Portugal destaca-se como destino de férias para estrangeiros

Em entrevista ao Dinheiro Vivo, Natalia Lechmanova, Chief Economist Europe, Middle East & Africa do Mastercard Economics Institute, explica as conclusões do estudo Travel Trends da Mastercard.
Portugal destaca-se como destino de férias para estrangeiros
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Como descreveria Portugal como destino de férias, segundo o novo estudo Travel Trends 2024 da Mastercard?

Natalia Lechmanova (NL): O que descobrimos no último relatório Travel Trends é que Portugal continua a ser um destino desejado pelos viajantes de todo o mundo. As dormidas e as chegadas de voos a Portugal recuperaram significativamente acima dos níveis anteriores à pandemia. Por outro lado, o país tem sido um dos destinos europeus com crescimento mais rápido e é cada vez mais popular entre os turistas dos EUA, que representam agora 9% de todas as chegadas, contra 6% em 2019. Como os turistas norte-americanos são menos sensíveis aos preços do que os consumidores europeus, tendem a gastar mais em hotéis, restaurantes e experiências, facilitando ainda mais o forte crescimento do setor. Apesar de ter recuperado totalmente para os níveis anteriores à pandemia, o setor das viagens em Portugal não atingiu as limitações de capacidade para continuar a crescer. Isto deve-se ao facto de a época de viagens se ter expandido para além dos meses de pico de julho e agosto para a chamada "época baixa". Trata-se dos meses adjacentes de maio e junho e de setembro e outubro, em torno da época alta. Viajar durante esses meses é uma boa opção para os viajantes que procuram custos mais baixos, menos multidões e temperaturas mais amenas. Os agregados familiares que não têm de se deslocar durante as férias escolares – um número cada vez maior de reformados e de agregados familiares sem filhos – parecem preferir viajar fora da época alta. Estes são apenas alguns dos tópicos que abordamos no nosso mais recente relatório global Travel Trends 2024 do Mastercard Economics Institute, que apresenta uma análise do setor em 74 mercados, com base em dados de transações exclusivos, agregados e anonimizados, incluindo do Mastercard SpendingPulse™.

O que explica esta procura incrivelmente duradoura de viagens?

NL: Tal como já tínhamos observado no nosso Economic Outlook para 2024, a economia tenderá a ser definida pelo abrandamento da inflação e das taxas de juro elevadas, além do facto de os consumidores europeus e de outras regiões do mundo estarem a beneficiar do crescimento dos salários, que está a ser superior à taxa de inflação. Por outro lado, a descida das taxas de juro está também a começar a aliviar a pressão sobre os empréstimos à habitação o que se traduz, também, num fator adicional ao poder de compra, que os consumidores estão a utilizar para aumentar as chamadas despesas discricionárias. No âmbito destas despesas discricionárias, os consumidores continuam a mostrar um apetite insaciável por "experiências", como viagens ou refeições fora de casa, em vez de "coisas" materiais. Mesmo quando viajam, as despesas em experiências como museus, eventos ao vivo ou vida noturna totalizam agora 12% das despesas turísticas a nível mundial, de acordo com a SpendingPulse Destinations, que analisa as vendas a retalho em lojas físicas e online, através de todas as formas de pagamento - a percentagem mais elevada em pelo menos cinco anos. Além disso, verificamos que os turistas procuram locais com autenticidade e que também lhes permitam tirar o máximo partido dos seus orçamentos para desfrutar das experiências de viagem. E, como todos sabemos, Portugal é muito atrativo em ambas as frentes, o que explica o facto de a economia portuguesa continuar a ser uma das que mais cresce na Europa, superando a média da Zona Euro, em parte devido à recuperação contínua do setor das viagens.

“Os turistas dos EUA representam agora 9% de todas as chegadas a Portugal, contra 6% em 2019”

Que destinos se destacam em Portugal, tendo em conta as diferenças de região para região do país?

NL: O que descobrimos no nosso relatório é que Lisboa é preferida pelos turistas espanhóis (158%), franceses (73%) e britânicos (63%), enquanto o Porto é o principal destino para suíços e britânicos. Faro é igualmente preferida pelos espanhóis (53%). Nas ilhas, o Funchal, na Madeira, é mais procurado pelos turistas alemães (53%) e suíços (38%), enquanto Ponta Delgada, nos Açores, é preferida pelos canadianos (42%).

Quais são as outras tendências que identificou neste estudo?

NL: Uma das tendências mais interessantes é a dos destinos. Analisámos o destino "tendência" deste verão, que se refere aos destinos que registaram o maior pico de reservas em relação à tendência a longo prazo. Munique está no topo da classificação global graças ao Euro 2024. Tóquio vem em segundo lugar, uma vez que o iene fraco fez do Japão um destino acessível. E Tirana, na Albânia, é a terceira, pois os viajantes europeus sensíveis ao preço vêem-na como uma alternativa mais barata a Itália, bem como um local pouco descoberto que pode proporcionar uma experiência autêntica. Lisboa é o segundo destino mais popular para os turistas britânicos e está no top 10 para os viajantes dos Emirados Árabes Unidos, enquanto Faro está no top 10 para os espanhóis. Entretanto, para os portugueses, quando viajam para o estrangeiro, todos os dez destinos mais populares estão na Europa, liderados pela Suíça, França, Espanha, Itália, Alemanha e Áustria, mais uma vez um sinal da sensibilidade dos viajantes portugueses aos preços.  O turismo na Albânia, por exemplo, registou um forte crescimento, com o número de rotas aéreas a duplicar desde 2019 e as chegadas de turistas a aumentar de 12 milhões em 2019 para 17 milhões em 2023.

Para além das viagens aéreas, os cruzeiros também estão a ter um regresso notável, com as transações globais de passageiros de cruzeiros a situarem-se cerca de 16% acima dos níveis de 2019 no primeiro trimestre, principalmente porque, para muitos viajantes, a diferença crescente entre os preços dos cruzeiros e dos hotéis tem feito dos cruzeiros uma opção de viagem mais económica.

“Os dez destinos mais populares para os portugueses estão na Europa, liderados pela Suíça, França, Espanha, Itália, Alemanha e Áustria, sinal da sensibilidade dos viajantes portugueses aos preços”

O estudo também destaca a importância dos eventos no aumento da procura de destinos e no impacto destas na economia, sejam eles desportivos ou espetáculos. Recentemente, foi referido o impacto do concerto de Taylor Swift no país. Que lições podemos tirar deste fenómeno?

NL: Todos concordam que a Taylor Swift é uma força cultural, mas nem todos conhecem a força económica que ela representa, nomeadamente em termos do impacto económico que tem nos locais onde atua.  Por exemplo, durante os dias em que atuou em Madrid, vimos as despesas em hotéis aumentarem 31% em relação ao ano anterior, as despesas em restaurantes 16% em relação ao ano anterior, o vestuário 35% em relação ao ano anterior e as joias 19% em relação ao ano anterior. Assim, o concerto não é apenas uma oportunidade para desfrutar do evento em si, mas também para viajar, sair, comprar roupas giras para o espetáculo ou “pulseiras da amizade". As cidades mais pequenas da Europa, como Lyon, registaram um impacto ainda maior: os gastos em hotéis aumentaram 118% por ano e os gastos em restaurantes 23% por ano nos dias do concerto. O maior impacto nas cidades mais pequenas explica-se por uma capacidade mais limitada, especialmente no que se refere ao alojamento, o que, por sua vez, permite aos hotéis aumentar as receitas através do aumento dos preços para fazer face ao aumento da procura.

É exatamente isso que parece ter acontecido em Portugal. Em maio, a inflação hoteleira acelerou para 13,4% y/y de 0,5% y/y em abril, com os preços dos hotéis a dispararem durante o concerto de Taylor Swift em Lisboa.

Em suma, estes eventos criam um impulso na procura com impactos claros na economia e, por conseguinte, estes efeitos devem ser considerados no momento da criação e definição de estratégias de turismo que maximizem o potencial de criação de valor.

Como referiu anteriormente, existe uma maior apetência dos consumidores por experiências. Esta é também uma tendência registada em Portugal?

NL: Sem dúvida. De acordo com um estudo que também realizámos recentemente sobre as intenções de consumo e que incluiu Portugal, verificámos que os consumidores estão ávidos de experiências e a maioria (82%) planeia gastar o mesmo ou mais em experiências este ano. Para além das viagens, as principais intenções de compra para este ano são os concertos de música ao vivo (34%), as escapadelas relacionadas com o bem-estar (40%), as experiências familiares ou gastronómicas (39%) e as experiências ao ar livre gratuitas (36%). De facto, mais de quatro em cada cinco (85%) dos portugueses afirmam que este tipo de despesa vale geralmente, ou quase sempre, a pena, com 30% dos consumidores a afirmarem que poupam parte do seu orçamento familiar para gastar em experiências. Estas alterações nos comportamentos de consumo explicam, em parte, não só o crescimento da procura de viagens, mas também a grande afluência a grandes espetáculos e eventos desportivos ou os gastos em experiências gastronómicas.

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