O Montepio vai fazer um aumento de capital no valor de 200 milhões de euros, subscritos pela Associação Mutualista através de investidores institucionais. Porque é que a operação não foi aberta a pequenos investidores?.É preferível mobilizar capitais provenientes quer da Associação Mutualista, quer de investidores institucionais, num quadro em que o funcionamento do mercado e as relações com os pequenos investidores nem sempre é bem percebida. Esta é a melhor via, que suscita menos dificuldades, e que nos permitirá recompor o rácio de capital. A Caixa Económica [banco do Grupo Montepio] cumpre com os requisitos de capital. Mas temos vindo a desenvolver a nossa atividade no relacionamento com a economia, sobretudo com as empresas fora da construção civil, e queremos continuar a fazê-lo. Isso é bom para a economia, para o país, para o emprego, e ter capital para isso é absolutamente decisivo..No aumento de capital em 2013 o Montepio envolveu os pequenos investidores através de unidades de participação. O modelo foi criticado pelo presidente da CMVM, que disse que estes produtos acarretam riscos que os subscritores podem não conhecer. Não teme que este venha a ser um caso como o do papel comercial do BES?.Não. Isto não tem nada a ver com o papel comercial do BES. Não ouvi as declarações do presidente da CMVM, e portanto não as posso comentar. O que posso dizer é que o processo de autorização do fundo de participação do Montepio foi acompanhado pela CMVM. A primeira e única emissão, até ao momento, de 200 milhões de euros colocada em pequenos investidores foi acompanhada, como é das regras, de um prospeto descriminando de forma exaustiva os riscos da operação. Foi colocado nos nossos balcões, e devidamente explicado. As coisas correram bem, não sentimos que os cerca de 25 mil pequenos investidores que nos acompanharam se sintam frustrados. A carta da CMVM que comunicou a autorização do fundo não evidencia quaisquer reservas..Fazemos esta pergunta porque têm sido apontadas semelhanças entre o modelo de governação do Grupo Montepio e o modelo do Grupo Espírito Santo..O Montepio é uma associação mutualista, que pertence praticamente a 650 mil associados, vive um quadro de democracia interna muito exigente, muito acompanhado pelos próprios associados. Não tem nada a ver com um grupo que tinha uma família como principal acionista, e alguns parceiros de percurso. Estamos a falar de coisas completamente diferentes, não só com as diferenças que eu apontei, mas também o facto de o Montepio, como instituição da economia social, ter toda uma prática no desenvolvimento das suas atividades que não encontra qualquer semelhança com as relações do GES com o próprio BES..Mas não reconhece algumas semelhanças com o GES, quando se olha por exemplo para o facto de haver uma concentração de poder em si, para o facto de o banco tradicionalmente conceder crédito ao setor imobiliário e à construção, para a dependência do banco em relação à Associação Mutualista?.Em relação ao facto de haver uma relação entre a Caixa Económica e Associação Mutualista em matéria de capital: se a Associação entende que deve ter uma instituição bancária é natural que, enquanto seu dono, tenha que aportar os níveis de capital que a Caixa Económica precisa para poder operar. A Caixa Económica é um banco como qualquer outro, está sujeito à regulação dos supervisores bancários, do Banco de Portugal, tem que ter os mesmos níveis de capital, paga impostos como todos os bancos, não há nenhuma diferença. Depois, quando a Caixa Económica vende produtos mutualistas, é exatamente como a venda por outros bancos de outros produtos, se calhar produtos de instituições fora do grupo, cujo risco em muitas circunstâncias nem se conhece. No caso do Montepio conhecem-se bem os riscos. Vejamos o caso dos seguros, por exemplo. Quantos grupos não tiveram seguros, nomeadamente o grupo Caixa Geral de Depósitos que tinha a Fidelidade? O grande canal de distribuição dos seguros da Fidelidade era o conjunto de balcões da Caixa, e daí não vem nenhum mal ao mundo, e com os produtos mutualistas acontece a mesma coisa. O que importa reter é como é que a Caixa Económica e a Associação Mutualista são geridas, como é que constituem as suas reservas, como é que provisionam os ativos menos bons. O Montepio tem níveis de provisões, ou de imparidade, que comparam muito favoravelmente com o sistema financeiro. O sistema financeiro tem uma média de 58% de imparidades para os ativos menos bons, o Montepio tem 70% de imparidades sobre esses ativos, portanto estamos muito mais bem provisionados do que a média do sistema..Mas uma estratégia de aumento de capital do banco como a que foi anunciada, no momento em que foi anunciada, não pode ser interpretada pelo mercado nesse sentido? Porque não fazer o aumento de capital depois das duas entidades estarem separadas?.A alteração de estatutos e a separação dos órgãos de gestão da Associação Mutualista da Caixa Económica é uma aspiração muito antiga e que constituiu, na parte que me diz respeito, uma bandeira para ser realizada muito mais cedo do que aquilo que está a acontecer. Sem qualquer exigência por parte dos legisladores ou dos reguladores, o Montepio separou em 2012 os órgãos de gestão da Associação Mutualista e da Caixa Económica. Até 2012, o conselho de administração da Caixa Económica era constituído pelas mesmas pessoas da Associação Mutualista, a assembleia geral era a mesma, o conselho geral era o mesmo. A partir das alterações estatutárias, feitas por iniciativa do Montepio, sem qualquer imposição, separamos os órgãos sociais da Caixa Económica e da Associação Mutualista. Hoje o conselho de administração da Associação Mutualista é composto por umas pessoas, o da Caixa Económica é composto por outras. Há apenas uma pessoa comum, e essa pessoa sou eu. Isso foi feito numa espécie de trade off, dentro o Montepio, porque separar duas instituições que viveram de mãos dadas, como almas gémeas, durante mais de 170 anos, não é uma tarefa fácil e, para desenvolver esta tarefa em boa ordem, era necessário ter alguém que conhecesse muito bem uma e outra realidade. Esse trabalho foi feito ao longo dos últimos dois anos, e estamos agora em condições de dar o salto. É algo que em cerca de três meses estará concluído. Vou continuar à frente da Associação Mutualista e vou fazer parte do conselho geral e de supervisão da Caixa Económica..Um dos nomes avançados para presidir ao banco é o do antigo Ministro das Finanças, Teixeira dos Santos. Já disse que há quatro nomes em cima da mesa, que esse não é o único. Pode avançar outros nomes que estejam a ser ponderados para essa função?.Não vou avançar outros nomes. Normalmente quando se avança um nome, tem-se em vista um de dois objetivos: condicionar ou queimar. Creio que os objetivos que estavam em vista quando se divulgou o nome de Teixeira dos Santos eram exatamente esses..O nome de Teixeira dos Santos fica queimado?.Não digo isso. Não sei porque é que surgiu um na comunicação social e não surgiram os demais, foram nomes que foram discutidos há muito tempo a esta parte no seio do Montepio. Só posso entender que quem divulgou um provavelmente conhece os demais e, se só divulgou um, deve ter em vista ou queimar ou condicionar. Mas no Montepio não nos deixamos condicionar. O Montepio é uma instituição independente, decide por si, de acordo com o que é a democracia interna, e com a vontade dos seus associados..Mas Teixeira dos Santos tem um perfil adequado para liderar a Caixa Económica?.O Prof. Teixeira dos Santos pode fazer aquilo que muito bem entender, tem condições para isso, de idoneidade, de sabedoria, de capacidade de trabalho, relativamente a isso não tenho dúvidas..Como é que viu as declarações de Fernando Ulrich, presidente do BPI, que disse que é uma ofensa comparar o BPI com o Montepio e com o BES?.Não ouvi as declarações do Dr. Fernando Ulrich e não vou comentá-las. O Montepio é uma instituição completamente diferente do BPI, muito mais antiga, tem uma história completamente diferente para contar. É uma instituição da economia social, que emerge da sociedade civil, é constituída por pessoas, o seu capital pertence aos quase 650 mil associados. Também direi que, se alguém quisesse comparar o Montepio ou dizer que o Montepio era igual ao BPI, também me sentiria ofendido. Eu também nunca trabalharia numa instituição da natureza do BPI. Trabalhei na minha vida na Caixa Geral de Depósitos, que era uma instituição pública, sou um homem que está muito mais ligado às coisas públicas e às coisas da economia social, nunca ninguém me viu trabalhar num banco privado puro e duro, e não me verá com certeza absoluta porque não tenho motivação para isso. Estou a utilizar o BPI como imagem, referindo-me à banca privada..Mas tem um problema de princípio com a banca privada?.Não tenho nenhum problema de princípio. Talvez tenha a ver com todo o meu percurso de quem começou a trabalhar com 10 anos de idade por conta de outrem, no campo, de sol a sol, que me distingue, ou que pelo menos me torna uma pessoa muito menos apetente para determinadas relações..Há notícias de queixas aos reguladores, de alguns clientes do Montepio, que dizem que alguns funcionários tentaram convence-los a trocar depósitos a prazo por unidades de participação, sem lhes explicarem que há risco. Já apurou o que se passou?.As instruções que os balcões tinham eram no sentido não apenas de distribuir o prospeto a todos os candidatos, mas também ajudar as pessoas a perceber o conteúdo desse prospeto. Mandamos apurar e verificamos que num ou noutro caso de facto havia razões para pensarmos que a informação não foi devidamente transmitida. Obviamente repusemos a situação anterior. Posso garantir que não há uma prática agressiva..O Montepio Geral foi alvo de uma auditoria pelo Banco de Portugal que, de acordo com a SIC, detetou irregularidades na concessão de crédito e quebras no principio da gestão sã e prudente. Confirma que estas são as conclusões do Banco de Portugal?.Não são. Nego que há irregularidades. Pode haver erros de procedimento aqui ou ali, como há em todo o lado. O que procuramos fazer é, através do desenvolvimento constante do nosso controlo interno, corrigi-los, é disso que se tratará..Quando diz que não são estas as conclusões, isso significa que há outro tipo de irregularidades, ou não há irregularidades?.Tenho a certeza que não existem irregularidades. O Montepio pode cometer erros de procedimentos, mas irregularidades, no sentido forte do termo, não comete..Já aqui mencionamos a separação que vai existir entre a gestão da Associação Mutualista e a da Caixa Económica. Esta separação também abre, de alguma forma, a porta à entrada de privados, no futuro, na Caixa Económica?.Não creio. A Caixa Económica, com a sua natureza, não admite a entrada de capital privado a não ser via de fundo de participação. Se um dia o regulador vier a entender que a Caixa Económica tem que assumir uma outra natureza, então podem colocar-se questões sobre a participação de outro tipo de investidores. Nessa altura, o Montepio já não será uma Caixa Económica, mas isso são contas de outro rosário..Seria desejável que isso acontecesse?.Cada coisa a seu tempo. Aquilo porque nos batemos é por ter uma Caixa Económica completamente integrada no grupo Montepio, independente, com capacidade de capitalização, seja através de investidores institucionais seja no retalho, como sempre foi tradicional, com capacidade de acesso aos mercados. Recordo que, ainda não há muitos anos, a Caixa Económica levantou no mercado, através de emissões hipotecárias diversas e de outra natureza, cerca de 6 mil milhões de euros. Com a crise, optámos por abandonar as colocações de dívida nos mercados, e hoje temos cerca de 200 milhões. Quem já teve 6 mil milhões e hoje tem 200 milhões, facilmente consegue levantar mil, dois mil milhões..Não se prevê, no médio prazo, uma alteração da natureza da Caixa Económica?.Não, não antevejo..Os 3900 trabalhadores do banco têm razões para recear a separação?.Não, não têm. A política de recursos humanos corresponde à nossa política de responsabilidade social interna, que assenta, desde logo, no respeito pelos postos de trabalho. O Montepio ao longo deste período de crise não aumentou nem reduziu significativamente os postos de trabalho, portanto não tivemos uma política agressiva de ajustamento dos nossos custos de estrutura..Em 2013 e 2014, o Montepio teve prejuízos de quase 485 milhões de euros. Para quando um regresso aos resultados positivos?.Quando uma instituição bancária tem uma ligação quase exclusiva com a economia portuguesa, como é o caso do Montepio Caixa Económica, é muito natural que as dificuldades das famílias e das empresas tenham lhes tenham trazido problemas no pagamento dos créditos. Isto traduziu-se em imparidades muito significativas no caso da Caixa Económica. Houve um período em que, através da reestruturações e reforço de garantias, foi possível fazer face a essa calamidade mas, de facto, em 2013 e 2014, houve um bater no fundo, e tivemos que reconhecer perdas potenciais nessa matéria, mas isso traduziu-se numa cobertura do crédito por risco de imparidade em 70%, quando a média do sector está em 58%, o que mostra que somos prudentes nessa matéria. Entre 2011 e 2014 a atividade bancária perdeu 485 milhões, mas o grupo Montepio, nestes quatro anos perdeu 108 milhões de euros, ou seja 0,9% das perdas totais do sistema financeiro que foram de 11,5 mil milhões..Voltando ao banco Montepio 2015, poderemos estar de regresso aos lucros?.A minha expetativa é que o primeiro trimestre tenha resultados positivos e espero que o ano de 2016 alinhe por este..E quando é que a banca portuguesas terá condições para voltar à rentabilidade de antigamente?.Isso vai levar o seu tempo. O principal desafio da banca é a rentabilidade. A banca nacional tem balanços limpos, e uma atividade alinhada com aquilo que a economia permite. No entanto um nível de taxas de juro muito baixos, e esta polémica a propósito dos spreads, dos juros negativos, são fatores que contribuem para uma menor rentabilidade..Quando fala de uma maior aceleração da economia portuguesa é acima de 2% certamente?.Acima de 2%. Mas eu não me surpreenderia que este ano a economia crescesse 2%..Uma das críticas que se fez à banca portuguesa e ao Montepio, foi a de uma excessiva dependência do crédito à construção. Esse problema já está resolvido?.No Montepio não era uma excessiva dependência, era uma exclusiva dependência do crédito imobiliário, habitação e construção. Até 2007 o negócio que o Montepio fazia era esse. A nossa quota de mercado fora do setor de habitação e da construção era praticamente marginal, e hoje temos mais de 6,5% de quota no crédito à economia, nas empresas dos bens transacionáveis, ou seja, exportadoras. No final de 2014, o crédito imobiliário, habitação e construção pesa apenas 48% do total de crédito do banco. Em 2007 era de mais de 85%. O sistema financeiro passou de 52% para 55%..Existe uma possibilidade de fusão entre o BPI e o BCP. Como é que olha de uma forma genérica para a ideia de consolidação de fusões na banca portuguesa?.Não é bom, é fundamental. Não acredito que o sistema financeiro, dentro de meia dúzia de anos, apresente o figurino atual. Não sei como é que isso se vai processar, mas que isso tem de se passar, vai ter de se passar. Não podemos deixar de pensar de uma forma séria e profissional num quadro de fusão ou num quadro de consolidação do sistema financeiro nacional..Este cenário em particular, de uma fusão entre o BPI e o BCP, seria positivo?.Não vou comentar..A Caixa Económica, tendo as características especiais que tem, nunca participará de um tal processo?.Certamente haverá caminhos, é um assunto que veremos a seu tempo..Mas isso implicaria o banco Montepio deixar de uma Caixa Económica e passar a ser um banco privado como os outros..Não necessariamente, há muitas formas de fazer as coisas..Mas isso está em cima da mesa?.O Montepio não deixa de acompanhar com muita atenção todos os desenvolvimentos no sistema financeiro, e naturalmente que no seu programa de trabalhos essa é uma das variáveis para a qual estamos atentos. Não deixaremos de ser um agente ativo nesse processo..No longo, médio, ou curto prazo?.Nestas coisas os horizontes nunca se conhecem. A consolidação do sistema financeiro é urgente, não é preciso ser muito imaginativo para se perceber isso..O PS apresentou o cenário macroeconómico, um estudo feito por economistas que apresentou um conjunto de medidas económicas para os próximos anos, e que vão ser vertidas, na sua grande maioria, no programa eleitoral do PS. Como é que olhou para este documento? Acredita no efeito daquelas medidas?.É interessante que se apresentem medidas alternativas na vida política nacional e olho sempre para essas propostas com grande expetativa. Precisamos de ter propostas claras, diferentes, que não vivamos numa mistura onde nada se distingue. É preciso que haja a oportunidade de analisar propostas diversas, para que os portugueses possam escolher. Estas propostas do PS para a legislatura, ou potenciais propostas, são algo que eu vejo com expetativa e interesse, e penso que tiveram pelo menos este mérito: permitiram separar as águas. Permitiram que os portugueses se mobilizem para analisar, discutir, ponderar, sobre cada uma das propostas e agir em conformidade..Mas quando olha para as propostas concretas, como o congelamento da reforma do IRC, ou a redução das contribuições dos trabalhadores para a Segurança Social, vê medidas boas ou más?.Tudo o que possa melhorar a competitividade das empresas é decisivo. Vejo com bons olhos medidas que vão nesse sentido. Mas também temos que ter uma classe empresarial mobilizada, motivada, preparada para desenvolver projetos, para melhorar a produtividade, para produzir mais e melhor e a preços mais baixos..Mas estas medidas concretas estão de olhos postos aumento do rendimento disponível para as famílias e não tanto na competitividade das empresas..Quando se baixa o IRC obviamente que há aqui uma vontade, quando se aumenta o IRC está-se a reduzir a competitividade das empresas, quando se reduz a TSU dos trabalhadores estamos a canalizar para o consumo alguns recursos que podem exercer um efeito de dinamização da procura interna, e através da procura interna melhorar o desempenho da economia. Ainda há muito pó sobre estas coisas. Será melhor esperar para ver o que sairá do programa do PS e também dos outros partidos.