As duas regiões autónomas portuguesas -- Açores e Madeira -- receberam cerca de cinco mil milhões de euros nos últimos dez anos (de 2011 a 2020) em transferências do Orçamento do Estado (OE) da República, ao abrigo da Lei das Finanças das Regiões Autónomas, indicam dados novos do Conselho das Finanças Públicas (CFP), ontem divulgados.
A Região Autónoma dos Açores (RAA) foi a mais beneficiada, com 2,8 mil milhões de euros, pois é a região mais pobre e necessitada, segundo os critérios observados pela referida lei. A Madeira (RAM) obteve 2,2 mil milhões de euros em apoios do orçamento do Estado central.
Segundo a Lei das Finanças Regionais, estas transferências acontecem ao abrigo do "princípio da solidariedade nacional visa promover a eliminação das desigualdades resultantes da situação de insularidade e de ultraperifericidade e a realização da convergência económica das regiões autónomas com o restante território nacional e com a União Europeia".
"A solidariedade nacional para com as regiões autónomas traduz-se em transferências do Orçamento do Estado" e visam também responder a "situações imprevistas resultantes de catástrofes naturais e para as quais estas não disponham de meios financeiros, visando, designadamente, ações de reconstrução e recuperação de infraestruturas e atividades económicas e sociais, bem como o apoio às respetivas populações afetadas", diz a mesma lei.
Segundo cálculos do Dinheiro Vivo a partir dos dados do CFP, o apoio reveste-se de grande importância para ambas as regiões, em termos proporcionais.
Desde 2011, as transferências equivaleram a uma média anual superior a 7,2% do PIB regional açoriano, no caso dos Açores.
No caso da Madeira, a transferência do OE significou uma injeção média anual de fundos na ordem dos 4,8% do produto madeirense, revela o estudo.
Os Açores tiveram um reforço de 3% nesses apoios em 2020 (face a 2019), recebendo 294 milhões de euros no primeiro ano da pandemia.
Já a Madeira levou um corte de 0,8%, recebendo 228 milhões de euros.
Pandemia gerou mais défice nos Açores do que na Madeira ou no País
O saldo das contas públicas da Região Autónoma dos Açores (RAA) sofreu uma deterioração muito mais acentuada no ano da pandemia, em termos relativos (medido em proporção do produto interno bruto ou PIB), quando comparado com o da Madeira ou mesmo o saldo nacional português.
Ou seja, o défice dos Açores aumentou muito mais em 2020 (face a 2019), mostra o estudo do Conselho das Finanças Públicas (CFP).
No entanto, o peso da dívida (também em percentagem dos PIB dos territórios em questão) subiu muito mais na Madeira do que nos Açores ou em Portugal como um todo.
O défice do País (em contas nacionais, as que valem para Bruxelas e para os investidores estrangeiros em dívida pública) foi de 5,7% do PIB português em 2020, segundo as contas do CFP.
O desequilíbrio orçamental da região dos Açores aumentou para 8,7% do PIB regional nesse ano de 2020.
Na Madeira (RAM), a diferença entre receitas e despesas foi de -2,8% do PIB desta região (défice) no primeiro ano da pandemia, indica o trabalho dos peritos em finanças públicas.
Assim, segundo cálculos do Dinheiro Vivo com base nos valores apurados pelo Conselho presidido por Nazaré Costa Cabral, o saldo orçamental da República passou de um excedente de 0,1% do PIB em 2019 (o primeiro da História da democracia) para um défice de 5,7% em 2020 (5,8% segundo o INE), o que representa uma descida equivalente a 5,8% do produto interno.
No caso dos Açores, que registaram um défice regional de 1,7% em 2019, viram o desequilíbrio aumentar cerca de 7% do PIB, para os referidos 8,7% do produto regional.
A Região Autónoma da Madeira (RAM) também registou uma redução do seu saldo orçamental regional, mas este movimento nesse primeiro ano de impacto da pandemia foi mais suave, por assim dizer: passou de um excedente 0,7% do produto madeirense para um défice de 2,8% em 2020. É uma descida equivalente a 3,5% do PIB face a 2019.
Dívida sobe em toda a linha, mas mais na Madeira
O ano da pandemia também foi marcado, é óbvio, pela subida do peso da dívida pública nos vários PIB considerados.
A resposta à pandemia requereu recursos avultados e isso reflete-se na herança do endividamento.
Aqui, a situação degradou-se mais, em termos relativos (peso no PIB), na Madeira, que já tinha um histórico muito negativo nas contas regionais desde o tempo da troika.
O programa de resgate obrigou ao reconhecimento de inúmeras e avultadas dívidas e prejuízos públicos por parte do governo regional, na altura liderado por Alberto João Jardim. Assim, a dívida da RAM atingiu um pico de 112,9% do PIB regional em 2015.
"Em 16 de setembro de 2011, o INE e o Banco de Portugal comunicaram que a RAM tinha procedido a vários Acordos de Regularização de Dívidas entre 2008 e 2011 respeitantes a despesas realizadas em anos anteriores e não reportadas às autoridades estatísticas, o que suscitou uma correção à despesa e dívida da RAM", recorda o CFP. As subidas foram significativas.
Mas desde 2015 que a dívida da autonomia madeirense tem vindo a descer, fixando-se em 91% em 2019, um dos valores mais baixos dos últimos anos. Com a pandemia, o rácio voltou a dar um salto, para 114,5% em 2020, indica o Conselho das Finanças.
Entre 2019 e 2020, o endividamento bruto da Madeira (também medido em contas nacionais) aumentou o equivalente a 23,5% do seu PIB.
Proporcionalmente, é muito mais do que a subida de 16,8% do PIB ao nível da República (que acabou 2020 com uma dívida de 133,6% do PIB, segundo as novas contas do CFP).