Impera desde há décadas, em Portugal, uma cultura empresarial predominante que favorece o lucro acima de qualquer outra vertente. Em linha com a visão mais tradicional do capitalismo, há a ideia de que o lucro é a razão de ser das empresas. Nada mais errado! Não conheço nenhum empreendedor que lance um novo projeto, "o seu projeto", para ficar rico. Empreende-se para concretizar uma ideia, o sonho de fazer algo diferente, de transformar o mundo.
Hoje, as novas gerações procuram, naquilo que fazem profissionalmente, um propósito, e é isso que as faz escolher os seus empregos e lançar as suas start-ups. Têm uma principal preocupação com a sustentabilidade, o que não admira, se olharmos ao mundo em risco de implodir que herdaram das gerações anteriores. Mas será que teremos de escolher entre lucro e sustentabilidade? Será impossível ambos caminharem lado a lado?
A definição de qualquer estratégia empresarial implica, antes de tudo, olhar para os dados. Um estudo feito pelo BCSD Portugal - Conselho Empresarial para o Desenvolvimento Sustentável sobre o grau de maturidade em sustentabilidade das empresas no nosso país inquiriu 67 empresas, das quais 30 grandes empresas, 31 pequenas e médias empresas (PME) e seis microempresas.
Embora compreendam a relevância da sustentabilidade e empreendam ações nesse sentido, o relato mostra que a larga maioria está apenas nas duas primeiras etapas das cinco definidas na Jornada 2030 (Conhecer, Construir, Comunicar, Consolidar e Coliderar), uma agenda comum pela sustentabilidade que alinha e demonstra a contribuição das empresas para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Acreditando que o impacto individual de cada um de nós no meio ambiente é crítico para a evolução, positiva ou negativa, das alterações climáticas, não podemos ignorar o papel das empresas e as consequências da sua atividade no planeta.
Para compreender esta realidade, voltemos aos dados. O recente retrato ambiental do nosso país elaborado pela Pordata, em colaboração com a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), mostra-nos que Portugal tem feito o seu caminho e conseguiu reduzir em 35% as emissões de gases com efeito de estufa em 2021, por comparação às emissões de 2005, sendo que cada português emitiu, naquele ano de 2021, menos toneladas de gases do que a média europeia.
Contudo, num mundo ameaçado pela destruição dos seus ecossistemas, nem tudo são rosas. Os dados revelam que a economia portuguesa é a que mais recursos naturais consome na orla mediterrânica - Portugal terá consumido cerca de 174 milhões de toneladas de materiais em 2021, equivalente a um rácio de 16,9 toneladas por habitante.
Sermos confrontados com dados deste calibre é difícil, mas necessário para entendermos que o empreendedorismo do futuro deverá estar baseado no incremento da eficácia e da eficiência dos modelos de negócio a que estamos habituados.
O título deste artigo não é, de qualquer forma, uma verdade absoluta: sustentabilidade não é, necessariamente, sinónimo de rentabilidade. Aumentar a eficácia dos modelos de negócio é, sim, possível, a par da promoção da sustentabilidade, porque "sustentabilidade" não é meramente um conceito ambiental, mas também económico e, acima de tudo, social.
Se o afamado Relógio do Apocalipse nos dita cada vez menos segundos até um ponto de destruição do meio ambiente sem retorno para o sustento da vida humana, as novas gerações e a sua consciência ambiental são o único motor capaz de empurrar os ponteiros desse relógio para trás e, no mínimo, fazer regredir a descaracterização do mundo, tal como o conhecemos.
Alimento esta crença absoluta nas novas gerações pelas conversas que diariamente tenho no universo académico ou dentro do ecossistema empreendedor e pelo crescente número de programas de ignição e aceleração de empresas focados na sustentabilidade que ganham raízes no ecossistema nacional e internacional. Quero, a este propósito, mencionar o caso do Ignitio Programme, da Porto Business School, que está a formar 50 participantes, encorajando-os a lançar as suas startups a partir de ideias para uma economia mais sustentável.
Há já um conjunto muito encorajador de projetos em fase de lançamento no mercado e, para isso, o Programa disponibiliza mentores que apoiam os respetivos empreendedores nesta fase crítica para o sucesso do seu projeto.
Apostar em mais formação sobre empreendedorismo e preparar estudantes, gestores e outros agentes económicos para mais rapidamente promoverem a inovação, para saberem liderar as suas equipas de forma a fazer de cada um dos seus colaboradores um líder e para conhecerem os instrumentos de financiamento mais adequados é crítico para fomentar a sustentabilidade na definição da estratégia de um cada vez maior número de empresas.
Este é o caminho que Portugal terá de seguir - transformar a economia cinzenta de hoje numa economia verde, com uma aposta clara na descarbonização generalizada. Sustentabilidade não é antónimo de rentabilidade e as startups portuguesas percebem isso muito bem e dão-nos os melhores exemplos.
Miguel Henriques, senior lecturer na Porto Business School