Kiruna nasceu de uma descoberta insólita. Num território inóspito, 140 quilómetros no interior do Círculo Polar Ártico, a região poderia nunca ter recebido mais do que as passagens esporádicas dos nómadas Saami, não fosse um pastor ter encontrado um estranho magnetismo na terra, no século XVIII. A cidade nasceu sobre a maior mina de ferro do mundo e transformou-se no maior município sueco. Mas hoje, o negócio que lhe deu vida, é também a sua maior ameaça. Largas fissuras rasgaram a superfície e revelaram um prognóstico sombrio: em 100 anos, a cidade vai afundar-se nas profundezas da terra. A solução? Mudá-la de lugar. . A decisão de deslocalizar a cidade para quatro quilómetros de distância da sua atual localização não é de agora. Mas o processo, previsto para se prolongar durante vários anos, foi acelerado para dar resposta a um dos seus principais clientes: a China. . Esta semana, a empresa LKAB, detentora do negócio e responsável por 90% do ferro produzido na Europa, inaugurou mais um nível de escavação, ultrapassando um quilómetro de profundidade. "A mudança é crucial para continuarmos a explorar a mina", disse o diretor-executivo, Lars-Eric Aaro. . Foi na Primavera de 2004 que Kenneth Stålnacke, presidente da Câmara Municipal de Kiruna, recebeu em carta lacrada a notícia que mudaria radicalmente o destino daquele lugar. Estudos confirmavam as suspeitas lançadas por um jornal, em 1978, de que quando o buraco da mina chegasse a um quilómetro de profundidade, a cidade seria atingida por deformações. Para continuar a trabalhar, lia-se no documento, a empresa teria que apontar as escavadoras em direcção ao centro da cidade, tornando impossível a vida à superfície. . O minério produzido pela LKAB é responsável por 64% das exportações suecas, sendo vital para a economia do país. Em Kiruna, a dependência do negócio do ferro é bem visível em todo o município, presente a cada esquina. Desde o turismo - por ano, 30 mil turistas visitam as instalações da mina no monte de Kirunavaara - aos negócios paralelos, ou à importância que assume no mercado de trabalho, a mina sempre ditou as regras do jogo. . Ao todo, a LKAB emprega mais de 3000 pessoas. "Cada trabalhador suporta em média três ou quatro pessoas à superfície", esclarece fonte da Câmara Municipal. "Se a decisão fosse manter a cidade onde está teríamos de encerrar a mina." . A raiz do problema está na chamada "parede de sustentação", que segura a cidade. À medida que o minério é extraído, os espaços vazios são preenchidos com pedras de desperdício. Mas a sua densidade é consideravelmente inferior à do ferro, levando a enorme massa de terra a exercer uma pressão insuportável e a abrir fendas à superfície. "Quanto mais fundo vamos, mais nos aproximamos da cidade", explica fonte da LKAB. . Confirmado o pior cenário , Kiruna começou a emergir para a solução em janeiro de 2007, quando o presidente da câmara apresentou o projecto para a futura cidade. O local escolhido foi o sopé da montanha de Luossavaara. . Muitas das casas de madeira tipicamente escandinavas serão desmontadas e levadas peça a peça. Outras, que pelo tipo de construção não possibilitam o seu desmantelamento em blocos, serão simplesmente arrancadas do chão e colocadas em cima de camiões. As restantes vão ser demolidas e construídas de raiz. O município prevê construir estradas especiais para transportar edifícios de grandes dimensões. . Durante o Verão e Outono de 2006, a autarquia fez uma consulta popular para apurar os edifícios públicos mais queridos da população. Entre alguns históricos que serão destruídos, elegeram-se três símbolos a conservar: a Câmara, a Igreja e a Blackhorn. . Quanto custa mudar uma cidade?Nova auto-estrada - 40 milhões de eurosRede de Água - 5 milhões de eurosDeslocação da Câmara Municipal - 15 milhões de eurosDeslocação da Igreja - 3 milhões de euros . Números da LKAB1.3 biliões de toneladas de ferro retiradas desde 1902300 km de estradas no interior da mina2 km de profundidade (1 explorado)536 km de linha férrea 3700 funcionários7 mil carruagens de ferro por ano