Só a Apple pode mudar este rumo

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Há nove anos, quando os famigerados Google Glass foram apresentados como a próxima grande coisa na digitalização da realidade, a ideia de estender os sentidos era incrivelmente sedutora. Pensávamos nos óculos escuros do Exterminador Implacável com entusiasmo. Queríamos pôr inteligência à frente dos nossos olhos, de forma a que a tecnologia pudesse quebrar as barreiras da nossa fisicalidade. A extensão dos sentidos era interessante. A sua concretização é que falhou.

É que ninguém queria usar uns óculos toscos com um quadrado minúsculo no canto, e desde então várias alternativas foram tentadas sem que nenhuma sobressaia no mercado. O frenesim em torno dos óculos de realidade virtual, que teve um pico alguns anos depois dos Glass, nunca saiu das franjas. As capacidades de realidade aumentada nos smartphones pareceram dar o salto com o Pokémon Go, mas o sucesso deste foi uma excepção, não a regra.

E a última década tem sido prolífica em abordagens para dar às pessoas algo que elas não parecem não querer. Para lá da utilidade comprovada em áreas como a saúde e o sector logístico, ou do apelo original nos videojogos, gadgets que transportam os utilizadores para cenários digitais não têm um sucesso de massas.

As projecções até apontam para uma subida sustentada das vendas, e sabemos que há investimentos significativos a serem feitos nesta área. A realidade estendida (XR), um misto entre a realidade aumentada e a realidade virtual, está a ter desenvolvimentos e a despertar interesse. Mas a chegada às massas? Ninguém conseguiu. O Facebook mudou de nome para Meta, Mark Zuckerberg tem despejado milhões para cima do metaverso e dos óculos Meta Quest, e ainda assim está aquém do que esperava.

A Magic Leap acabou com a divisão de consumo. A Samsung acabou com o Gear VR.

Há esta ideia de que se a Apple não entrar no jogo não haverá uma explosão.

Isto é algo que já ouvi de vários analistas nos últimos anos. O mercado tem estado à espera que a Apple lance a sua versão de um dispositivo para a realidade virtual e/ou realidade aumentada. A gigante de Cupertino é notória por não ser a primeira a lançar-se num determinado segmento, mas sim a fazê-lo quando o produto está polido e permite criar um ecossistema à sua volta.

O iPhone não teria sido tão revolucionário sem a App Store, e o Apple Watch não seria o sucesso que é sem as apps e serviços que lhe estão associados. Da mesma forma, uns óculos de realidade virtual e aumentada não servem de muito sem o apelo de conteúdos e funcionalidades exclusivas. Esse tem sido o problema destes dispositivos até agora: a tecnologia é boa, mas os consumidores não têm grandes incentivos para a utilizar.

É isso que poderá mudar já em 2023. A Apple tem estado a trabalhar num dispositivo VR/AR - dizem os rumores, claro - e a Bloomberg avançou recentemente que o gadget vai correr um novo sistema operativo, cujo nome foi alterado para xrOS. A agência deu conta de que entrou um pedido de registo de marca para "xrOS" na União Europeia, Estados Unidos e alguns países asiáticos.

Isto deu gás à expectativa de que o próximo produto da Apple seja lançado em 2023, depois de anos sem a entrada da marca num segmento novo. A Apple é menos de experimentar que outras empresas. E o seu histórico explica porque é que a indústria está a salivar pela sua chegada: iPhone, iPad e Watch provocaram uma expansão enorme nos seus segmentos e continuam a liderá-los, repetindo proezas do passado (iPod, Mac). Se há marca que consegue lançar produtos premium e chegar às massas é esta. Se há marca bem posicionada para lançar um mundo "meta" onde os consumidores queiram passear, é esta também.

Talvez daqui a um ano estejamos a analisar como a Apple mudou o rumo da realidade virtual e aumentada, depois de anos a tentarmos perceber porque é que - uma e outra vez - esta indústria nunca levantou voo.

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