publicação. A estratégia funcionou. Há um apetite tão grande por conteúdos relacionados com o ChatGPT e a Inteligência Artificial que uma história destas se tornou irresistível..T-shirts estampadas com imagens feitas por IA generativa e o ChatGPT como CEO? Sim, a audiência quer. Investidores praticamente atiraram dinheiro para cima do João e da sua marca e as publicações diárias sobre a empresa tiveram um alcance maciço. Mais de 8 milhões de visualizações, o tipo de alcance que nem Elon Musk consegue agora no Twitter com os seus memes sobre antagonistas balofos..Ouvi esta história contada pelo João num parque de Los Angeles, com o horizonte entrecortado por palmeiras e o cheiro do alcatrão que emana naturalmente de poços onde foram encontrados fósseis pré-históricos. Estava ali por acaso, numa viagem imprevista pela Califórnia, atraindo a atenção estonteada de investidores e empreendedores fixados no potencial da Inteligência Artificial..Esse é o motivo pelo qual esta sucessão mirabolante de eventos resultou numa empresa real, com contratos assinados e milhares em vendas. O momento para criar empresas com o ChatGPT era ontem. Possivelmente este tipo de feitos deixará de ser notícia dentro de 12 a 18 meses, quando mais fazedores tiverem encontrado fórmulas de sucesso com este e outros bots conversacionais..Perguntei isso mesmo ao João Ferrão dos Santos, qual o significado da explosão que a sua ideia aparentemente simples teve. Ele sabe que foi pela quase obsessão criada em torno da IA, com uma estratégia de publicações no LinkedIn que funcionou e uma transparência que satisfez a sede por autenticidade que existe hoje, num mundo dominado por filtros, algoritmos duvidosos e egos inflacionados pela infinitude de recursos..Mal entendemos ainda o ponto de inflexão a que chegámos, em que a Inteligência Artificial evolui mais depressa que o que conseguimos absorver. Tenho a sensação de que a Singularidade vai chegar mais depressa que o esperado e a pergunta não será se, mas quando, modelos de IA se tornarão co-CEO de todas as novas empresas.