Os valores das pensões e dos apoios sociais voltam a estar seriamente comprometidos num futuro próximo por causa das perspetivas de crescimento medíocres da economia até 2035 (mesmo contando com o impulso do PRR e os outros fundos europeus), do envelhecimento acelerado da população, da falta de pessoas capazes de trabalhar e da ascensão das máquinas (quando a tecnologia e a automação substitui definitivamente os trabalhadores).
Um novo estudo do Conselho das Finanças Públicas (CFP), ontem divulgado, faz um retrato sombrio do que pode acontecer.
Em 2007, Portugal fez uma reforma profunda do sistema de pensões público e dos apoios sociais.
As prestações foram sendo reduzidas em nome da sustentabilidade do sistema previdencial. Portugal é um caso de sucesso neste tema, sempre muito elogiado quando aos resultados obtidos por essa reforma (do então ministro José Vieira da Silva), mas segundo as novas contas do CFP, a reforma implementada pode não chegar.
No caso das pensões, o CFP defende que "é necessário ter em consideração os impactos causados pelas possíveis mutações do mercado de trabalho, derivadas do progresso tecnológico (substituição de trabalhadores por máquinas) e da globalização (deslocalização das empresas para países com menores custos salariais), com fortes implicações económicas e sociais".
"Os sistemas de pensões de repartição, como é o caso português, necessitam de se preparar para acomodar a crescente atipicidade laboral e hiatos contributivos no quadro desta nova realidade tecnológica", acrescenta.
Além disso, "as alterações demográficas constituem um fator determinante da sustentabilidade das finanças públicas do lado da despesa". É o envelhecimento da população. Há menos bebés e as pessoas vivem mais anos. A imigração também não ajuda. Se a economia portuguesa tiver pouco potencial, vêm menos pessoas. E a emigração também tende a aumentar, por exemplo.
"A conjugação do aumento da esperança de vida com as baixas taxas de natalidade e um menor fluxo líquido de migração acentua a tendência de envelhecimento da população, com reflexo direto na despesa pública", diz o estudo.
Assim, "as despesas associadas ao envelhecimento da população, principalmente as relativas a pensões e saúde, têm apresentado um aumento contínuo ao longo do tempo, colocando desafios económicos, orçamentais e sociais".
"De acordo com as recentes projeções da despesa para o médio e longo prazo, publicadas no 2021 Ageing Report [da Comissão Europeia], serão necessários esforços adicionais em termos de finanças públicas para manter o nível de benefícios sociais hoje concedidos".
Pior. "Este esforço poderá até estar subavaliado nesse exercício, uma vez que a diminuição prevista do valor futuro das pensões de velhice do sistema contributivo coloca pressões adicionais no sistema não contributivo".
Isto é, "à medida que o valor das pensões se aproxima do valor legal mínimo, maior o número de beneficiários que terá acesso a prestações complementares previstas no sistema não contributivo".
Assim, é importante "fazer uma avaliação da adequação dos benefícios futuros atribuídos pelos sistemas de pensões, incluindo os efeitos das reformas adotadas" e "assegurar uma adequada partilha de riscos entre gerações, assim como uma distribuição justa de rendimento entre idosos pensionistas e as futuras gerações".
"A diminuição esperada no valor futuro das pensões de velhice do sistema contributivo poderá, no caso português, colocar pressões adicionais no sistema não contributivo", avisa o Conselho presidido por Nazaré Costa Cabral.
Outra década perdida
No mesmo estudo sobre os riscos orçamentais e a sustentabilidade das contas públicas, o CFP prevê que o crescimento da economia portuguesa deve esvair-se nos próximos anos, mesmo com uma boa execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e sem novos choques adversos (como novas pandemias e outros eventos, como uma mudança na política de juros baixos do BCE).
"Na ausência de choques, o ritmo de crescimento da economia deverá convergir para 0,7% no longo prazo, em linha com o crescimento potencial estimado para a economia portuguesa", diz.
Este potencial é referido por muitos economistas como débil e, diz o CFP, fica "próximo do crescimento médio observado entre 2002-2019 - período compreendido entre a introdução do euro e o início da pandemia". Numa linguagem menos coloquial, a economia parece que não sai da cepa torta.
Ou seja, mesmo com fortes impulsos de fundos europeus e uma política monetária (do BCE - Banco Central Europeu) extremamente expansionista (juros baixos, quase zero ou mesmo negativos), a capacidade de capital instalada não chega para propagar mais riqueza adicional no futuro.
Fazendo a média de 2026 a 2035 (1,4% e depois 0,7%) dá um crescimento de apenas 1% na década a seguir ao PRR, basicamente.