Sport Lisboa e Ipanema. A barraca do Benfica no Rio de Janeiro

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Quem rola pelo calçadão de Ipanema pode ver a bandeira do Benfica desfraldada no areal, no conhecido e apregoado Posto 9, entre a Rua Vinicius de Moraes e a Farme de Amoedo. Fosse a praia carioca um bairro lisboeta e estaríamos no Chiado.

Em vez de miúdas descendo a Rua Garrett temos garotas de biquíni, em vez de pastelarias e lojas de cadeias internacionais, temos panteras negras - caipivodka black com fruta - e sportings no menu da barraca do Chico, que desde dezembro passou a ser também a barraca do Sport Lisboa e Benfica no Rio de Janeiro.

Encontro-me com os produtores desta ideia quando o Sol está a pique e as havaianas fervem na calçada. Diogo Anjos e João Viana Ruas descem comigo para o areal, cumprimentam Chico, o dono da barraca, e Diogo questiona um dos empregados: "Galo, você viu os vídeos do Benfica que postei no Face?"

Um guarda-sol montado e três cadeiras na sombra depois, Diogo e João, amigos há cinco anos e companheiros de negócios no Brasil, começam por pedir sportings. A explicação aparece no cardápio que Galo me entrega: "Sporting: garrafa de água, ou seja, não faz mal a ninguém."

É ali, naquele spot de Ipanema, que se encontram muitas vezes para falar de trabalho e definir agendas. Foi ali que surgiu a ideia para a barraca do Benfica, para negócios e até para novos desportos como o futegolfe - já lá iremos. Há entre eles a cumplicidade dos rapazes e o vigor dos empreendedores, uma apetência para o disparate se jogam conversa fora, mas também uma atenção constante às oportunidades que o Brasil oferece, em particular no mercado imobiliário. Os rapazes, como se diz aqui, estão ligados.

Em dezembro, Diogo e João, benfiquistas proativos, repararam que muitas barracas de praia têm bandeiras de clubes, quase sempre brasileiros - o Vasco, o Flamengo, o Fluminense. Chico, dono da barraca do Chico & Mar, número 67, tinha apenas uma bandeira do Brasil e sempre fora um anfitrião impecável.

"O Benfica é o maior clube de Portugal, há cada vez mais portugueses no Rio, ou seja, mais benfiquistas", explica Diogo. "Nós queríamos um lugar onde os benfiquistas e os portugueses pudessem vir conversar e beber uma cerveja. Um lugar para nos encontrarmos. Fomos falar com o Chico e fizemos uma proposta."

Diogo e João providenciariam bandeiras, faixas, camisolas oficiais do Benfica para os empregados e até um menu temático. Também haveria cerveja portuguesa. Em troca, Chico teria mais clientes e garantia que, com uma página no Facebook - Benfica Posto 9 Ipanema - com 193 membros, se organizariam ali mais atividades além do levantamento da caipirinha: torneios de futebol, aulas de futevólei, campanhas para recolha de lixo. Mais gente, mais negócio, mas também algo em sintonia com o espírito atual do Rio, sublimado no slogan da Prefeitura: "Rio: eu amo, eu cuido". E, claro, o futegolfe, de que falaremos mais adiante.

Chico, com 37 anos bem curtidos na cara morena, explica-me porque aceitou a proposta: "O meu time é o Atlético Mineiro, sempre fui diferente. Hoje toda gente é do Barcelona ou do Real Madrid. Eu já conhecia o Benfica. E falamos a mesma língua." Chico, morador da favela da Rocinha, que enfrenta um verão difícil por causa dos dias de chuva, chega à praia por volta das seis da manhã para montar a barraca e descarregar centenas de cadeiras, chapéus-de-sol, sacos de gelo e paletes de cerveja. Por vezes só volta a casa de noite: "A galera quer ficar aí para ver o pôr do Sol e beber." Pergunto-lhe se há muitos curiosos, gente que passa e faz perguntas. "Há muitos benfiquistas, até estrangeiros. Mas também vem aqui gente dos rivais me oferecer dinheiro para queimar a bandeira."

Diogo, 31 anos, está há quatro no Rio, como gerente duma confeitaria que faz parte do negócio da família. "Sou um cliché, o portuga que trabalha na padaria" diz, embora a sua história seja diferente dos Joaquins e Manéis que chegaram há décadas, muitos sem saber ler ou escrever (literalmente), para triunfarem no mundo da panificação.

João, 28 anos, ainda não embarcou na torrente da nova emigração para o Brasil, feita de gente jovem, licenciada, com experiência profissional, como o amigo Diogo. Trabalha com a família, dona de duas empresas de construção: "Temos uma em Portugal, centenária, e outra aqui há 30 anos. Por enquanto vou e venho. Amanhã vou para Lisboa, mas já estou aqui outra vez no final de fevereiro."

Nessa semana, Eusébio fez 70 anos, o Benfica goleou e já podiam ver-se os jogos, na sombra de vários chapéus providenciados por Chico, num computador que aproveita a rede wi fi grátis da orla costeira. Diogo diz que a transmissão dos jogos vai trazer ainda mais portugueses, sejam ou não do Benfica. A barraca do Benfica já se tornou um ponto de encontro: se alguém chega Chico informa onde estão os amigos; os portugueses aparecem cada vez mais.

Por isso e porque esta época tudo flui para os benfiquistas como num jogo de goleada, Diogo e João estão felizes na tarde de verão carioca em que João explica, por fim, o futegolfe: "Tem de ser num dia de chuva ou muito nublado, para haver pouca gente na praia. Fazes um buraco a umas centenas de metros de distância, uma espécie de green, e jogas com uma bola de futebol. Já experimentámos aqui."

Embora entusiasmado, desilude-se quando lhe pergunto se é uma ideia original: "Não, nós julgávamos que era, depois fomos ver à net e já alguém pensou no mesmo."

Mas logo passa uma morena de óculos espelhados no doce balanço do mar (passaram várias durante a entrevista), e os rapazes perdem o fio da conversa, esquecendo que há ideias que funcionam melhor que outras. Barraca do Benfica 1 - Futegolfe 0.

Retrato

Chico tornou a sua barraca na praia de Ipanema, no Rio de Janeiro, temática com o Benfica no centro do negócio. Diogo e João arranjaram bandeiras, faixas, camisolas oficiais para os empregados e até um menu temático. A barraca organiza torneios de futebol, aulas de futevólei, campanhas para recolha de lixo, entre outras atividades. ° E até tem uma página no Facebook Benfica Posto 9 Ipanema

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