Que o exercício físico é benéfico para a saúde é um facto inquestionável. Mas até que ponto poderá influir também no desenvolvimento cognitivo e processo de aprendizagem? A psicóloga Joana Rato esteve esta semana à conversa com Nuno Crato, presidente da Iniciativa Educação, em mais uma edição do Educar tem Ciência, um projeto da Iniciativa Educação, em parceria com a TSF e o Dinheiro Vivo.
Joana Rato começou por estabelecer as diferenças entre o que é atividade física, exercício físico e desporto. A primeira designa qualquer atividade em que haja um dispêndio de energia acima dos valores de repouso. O desporto tem um caráter competitivo e implica criar perícia sobre determinados movimentos e técnicas. Já o exercício físico implica "um plano estratégico de aplicação de forças - algo que liga o exercício físico com o objetivo que se quer atingir".
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que crianças e jovens pratiquem 60 minutos diários de atividade aeróbica moderada. "Os dados apontam para que aproximadamente 80% dos jovens não estejam a cumprir estes 60 minutos diários", alertou Joana Rato. Um dado tanto mais preocupante, quando relacionado com os números da obesidade infantil. "Há cerca de 40 anos tínhamos cerca de uma em cada 50 crianças com obesidade. Atualmente, temos uma em cada cinco", referiu a psicóloga para quem esta é uma realidade que deve preocupar as escolas.
À pergunta, lançada por Nuno Crato, sobre a existência real de vantagens cognitivas associadas ao exercício físico, Joana Rato citou estudos recentes que estabelecem uma relação entre exercício e desempenho cognitivo. "Os dados que existem começam a apresentar um efeito de transferência [uma relação] entre aquilo que pode ser o tipo de exercício com a aprendizagem", afirmou. Mais concretamente, o exercício que implica coordenação motora, resistência e até o exercício cardio tem diferentes benefícios a nível cognitivo.
"A coordenação implica o controlo cognitivo e trabalha o funcionamento executivo - a nossa capacidade de fazer o controlo da resposta, movimentar no tempo certo, evitar distrações. E é aqui que pode haver benefícios para o desempenho escolar", explicou a psicóloga, sublinhando que os estudos não fazem uma relação direta entre exercício e desempenho cognitivo. "Este tipo de exercícios vai trabalhar o funcionamento executivo que, por sua vez, vai ajudar a melhorar o desempenho cognitivo", esclareceu.
Esta relação vem, na opinião de Joana Rato, colocar questões sobre o modo como estão organizados os programas das aulas de educação física nas escolas e também sobre a sua localização nos horários escolares. "Pode discutir-se se os programas estão feitos numa ótica de pôr os estudantes a praticar desporto ou se também há momentos em que se possa trabalhar este tipo de exercício com benefícios cognitivos", referiu a psicóloga. Já no que toca aos horários, os estudos científicos mostram que a atividade física é mais benéfica de manhã, contudo, por uma questão de organização, as escolas não conseguem garantir que as aulas de educação física decorram sempre neste período.
"Ainda não há muitos estudos, mas os que apareceram fazem esta relação, sobretudo, dentro do que são tarefas de coordenação que podem ter um maior benefício do que é o controlo cognitivo. Parece-me que é preciso dar mais atenção aos tempos destas atividades no horário escolar e o próprio objetivo da atividade física nos programas curriculares", concluiu a psicóloga, no que foi secundada por Nuno Crato. Contudo, o presidente da Iniciativa Educação defendeu ser necessária alguma cautela, uma vez que a "atividade física não é o remédio para tudo" quando em causa está a aprendizagem.