Negociar do lado grego

A solução mágica do Syriza para resolver a crise grega é não pagar as suas dívidas. Ou, de outra perspectiva, conseguir convencer cada português a enviar para a Grécia um cheque com poucas centenas de euros. Tendo em conta que não temos dinheiro de sobra em Portugal, qual é a melhor estratégia para negociar do lado grego?
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Uma primeira opção é prometer pagar daqui a muitos anos, pedindo-nos para confiarmos na sua palavra e honra até lá. Foi esta a estratégia da Grécia no perdão da dívida há três anos. Depois de não ter cumprido a maioria das promessas que fez na altura, não parece que esta seja uma possibilidade neste momento.

Outra opção era negociar de uma posição de força, em que a Grécia já não precisaria do auxílio europeu. Há um mês atrás, a Grécia tinha eliminado o seu défice externo, e as contas públicas tinham um saldo positivo, excluindo juros. A Grécia não precisava de pedir mais dinheiro emprestado daqui em diante. Só que, ao mesmo tempo que 36% dos gregos votavam no Syriza, estas mesmas pessoas tiraram o seu dinheiro dos bancos gregos o mais depressa possível e deixaram de pagar impostos. As contas gregas voltaram ao vermelho e a força negocial desapareceu.

Uma terceira opção seria conseguir aliados dentro da Europa. Mas, em Inglaterra, França ou na Finlândia, ceder às pretensões gregas aumenta os votos da extrema-direita, que está muito perto de chegar ao poder. Em Espanha, cada sucesso do Syriza é um empurrão ao Podemos, como Mariano Rajoy bem sabe. Por fim, é difícil fazer uma aliança com a Alemanha depois de se ter passado os últimos dois anos a insultar os alemães e a culpá-los de tudo e mais alguma coisa para conseguir votos e ganhar eleições na Grécia.

A quarta opção é aliar-se à Rússia. O interesse russo nesta ligação é óbvio: usar a Grécia como peão nas suas relações com a União Europeia. Os russos não teriam dificuldade em abandonar os gregos num instante em troca de qualquer cedência da Europa. Os gregos podem olhar para a Ucrânia para imaginar o seu futuro se aceitarem o papel de protectorado russo.

A quinta e última opção é ser louco, autêntico ou fingido. No Portugal do "agarrem-me senão eu mato-o" sabemos bem que este postura pode ser muito eficaz nas negociações. No famoso jogo em que dois carros avançam na direção um do outro, perdendo quem se desvia primeiro, o louco ganha sempre. O louco tem de estar disposto a sair da União Europeia, confiscar as poupanças dos gregos, e causar o aumento da pobreza. Ele tem de defender políticas que sabemos levam ao desastre pelo menos desde a queda do muro de Berlim. Tem de prometer fortunas quando nada tem no bolso. Quanto mais irresponsáveis as suas posições, e mais catastróficas as suas consequências, mais credível é a sua loucura, e melhores as hipóteses do outro lado ceder para evitar o sofrimento de todos. Se tudo falhar, o louco pode sempre culpar os malvados europeus imperialistas e capitalistas. As próximas semanas vão ser muito interessantes.

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