Desde 2006 que o norte-americano Laurence Boschetto comanda a DraftFCB, rede de agências de publicidade que trabalha para mais de cem empresas do ranking da Global Fortune 500. Ao todo são nove mil publicitários espalhados por 90 escritórios a trabalhar marcas como a Oreo, a Dockers (marca da Levi's) ou a KentuckyFriedChicken. Em 2010, a DraftFCB faturou mil milhões de euros; é a oitava rede mundial de agências em receitas.
Em Portugal, a Draft trabalha o Sporting e a Cofidis, a Grant's, a Chevrolet e o Turismo dos Açores, entre outros clientes. E, apesar de serem apenas 51 pessoas - bem menos dos que os 851 do escritório-mãe, em Chicago -, é em Portugal que a DraftFCB busca inspiração quando vai a concursos como o do Nivea. O escritório liderado por Luís Silva Dias (antigo diretor de arte do suplemento DNA) é, garante Boschetto, um dos três think thanks criativos da rede.
A DraftFCB tem escritório em mais de 90 países. O que é que representa para a rede o escritório de Lisboa?
O Luís [Silva Dias, CEO da DraftFCB Portugal] e o escritório de Portugal são um dos nossos hotspots criativos. Quando fomos ao concurso da conta da Beiersdorf [empresa da Nivea], o Luís foi um dos impulsionares-chave em termos criativos, embora a conta esteja em Hamburgo. O melhor ativo deste escritório para a rede é a sua criatividade. Portanto, o que continuamos a pedir ao Luís é que aumente esse lote de talentos. Temos uns quantos hotspots a nível mundial em termos criativos. Este é um deles, a Argentina é outro e a África do Sul é o terceiro.
Algumas multinacionais estão a levar os seus departamentos de marketing para Espanha - a Coca-Cola foi o caso mais recente. As agências de publicidade vão seguir este movimento?
Temos sempre de seguir para onde vai o cliente. Embora trabalhemos num ambiente de arquitetura aberta - podemos aceder a qualquer recurso em qualquer parte do mundo em tempo real - isso não substitui o cara-a-cara.
Certas multinacionais poderão, então, pôr fim ao escritório em Portugal?
Não penso que seja uma questão de acabar com o escritório em Portugal, mas sim de ter a capacidade de ver qual é o melhor ativo e de encontrar a força de cada escritório. Desse ponto de vista, o nosso escritório de Portugal sempre foi um dos nossos hotspots criativos. Quer o cliente seja ou não de Portugal serão sempre o nosso think thank criativo.
E é também um bom negócio?
Se é um grande negócio? Não. Se é um negócio bem gerido e administrado, com bons clientes e produtos? Absolutamente.
Mais do que a criatividade, os clientes não estarão concentrados no seu custo?
Isso varia de cliente para cliente. Algumas vezes começamos uma relação com o cliente e, antes mesmo de termos o briefing criativo, eles sentam-se connosco e perguntam: "Quanto é que vai custar?" No final do dia tens de ter o trabalho. Se não tiveres as boas ideias que impulsionem o seu negócio, pode custar-lhes pouco, mas não obtêm nenhum retorno.
Pequenas agências, formadas por pessoas que passaram por multinacionais, têm surgido com aparente sucesso em Portugal, ganhando bons clientes em concursos com as multinacionais. Vê-os como uma ameaça?
A diferença entre a nossa rede e outras é que estas têm um misto de 50/50 de clientes nacionais e multinacionais. A razão à qual atribuo o nosso sucesso nos últimos anos é precisamente o facto de a nossa divisão ser um bocadinho diferente: cerca de 20% são multinacionais e 80% são clientes locais. A minha rede não tem o privilégio de, se ganhar uma conta [a nível mundial], se alimentar a network e toda a gente ficar satisfeita. Quer seja em Nova Iorque, em Portugal ou em Itália, existe um espírito empreendedor que os mantém vivos e prósperos, penso que por serem mais locais do que globais.
Têm havido alguns grandes concursos de publicidade no mercado português, como são os casos da EDP ou da Super Bock. Não vi lá a Draft.
(Luís Silva Dias) Estamos no concurso dos CTT. Não estivemos no concurso da Super Bock - não fomos convidados, mas de qualquer maneira não sei se a Super Bock seria o cliente certo para nós, estando a passar pela situação que está, num mercado depressivo. Quanto à EDP, trabalhámos com eles até 2001, em 2004 ficámos em segundo lugar no concurso ganho pela Euro RSCG. Em janeiro ganhámos dois clientes: Famous Grouse e Diário de Notícias [grupo Controlinveste, o mesmo do Dinheiro Vivo]. E estamos ainda em outros concursos.
No ano passado perderam, a nível mundial, a SC Johnsson (SCJ). A dona do Raid estava há mais de 50 anos na agência, era um dos maiores clientes. Como é que se dá a volta à perda de uma conta de 60 milhões de dólares?
Os clientes vão e vêm. Fomos afortunados em estarmos 58 anos com a Johnsson e acredito que os ajudámos a crescer. Eles também contribuíram de uma forma determinante para o nosso negócio. Em determinada altura foram o nosso cliente mais importante. Se tivessem decidido separar-se há cinco ou seis anos ter-nos-iam prejudicado fortemente. Mas nos últimos cinco anos crescemos cerca de 18%, por isso o impacto da saída foi pouco menos de 4% para a rede global. Foi uma perda. Infelizmente, tivemos de despedir algumas pessoas, mas estamos a ter o melhor momento da nossa história. A maior conquista foi no final de 2010, em que ganhámos a conta global da Beiersdorf [Nivea, Hansaplast...].
É pelos novos negócios que vão garantir o crescimento?
Há formas de fazer isso. A primeira é cultivando a relação com os atuais clientes de modo a fazermos mais negócio; a segunda é ganhando novos clientes; e a terceira é por aquisições.
Quais são as opções este ano? Em 2011 compraram empresas.
Uma combinação das três. Desde que perdemos a Johnsson já recuperámos 50% da perda de receita. O nosso objetivo é, nos próximos seis meses, recuperar os restantes 50% através dos atuais clientes, da conquista de novos e de aquisições estratégicas.
Martin Sorrell, CEO da WPP (grupo de comunicação concorrente do grupo Interpublic, ao qual a DraftFCB pertence), prevê um crescimento de 4% para a WPP este ano. É uma previsão realista?
Penso que o mercado vai crescer mais na ordem dos 3% a 4% - costumo inclinar-me mais para os 2,5% a 3%, mas se calhar estou a ser excessivamente conservador. Apesar da Johnsson, temos estado a crescer a um ritmo mais rápido do que a indústria. Penso que iremos manter o nosso crescimento.
E Portugal? Não haver crescimento já será bom...
É incrível a forma como adaptamos as nossas sensibilidades com base na volatilidade das economias. Quando olho para Portugal, Espanha, Reino Unido ou Itália, quatro mercados onde somos operadores com alguma dimensão, para mim, não haver crescimentos anuais já é bom.