Um programa auspicioso

Publicado a

O Programa do Governo prossegue a estratégia do anterior executivo, reflete as propostas eleitorais da AD e procura ir ao encontro de preocupações candentes da sociedade portuguesa, como o sentimento de insegurança, o descontrolo da imigração ou a degradação dos serviços públicos. Neste sentido, é um programa inteligente na adequação das medidas às transformações do país e do mundo, bem como à nova correlação de forças no Parlamento. Tudo isto sem que o Governo abdique da sua visão moderada, europeísta e reformista para o país.

É de saudar que o Programa do Governo apresente medidas há muito reivindicadas pelos empresários. Por exemplo, a redução do IRC, com diminuição gradual até 17% (15% para PME); a simplificação e previsibilidade fiscais, limitando a discricionariedade da autoridade tributária; a reforma do Estado e o combate à burocracia, facilitando a vida dos cidadãos e a atividade das empresas; a revisão da legislação laboral, com vista a torná-la mais flexível e a conciliar a lei da greve com o interesse público; o reforço da capitalização das empresas e do ecossistema de capital de risco; a garantia de que o Estado passa a pagar aos fornecedores até 30 dias, o que contribui para a melhoria da liquidez das empresas; e a modernização de infraestruturas críticas, como a rede aeroportuária e a rede de Alta Velocidade.

Estas medidas são potencialmente promotoras da competitividade do tecido empresarial e algumas delas favorecem a sustentabilidade financeira das empresas e a sua capacidade de crescimento. Trata-se, neste sentido, de medidas que concorrem para a criação de riqueza e emprego. Dois fatores essenciais para um desenvolvimento socioeconómico mais equilibrado e robusto, uma redistribuição de rendimentos mais justa e um investimento mais intenso na qualidade de vida das pessoas.

Este programa é, aliás, bastante ambicioso nas metas para o salário mínimo, 1.100 euros, e para o salário médio, 2.000 euros. Resta saber se as medidas enumeradas, e que à partida alavancam a criação de valor, são suficientes para sustentar esta subida de rendimentos. É que o contexto internacional de incerteza, volatilidade e tensão não indicia um crescimento económico que possibilite tão expressivo salto salarial. Acresce que, no Programa do Governo, não se vislumbram medidas específicas para responder ao previsível agravamento do cenário geopolítico e geoeconómico, designadamente no que respeita ao comércio global.

Outra lacuna deste programa é a ausência de medidas específicas para aumentar a produtividade, aquela que é a grande vulnerabilidade do nosso tecido empresarial. O país necessita de um grande investimento na qualificação e reconversão profissional, na

digitalização e capacitação tecnológica, na eficiência dos processos e na otimização do trabalho para que as empresas melhorem o seu desempenho. Da mesma forma que, à semelhança do resto da Europa, Portugal deve densificar a sua estratégia para o desenvolvimento científico e tecnológico, com vista à intensificação da inovação nas empresas. Aliás, o discurso do Governo sobre ciência, tecnologia e inovação tem sido pouco assertivo, contrariando as recomendações do relatório Draghi.

O Programa do Governo deixa bons auspícios. As prioridades económicas são as corretas, as medidas favorecem a atividade empresarial e parece firme a vontade de desagravar a fiscalidade, aumentar os rendimentos e reformar o Estado. A ver vamos se o difícil quadro internacional não fará de algumas das medidas meros paliativos ou boas intenções.

Armindo Monteiro

Presidente da CIP – Confederação Empresarial de Portugal

Diário de Notícias
www.dn.pt