ESG é, sem dúvida, uma expressão do momento no mundo empresarial. Não se trata de um conceito em si mesmo, mas sim, de um acrónimo da expressão anglo saxónica Environmental, Social and Governance, que cujo contexto se refere às componentes ambiental, social e de carácter governativo das empresas. A preocupação implícita ao ESG é que as empresas adotem boas práticas com vista à sustentabilidade ambiental, à responsabilidade social (centrada nas pessoas, colaboradores da empresa e outros) e à transparência da gestão e do exercício da função acionista (centrada nas regras de governo das sociedades). É uma expressão, sem dúvida, que caminha no sentido de serem alcançados (pelo menos alguns) dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que compõem a agenda para 2030 adotada por todos os Estados-membros das Nações Unidas, em 2015, bem como o objetivo europeu de neutralidade carbónica em 2050..Além da preocupação com a adoção de boas práticas nas componentes ambiental, social e governativa, por detrás da expressão ESG está também a obrigação de as empresas relatarem ao público as práticas já adotadas e/ou que se comprometem a adotar. Esta preocupação com o relato de informação ESG leva a um conjunto pesado de regulamentos, diretivas e normas emitidas e adotadas na União Europeia, com implicações diretas não apenas nas empresas de (muito) maior dimensão e, mais tarde, em todas as empresas cotadas, como também, e com enfoque muito especial, nas instituições que asseguram o financiamento empresarial, como instituições financeiras e fundos de investimento..E é assim que se assiste a uma “revolução” no contexto financeiro das empresas, as quais, com vista à obtenção de fundos, podem estar obrigadas a cumprir determinados requisitos ambientais ou sociais. E porque se acredita que os investidores no mercado de capitais também valorizam as boas práticas ESG, vão surgindo emissões de obrigações indexadas a indicadores ambientais ou sociais os quais, se não atingidos na data prometida, levam a penalizações financeiras a favor dos obrigacionistas, bem como a comprometimentos de metas ESG nos press releases recorrentes das empresas cotadas, além de determinadas exigências na obtenção de fundos europeus..Acresce que a adoção de boas práticas ESG pelas empresas não envolve apenas ações tomadas ao nível da própria empresa, não obstante o importante papel atribuído ao investimento, conhecimento e inovação neste domínio, como também atividades que extravasam as atividades próprias da empresa e atingem as operações das suas cadeias de valor. Assim, para que uma empresa caminhe no sentido da neutralidade carbónica, ela tem de conseguir medir não só os efeitos ambientais produzidos diretamente pelas suas atividades, como também os produzidos por contrapartes, com especial destaque para os seus fornecedores. Por outro lado, passa-se a exigir às instituições financeiras que mantenham níveis “ambientais” nos seus balanços, o que obriga a que,na atribuição de empréstimos às empresas, tais instituições sejam por elas informadas dos efeitos ambientais dos projetos financiados..É assim, por via direta das empresas às quais se exigem o atingimento de metas, ou que elas próprias se comprometeram a atingir, e por via indireta, porque se trata de negócios que têm por clientes tais empresas, porque se pretende obter fundos europeus ou, até, empréstimos bancários, que o “complicado mundo ESG” vai tocar, mais cedo ou mais tarde, a todo o mundo empresarial..E porquê complicado? Veja-se, a título não exaustivo, o que foi já (ou está em vias de ser) produzido: o Regulamento SFDR (Sustainable Finance Disclosure Regulation) aplicável a instituições financeiras, incluindo fundos, os (pelo menos 4) Regulamentos Taxonomia (que visam quer a qualificaçãoas atividades climáticas e outras, quer a divulgação de indicadores que traduzam o alinhamento das atividades da empresa com objetivos de sustentabilidade), a Diretiva SFDR (Corporate Sustainability Reporting Directive) que prevê a adoção pelos Estados-membros de legislação que obrigue determinadas empresas à divulgação de um conjunto extenso de informação não financeira, informação essa que deve seguir as recentemente publicadas normas europeias de relato de sustentabilidade, ou relato ESG (ESRS – European Sustainability Reporting Standards), que consistem em duas normas de requisitos e divulgações gerais (ESRS 1 e 2), cinco normas de natureza ambiental (ESRS E1 a E5), 3 normas de natureza social (ESRS S1 a S4) e uma norma de conduta empresarial (ESRS G1)..E é de surpreender que seja exigido às empresas um esforço pesado em responsabilidade social, com impacto relevante na sua rentabilidade? É a União Europeia demasiado ambiciosa, impondo tão pesadas e complexas exigências às empresas europeias, num mundo em concorrência global, mas muito desequilibrado em regulamentação empresarial obrigatória? Eventualmente, a resposta até parecer ser positiva, mas não esqueçamos que cabe às empresas uma missão que extravasa a mera remuneração acionista, devendo a sua missão responder a um conjunto vasto de stakeholders. Não esqueçamos o que pretende o nosso “velhinho” Código das Sociedades Comerciais quando, no seu artigo 64.º, refere expressamente que os gestores devem observar os deveres de lealdade, “atendendo aos interesses de longo prazo dos sócios e ponderando os interesses dos outros sujeitos relevantes para a sustentabilidade da sociedade, tais como os seus trabalhadores, clientes e credores”..Luísa Anacoreta Correia, docente da Católica Porto Business School