A experiência de quem está na Santa Casa revela que a maior parte dos beneméritos entram em contacto com a instituição, ainda em vida, dando conta das suas intenções. Não foi este o caso dos holandeses; não fizeram qualquer contacto, mas a SCML tornou-se conhecida para eles depois de a mulher ter sido operada num dos seus hospitais..O contacto e o conhecimento da atividade, da missão e da obra da Santa Casa levam muitas pessoas a escolhê-la como herdeira. E há mais de 510 anos que o fazem. "As pessoas tomam esta decisão porque querem ter a certeza de que os seus bens serão mantidos e que continuarão a ser úteis a alguém", refere Helena Lucas, diretora do Departamento de Gestão Imobiliária e Património (DGIP), acentuando que 93% do património da Santa Casa provém de heranças, legados e doações..A generosidade dos beneméritos materializa-se num dos lemas da instituição liderada por Pedro Santana Lopes: receber para dar em troca. O que faz, então, a Santa Casa com todo o vasto património que detém e ao qual se juntaram, em 2014, mais nove prédios cujo valor ascende a 1,5 milhões de euros? Coloca-o ao serviço de causas que estão na sua génese, ou seja, destina-o a equipamentos hospitalares, lares, centros de dia ou residências de acolhimento de vítimas de violência doméstica, por exemplo. E há também uma parte que é destinada ao arrendamento, cuja receita reverte para as causas sociais da SCML.."Neste momento, temos 700 contratos de arrendamento", adianta Helena Lucas. A nova lei das rendas veio permitir à Santa Casa atualizar os contratos antigos e subir rendas que estavam congeladas nos 10 ou 20 euros. Dos 342 casos anteriores a 1990, já foram renegociados cerca de 144, o que permitiu subir o valor das rendas de 25 800 euros para os 62 mil euros. As vendas são raras. "O nosso objetivo não é o lucro, mas ganhar capacidade para fazer mais. Por isso, quando nos deixam mais cinco frações, não pensamos em vendê-las. Nem pensar", sublinha a responsável pelo Departamento do Património..A preocupação dos doadores em ver o seus bens ao serviço dos outros faz que alguns indiquem a utilização que pretendem que se lhes dê. Mantero Belard, por exemplo, deixou uma casa no Restelo e estipulou que apenas pode ser usada como lar de idosos para artistas, Carolina Picalusa de Andrade legou o seu palacete (localizado em pleno Bairro Alto e onde está instalado o Centro Social de São Boaventura) para que fosse usado como centro de recolhimento para raparigas. Deixou ainda um outro pedido: o quarto da sua filha (que morreu de tuberculose aos 22 anos), conhecido como "quarto da menina", teria de ser preservado tal como se encontrava..O ritmo das benemerências vai mudando de ano para ano. Em 2013, as heranças e doações registaram uma quebra, mas em 2014 o valor dos imóveis recebidos aumentou 160% e os donativos em dinheiro ultrapassaram os 135 mil euros (mais 180%). Entre os casos de benemerência mais recentes destaca-se o de Delmira Maçãs, de Portalegre, deixou 71 edifícios e propriedades rústicas à SCML, deixando um pedido: que os seus escritos (incluindo os seus poemas) fossem publicados até dois anos após a sua morte, ocorrida em 2007.