Um Governo com vontade reformista?
Como era expectável, vamos ter um governo de continuidade. E ainda bem. Um executivo formado por ministros com experiência governativa, familiarizados com a máquina do Estado e conhecedores profundos dos dossiês é uma enorme vantagem, sobretudo numa conjuntura de incerteza e turbulência internacional. Não há tempo a perder no ataque aos problemas e desafios do país, designadamente os que condicionam o nosso crescimento económico. A saber, a produtividade e competitividade das empresas, a execução do PRR, as barreiras ao comércio internacional, a desaceleração da economia global ou a tensão geopolítica.
É um governo de continuidade, sim, mas com auspiciosas novidades ao nível da orgânica interna e da equipa ministerial. Foi uma surpresa a saída de Pedro Reis da Economia, dado o seu bom desempenho no ministério. A nossa brilhante vitória de ontem frente à Alemanha permite uma analogia ao nosso desporto-rei, refletindo uma verdade comum no futebol: um jogador pode ser extraordinário, mas a sua posição em campo pode não ser a que melhor aproveita as suas qualidades. Por exemplo, um jogador com grande capacidade de driblar e de finalizar pode ser eficaz no ataque, mas se estiver a jogar no meio-campo defensivo a sua performance sairá prejudicada.
Por essa razão, no que respeita à orgânica, é de assinalar a junção das pastas da Economia e da Coesão Territorial. Faz sentido gerir os fundos europeus em função das necessidades de investimento do tecido económico e em particular das empresas. Acresce que, reduzindo as assimetrias regionais, a nossa economia fica mais forte, equilibrada, coesa. Manuel Castro Almeida dá todas as garantias de exercer bem o cargo.
Ainda em relação à orgânica do governo, quero saudar a criação do Ministério da Reforma do Estado. Parece-me um sinal da vontade reformista do novo executivo e logo numa área que, reconhecidamente, carece de melhorias ao nível da transparência administrativa, eficiência processual e racionalidade económica. É urgente reduzir a burocracia, otimizar a relação do Estado com as empresas, acelerar a transição digital na Administração Pública, eliminar redundâncias e desperdícios na máquina estatal e melhorar os serviços aos cidadãos. Tudo isto vai, naturalmente, favorecer o desenvolvimento económico do país.
Em relação às novidades do elenco ministerial, são grandes e justificadas as expetativas. Temos um governo aditivado pela entrada de duas pessoas de reconhecida competência e mérito nas suas áreas de atividade: Gonçalo Matias e Maria Lúcia Amaral. O primeiro terá a seu cargo a já referida pasta da Reforma do Estado, gozando da prerrogativa de ser ministro adjunto. Isto significa que estará próximo do primeiro-ministro e contará com o
seu respaldo político para executar uma reforma indispensável e para a qual dispõe, inegavelmente, de conhecimento e experiência. Maria Lúcia Amaral tem também um currículo invejável e muitos anos de serviço público, reunindo as condições para liderar a difícil pasta da Administração Interna.
Sem qualquer desprimor pelo novo titular da pasta, Carlos de Abreu Amorim, o tempo dirá a falta que fará a este governo um ministro com as qualidades de Pedro Duarte, o discreto e eficaz anterior ministro dos Assuntos Parlamentares e agora candidato à CM Porto.
Em suma, o novo governo parece-me qualitativamente bom e bem organizado. Resta saber se, em face da fragmentação parlamentar e da efervescência populista, conseguirá pôr em prática as reformas de que o país carece. Neste ponto, também estou otimista. Conto com a sensatez e responsabilidade dos partidos moderados da oposição, bem como com a vontade reformista do novo governo e a consciência generalizada de que o seu sucesso é fundamental para a preservação do regime democrático.
Espero que a economia esteja no centro da atividade governativa e, consequentemente, que haja uma especial preocupação com a produtividade e competitividade das empresas. A superação das dificuldades e desafios já referidos vai depender, em larga medida, da capacidade das empresas para criar valor, emprego e inovação e, desta forma, gerar prosperidade para os portugueses.
Armindo Monteiro é Presidente da CIP – Confederação Empresarial de Portugal