Como doar bens estando vivo? 

A doação de bens em vida pode ser uma forma de evitar conflitos futuros entre herdeiros. Porém, muitas questões normalmente se levantam.
Foto: Unsplash
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Pode doar-se todo o tipo de bens? As doações pagam impostos? Como se faz uma doação? No caso da doação de bens imóveis, é necessário celebrar uma escritura? Este artigo esclarece todas estas dúvidas sobre a doação de bens em vida. 

O que é uma doação de bens em vida? 

De acordo com o nº 1 do artigo 940º do Código Civil, “Doação é o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício do outro contraente”. 

Por outras palavras, uma doação mais não é do que um contrato através do qual um outorgante doa um bem a outro, renunciando livremente à sua propriedade sobre esse bem. 

Ainda assim, existem três nuances a ter em conta quando se aborda este tema que, por vezes, pode acabar por ser sensível: 

  • Não podem ser efetuadas sobre bens futuros; 

  • Têm de ser feitas em vida; 

  • O doador não pode delegar a definição deste contrato ou a designação do donatário num terceiro, nem por mandato (esta regra diz respeito ao caráter pessoal da doação). 

Como fazer uma doação? 

Segundo o artigo 948.º do Código Civil, todos os que possam contratar e dispor dos seus bens têm a capacidade de fazer uma doação em vida e essa capacidade é regulada pelo estado em que o doador se encontrar ao tempo da declaração negocial. 

Tomemos como exemplo o caso da Nádia, filha única a quem a sua mãe quis doar o apartamento T1 que comprou nos seus tempos de solteira e que rapidamente se tornou pequeno para toda a família. Que etapas vão ter de passar para concluir a doação? 

  1. Recolher todos os documentos: documentos de identificação, licença de habitação, certidão de teor e caderneta predial; 

  1. Reserva de usufruto: a reserva de usufruto consiste na possibilidade de quem doa poder reservar para si, ou para terceiros, o direito a usufruir dos bens doados. 

  1. Fazer a escritura da doação: é necessário celebrar por escritura pública ou documento particular autenticado. 

As doações de bens em vida pagam impostos? 

É importante considerar as obrigações fiscais associadas à doação de bens em vida, no entanto, a maioria das doações comuns nesse contexto são isentas. 

O grau de parentesco entre o doador e o beneficiário é o principal fator relevante em termos fiscais para as doações. Geralmente, de acordo com as regulamentações do Código do Imposto do Selo (CIS), a doação implica um imposto correspondente a 10% do valor dos bens móveis doados, com um acréscimo de 0,8% para bens imóveis. 

Ainda assim, as doações estarão isentas de Imposto do Selo se forem realizadas a favor de: descendentes (filhos e netos), ascendentes (pais e avós) e cônjuge/unido de facto. 

Quem pode revogar uma doação? 

Uma doação pode ser revogada se o beneficiário ou os seus descendentes morrerem antes do doador. É também possível que seja anulada por vontade própria do doador. De qualquer das formas, para bens sujeitos a registo, como um imóvel ou até um veículo, essa reversão terá de ser devidamente registada. 

Segundo o Código Civil, outra das causas para uma possível revogação é a por ingratidão. Isto significa que, caso o donatário seja considerado indigno de receber a doação ou se verifique alguma das condições que determinam a deserdação de um herdeiro legítimo (como um crime com pena superior a seis meses de prisão contra o doador ou familiar), é possível reverter uma doação em vida. 

É de realçar que, segundo o artigo 976.º do Código Civil, a ação de revogação por ingratidão não poderá ser proposta após a morte do donatário nem pelos herdeiros do doador, a não ser que o donatário tenha cometido o crime de homicídio contra o doador ou outra causa que o tenha impedido de revogar a doação. Nesse caso, os herdeiros do doador terão um ano a contar desde a morte do mesmo para propor a revogação. 

No entanto, a revogação por ingratidão não poderá ser executada se a doação for feita para casamento, se for remuneratória ou se o doador perdoar o donatário. 

Em que situações pode uma doação ser considerada nula? 

  1. Entre pessoas casadas se o regime de casamento for o da separação de bens; 

  1. Entre um cônjuge e outra pessoa com quem o primeiro cometeu adultério, salvo se, à data da doação, já estava concluído o processo de divórcio ou se já havia uma separação de facto há mais de seis anos; 

  1. Por pessoas consideradas legalmente interditas/inabilitadas, a favor do seu tutor ou administrador de bens; 

  1. Por uma pessoa doente a favor de um médico ou enfermeiro que esteja envolvido no seu tratamento, se a doação ocorrer durante a doença e o paciente vier a falecer dela; 

  1. Por uma pessoa doente a favor de um padre que preste auxílio espiritual, se a doação ocorrer durante a doença e o paciente vier a falecer dela; 

  1. A favor de um notário ou de uma entidade com funções similares que tenha intervindo no processo. 

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