A Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom) anunciou ontem que concluiu, em apenas 90 dias, a implementação da estrutura inicial necessária para aplicar, supervisionar e fiscalizar o Regulamento dos Serviços Digitais (RSD) no mercado único da União Europeia. Desde fevereiro, o regulador é responsável pela coordenação dasenti dades envolvidas nesta supervisão, de que fazem parte, como autoridades competentes, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), no que a matéria de comunicação social e outros conteúdos mediáticos diz respeito, e a Inspeção-Geral das Atividades Culturais (IGAC), no concernente a direitos de autor e direitos conexos..O desafio é enorme, uma vez que existem centenas de plataformas digitais e estão sempre a surgir mais, e inclui a gestão de queixas dos consumidores. A responsabilidade do regulador das comunicações inclui também a gestão de queixas, tendo sido recebidas 12 até ao momento, abrangendo problemas como bloqueios de contas e inexistência de canais de comunicação com as plataformas, mas também podem estar relacionadas, entre outras questões, com conteúdos ilegais, faltas de transparência e proteção de menores. Por isso, a Comissão Europeia admite a possibilidade de cada autoridade nacional poder vir a receber até 100 mil queixas por ano..Sandra Maximiano, presidente da Anacom, e Luís Alexandre Correia, coordenador do grupo de trabalho para os serviços digitais, destacaram a celeridade na criação desta base regulatória e do modelo de financiamento, recuperando o atraso inicial de Portugal no processo. Apesar de tudo, os responsáveis referem que o país, comparativamente a outros Estados-membros “não está assim tão atrasado, estamos integrados no pelotão”..No entanto, o caminho é longo e está agora a começar, e salientam a necessidade de mais recursos humanos e técnicos no futuro, estimando que poderão ser necessários entre 15 e 20 profissionais, “um cenário ideal”, especializados em várias áreas, desde a inteligência artificial, a cibersegurança e a ciência de dados. Atualmente, a equipa conta com apenas oito a dez pessoas, mas está em avaliação a forma como a própria Anacom se vai organizar do ponto de vista interno para dar resposta ao cumprimento do RSD, até porque, explica a presidente, vai ser preciso evoluir para outro tipo de competências não só pelo regulamento, mas também pelo regulamento da IA (Inteligência Artificial): “Somos uma autoridade independente, mas não somos uma empresa privada. Estamos todos a aprender por onde vai crescer. Prevemos um crescimento gradual de recursos”..Entretanto, o relatório final elaborado pelo grupo de trabalho sobre a execução do regulamento, incluindo uma proposta de modelo de financiamento e regime sancionatório e a identificação de autoridades competentes e consequente definição do modelo de cooperação, foi entregue no final de maio para avaliação e validação ao Governo, mais concretamente aos ministérios das Infraestruturas, da Cultura e à tutela dos media, que está nos Assuntos Parlamentares..Mais literacia para consumidores.Sandra Maximiano sublinhou a importância de se apostar mais na literacia digital e concretamente no RSD, para alertar os consumidores de serviços digitais — de que fazem parte plataformas tão bem nossas conhecidas como a Google, a Temu, o Portal da Queixa, o Facebook, TikTok e tantas outras — para os seus direitos, estando previsto disponibilizar ao público formulários e linhas de orientação para apresentação de reclamações, bem como a realização de ações de formação dirigidas a entidades públicas relevantes e a prestadores de serviços intermediários e o lançamento de uma campanha de informação relativa a denúncias de conteúdos ilegais e desinformação..Luís Alexandre Correia falou ainda na necessidade de ser elaborado um estudo para identificação de quem são os prestadores de serviços intermediários em Portugal..Refira-se que o Regulamento (UE) 2022/2065 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de outubro de 2022, relativo a um mercado único para os serviços digitais e que altera a Diretiva 2000/31/CE (Regulamento dos Serviços Digitais ou RSD), tem por objetivo contribuir para o bom funcionamento do mercado interno para serviços intermediários, mediante o estabelecimento de regras harmonizadas para um ambiente em linha seguro, previsível e fiável, que facilite a inovação e no qual os direitos fundamentais, incluindo o princípio da defesa dos consumidores, sejam efetivamente protegidos.