Jean-Christophe Coquillaud. “Perspetiva-se a manutenção de um nível reduzido de incumprimento”

O CEO do Cetelem, do grupo BNP Paribas Personal Finance Portugal, afirma que é preciso saber dizer “não” ao cliente no momento da concessão de crédito, para prevenir riscos subsequentes
Jean-Christophe Coquillaud, CEO do Cetelem. Foto: Direitos reservados
Jean-Christophe Coquillaud, CEO do Cetelem. Foto: Direitos reservadosJean-Christophe Coquillaud, CEO do Cetelem. Foto: Direitos reservados
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No cargo desde setembro de 2023, Jean-Chistophe Coquillaud dirige em Portugal uma equipa com mais de 600 trabalhadores. Nas respostas enviadas por email, afirma-se otimista para 2024, embora ciente dos riscos para o negócio.

Os novos créditos ao consumo continuam a crescer. É uma realidade sentida também no universo do Cetelem? Qual a evolução do negócio desde o início do ano? 
O Cetelem Portugal iniciou o ano com um primeiro trimestre positivo, num contexto económico desafiante, com a concessão de crédito a manter-se estável. Apesar dos custos de funding não terem vindo a diminuir ao ritmo esperado, no geral, apresentámos bons resultados, impulsionados por uma boa dinâmica comercial, fruto da diversificação do nosso negócio em vários segmentos de mercado, e controlo do risco. Por este motivo, a perspetiva para o futuro é otimista.

O rácio de empréstimos non-performing loans (NPL) [incumprimento] do setor bancário português está no patamar mais baixo de sempre, apesar da pressão exercida pelas taxas de juro. Antecipa que esta tendência se mantenha em 2024?
Face à conjuntura atual, e apesar da evolução das taxas de juro, perspetiva-se a manutenção de um nível reduzido de non-performing loans. Neste âmbito, é importante mencionar a recomendação macroprudencial introduzida pelo Banco de Portugal em 2018, que contempla limites à taxa de esforço como um dos critérios de aprovação de novos créditos. Adicionalmente, a robustez do mercado de trabalho, com taxa de desemprego em níveis historicamente reduzidos e perspetivas de manutenção, de acordo com as últimas projeções, e o aumento do rendimento disponível real, têm contribuído também para manter os níveis de incumprimento das famílias sob controlo e sem perspetivas de aumento significativo. Ainda assim, estamos totalmente conscientes da pressão económica que a inflação exerce sobre as famílias. Por isso, continuaremos a contribuir para essa tendência de nível reduzido de NPL, através da disponibilização de soluções adequadas a cada cliente e uma política de risco proativa na prevenção do sobre-endividamento.

Um estudo da consultora Prime Yield concluiu que 34% do incumprimento no crédito pertence às famílias e que os empréstimos à habitação são responsáveis por mais de metade, ainda assim, o segmento de consumo continua a ter a sua quota. Quais os níveis de incumprimento registados pelo Cetelem em Portugal? 
Como resultado da boa gestão na concessão de crédito, cerca de 98% dos contratos que temos na nossa carteira são reembolsados na íntegra. O nível de incumprimento é residual e prevemos que se mantenha, agora que começam a surgir alguns sinais positivos em relação às taxas definidas pelo Banco Central Europeu.

Ainda na ótica do incumprimento, o Cetelem reforçou medidas para minimizar o risco? 
Temos o dever de adotar uma atitude prudente e assegurar que as famílias mantêm o equilíbrio financeiro do seu orçamento. Não podemos ter uma perspetiva de curto prazo. Se um cliente se encontra em situação de dificuldade, é um problema para o cliente e uma perda para a empresa. Por isso, adotamos uma postura preventiva, ética e responsável no momento da concessão. Saber dizer “não", é importante, no interesse de ambas as partes. Importa referir que são poucos os clientes a manifestar dificuldades em pagar o seu crédito, tal como referi, e muitas vezes o incumprimento decorre de eventos específicos que impactam fortemente os orçamentos das famílias, tais como situações de desemprego, doença, morte do cônjuge, entre outros, e não sobre-endividamento.

Como é que equilibram a necessidade de financiar os clientes - que é o core do negócio - com a implementação de critérios rigorosos na concessão de crédito?
Para apoiar os clientes em situação de fragilidade temos equipas dedicadas que procuram, caso a caso, encontrar a solução mais adequada para cada cliente. Reforçámos ainda os nossos sistemas de preconização para conseguirmos antecipar potenciais dificuldades de reembolso e acompanhar os clientes se surgirem dificuldades.

Espera-se que a proposta de “crédito simples” - igualmente utilizada por outras financeiras - vá ao encontro das necessidades dos consumidores. Mas, não considera que esta ideia contribui para uma banalização do financiamento, tendo em conta o compromisso da instituição com a literacia financeira (que, por diversas vezes, tem como resultado o sobre-endividamento das famílias)? 
“Crédito Simples” não significa facilitismo na concessão de crédito, pelo contrário. A simplicidade traduz-se na user experience que queremos oferecer aos nossos clientes, na clareza da informação que transmitimos e na acessibilidade aos nossos serviços. No Cetelem, crédito simples significa agir com transparência e fornecer boa informação, para que os clientes tomem decisões informadas e conscientes, beneficiando de uma experiência otimizada. Um exemplo é a solução que oferecemos com jornadas de cliente 100% online, mais seguras e com recurso à Chave Móvel Digital e ao Open Banking. Na prática, quando um cliente formaliza o pedido de crédito com o acesso à Chave Móvel Digital, a concessão é concretizada sem ser necessário enviar os comprovativos de identidade e morada porque esta informação é disponibilizada pelo Estado. Se os consumidores também não quiserem ter de enviar comprovativos de IBAN e rendimentos, podem permitir uma ligação segura ao seu banco, através do Open Banking, que permite o acesso à informação financeira do cliente totalmente fiabilizada.

A procura pelo crédito consolidado tem aumentado perante a necessidade de redução da prestação mensal?
A maior procura de crédito destina-se à aquisição de automóvel e ao melhoramento do lar, seja para obras de renovação ou equipamento, como eletrodomésticos e mobiliário. O crédito consolidado faz parte do nosso portfólio de produtos, porque existe procura por parte dos clientes que procuram reduzir os seus encargos mensais, consolidando numa única mensalidade. Entendemos que disponibilizar estas soluções é uma forma de apoiarmos as famílias na gestão dos seus orçamentos familiares. Mas temos um portefólio diversificado de soluções comercializadas de forma direta (através do site, por telefone e nas nossas agências, em Lisboa e no Porto) entre as quais destacamos, o crédito pessoal para grandes e pequenos projetos, crédito automóvel, cartões de crédito e seguros. Somos também parceiros dos principais players do mercado no retalho especializado, no setor automóvel, mobiliário, eletrónica de consumo, além das nossas parcerias bancárias, através das quais disponibilizamos um conjunto de soluções alargadas às necessidades das famílias.

Até que ponto estão comprometidos com a sustentabilidade e responsabilidade social e que iniciativas têm promovido para as alcançar, tanto ao nível da oferta aos clientes, como da própria operação interna?
O nosso compromisso com a sustentabilidade é um aspeto central e uma ambição a longo prazo. Ao nível da oferta, temos produtos destinados ao financiamento de projetos sustentáveis, para acompanhar as necessidades dos consumidores. Estas opções têm condições preferenciais e abrangentes, com particular foco na mobilidade sustentável e soluções para energias renováveis e eficiência energética. Este é um caminho que iniciámos há uns anos, que tem sido percorrido também em conjunto com os nossos parceiros de negócio, disponibilizando-lhes ofertas diferenciadas com condições preferenciais para incentivar a adesão dos consumidores a práticas de consumo mais sustentáveis. Além disso, realizamos várias outras iniciativas na quais procuramos soluções para incentivar a Transição Energética dos particulares, como o recente Action Tank, onde juntámos entidades dos setores energético e financeiro para impulsionar mudanças significativas através de co-criação de soluções inovadoras.  Dentro de casa, os modelos operacionais estão a ser transformados e implementámos diversas iniciativas para redução da pegada ecológica.

Pode exemplificar? 
A desmaterialização dos processos, com vista à eliminação do papel; a disponibilização de cartões 100% reciclados e a sua reciclagem, sendo que, no futuro, prevemos que possam ser desmaterializados. Apoiamos também as equipas na aquisição de viaturas elétricas sem juros e, no âmbito social, instituições de cariz social, além de promovermos o voluntariado e a literacia financeira.

Iniciou a sua jornada como CEO do Cetelem em setembro de 2023. Já identificou oportunidades, objetivos e projetos para Portugal? Pelo meio, há desafios a serem ultrapassados? 
Temos em curso um plano estratégico que tem como ambições continuar a crescer, conquistar novos clientes e ganhar quota de mercado. Queremos ser um companheiro na vida quotidiana dos portugueses, através de soluções que fazem a diferença no dia-a-dia e ser uma entidade que aposta na inovação ao serviço dos parceiros. Paralelamente, entendemos ser crucial investir em formação, reskilling e upskilling das competências das nossas equipas. Estamos otimistas para 2024, mas conscientes dos desafios e do contexto internacional complexo, de grande imprevisibilidade, que continuará a impactar cidadãos e empresas, portanto, estamos preparados para esperar o inesperado.

Qual o balanço que faz do mercado nacional?
Portugal continua a ter uma grande importância, por consubstanciar, num território de menor dimensão, o potencial para o que pretendemos alcançar numa esfera global no BNP Paribas Personal Finance. Nesse sentido, vamos continuar a capitalizar o potencial deste mercado para crescer de forma sustentada. A presença forte e consolidada do Grupo em Portugal, com mais de 10 mil colaboradores, as diferentes linhas de negócio do grupo - e muitos parceiros, robustece a posição do Cetelem, uma vez que as atividades em diferentes setores das várias empresas proporcionam sinergias que aportam valor para clientes e parceiros. Ao mesmo tempo, confere uma posição estratégica favorável a este movimento de crescimento e expansão, e permite acompanhar e dar resposta à evolução da economia do país e às necessidades de consumo dos portugueses.

A empresa foi distinguida pela sétima vez como Top Employer. Quais diria que são os principais elementos que têm permitido esta conquista contínua? Com quantos trabalhadores contam em Portugal? Há objetivos de reforçar a força de trabalho ou os espaços do Cetelem?
Esta é uma distinção que nos orgulha e que é resultado do compromisso que assumimos de procurarmos ser exemplares enquanto empresa e entidade empregadora. Entre os elementos que contribuem para esta conquista destaco quatro eixos de melhorias realizadas: a construção de uma cultura que promove o bem-estar das equipas, melhorando o processo de acolhimento, o equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal, a adoção do trabalho híbrido, a atribuição de benefícios e a criação de programas dedicados ao bem-estar e à saúde mental. Depois, face ao contexto de forte transformação em curso na empresa, foi importante o reforço da comunicação frequente e clara junto das equipas para que todos conseguissem acompanhar a mudança. Reforçámos também a cultura de aprendizagem, com oferta de oportunidades de desenvolvimento para os mais de 600 colaboradores nas soft e hard skills, como mencionei antes, através de vários programas como o Agileea Lean Academy, entre outros. Por fim, a aposta na diversidade. A nossa principal força são as nossas pessoas. Por isso, valorizamos a diversidade de perfis, seja de conhecimentos, experiências, percursos pessoais, profissionais, gerações ou origens. Proporcionamos um ambiente de trabalho acolhedor para todos. Estou certo de que esta riqueza, assente na individualidade de cada um, impulsiona a criatividade, a colaboração e é chave para muito deste sucesso.

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