Centeno deixa garantia para quando deixar de ser governador: “É evidente que vou ficar no Banco de Portugal"

Numa audição no Parlamento, Mário Centeno lembra que está na instituição há 35 anos. Criticou ainda a divulgação de “forma truncada” de dados sobre novo edifício.
Centeno deixa garantia para quando deixar de ser governador: “É evidente que vou ficar no Banco de Portugal"
MIGUEL A. LOPES/LUSA
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O governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, confirmou hoje no parlamento que vai continuar na instituição depois de sair do cargo, esperando respeito pela sua carreira de 35 anos no banco.

“É evidente que eu vou ficar no Banco de Portugal. Eu estou no Banco de Portugal há 35 anos”, afirmou, depois de ser questionado pelas bancadas parlamentares do PSD e CDS-PP se irá continuar a trabalhar no banco central.

Mário Centeno intervinha numa audição na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (COFAP), onde foi chamado a falar sobre o plano de atividades do banco central e, a pedido do CDS-PP, sobre o contrato de compra do novo edifício central do BdP celebrado com a seguradora Fidelidade.

Durante a audição, os deputados Alberto Fonseca (PSD) e Paulo Núncio (CDS-PP) quiseram saber o que fará o atual governador quando deixar a liderança da instituição, na qual será sucedido pelo economista Álvaro Santos Pereira, ex-ministro da Economia do Governo de Pedro Passos Coelho.

Paulo Núncio afirmou que Santos Pereira mostrou publicamente não querer que o atual governador continue no BdP e, por isso, quis saber o que fará o atual. Núncio referia-se ao facto de o sucessor de Centeno, ouvido no parlamento em 17 de setembro, ter afirmado que “nunca ficaria nos quadros do banco depois de ser governador”.

Depois de ser questionado várias vezes sobre o assunto, Centeno respondeu afirmativamente, mostrando esperar que a sua carreira seja respeitada.

“O senhor deputado sabe o que são 35 anos? O senhor deputado sabe o que são 35 anos de uma carreira? O senhor deputado está disponível para respeitar uma carreira de 35 anos?”, perguntou, para, de seguida, acrescentar: “Eu acho que toda a gente vai estar [disponível para respeitar o seu passado profissional]”.

Num primeiro momento, o atual governador citou exemplos de antigos administradores da instituição que passaram a ser consultores do Conselho de Administração, depois de terminarem o mandato neste órgão, referindo os exemplos de Helder Rosalino (ex-administrador), José de Matos (ex-vice-governador), Pedro Duarte Neves (ex-vice-governador) e Vítor Constâncio (ex-governador).

“O meu caso não é diferente”, afirmou, embora sem clarificar se o mesmo acontecerá no seu caso.

Mais tarde, Paulo Núncio retomou o assunto, perguntando se vai continuar na instituição. Centeno começou por não responder à pergunta.

Perante a ausência de esclarecimento, o deputado do PSD Alberto Fonseca insistiu no tema e Paulo Núncio também repetiu a pergunta, levando Centeno a esclarecer nessa altura que continuará no BdP.

Paulo Núncio também perguntou a Centeno se o atual chefe de gabinete, Álvaro Novo, presente na audição ao seu lado, foi nomeado para “algum cargo de topo” na última reunião do Conselho de Administração, realizada esta semana.

Centeno começou por não abordar o assunto, o que levou o parlamentar a insistir num esclarecimento.

O governador disse que “o professor Álvaro Novo não vai ser despedido do BdP”. Perante a resposta, o deputado pediu uma resposta direta. “Foi nomeado ou não foi nomeado, senhor governador? Responda por uma questão de transparência”, reagiu Paulo Núncio.

O governador disse que já tinha respondido, acrescentando: “Se o senhor professor Álvaro Novo vai deixar de ser chefe de gabinete, vai ocupar outra função. Se o senhor deputado considera que isso é uma nomeação, [sim], foi [nomeado para um cargo pelo Conselho de Administração]”.

Centeno já foi consultor da administração do BdP entre dezembro de 2013 e novembro de 2015, após sair de diretor adjunto do Departamento de Estudos Económicos do BdP, e antes de ser ministro das Finanças (Governos PS, de António Costa).

O Governo anunciou em 24 de julho que o próximo governador será Santos Pereira. O economista foi ouvido no parlamento em 17 de setembro, um passo necessário para ser designado pelo executivo, tendo a COFAP emitido hoje um parecer positivo à sua nomeação.

Centeno critica divulgação de “forma truncada” de dados sobre novo edifício

Mário Centeno criticou a divulgação de informação confidencial e transmitida de “forma truncada”, numa referência à construção do novo edifício central da instituição, no centro de Lisboa.

Numa audição na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (COFAP), onde foi chamado a falar sobre o plano de atividades do banco central e, a pedido do CDS-PP, sobre o contrato de compra do novo edifício central do Banco de Portugal (BdP) celebrado com a seguradora Fidelidade, Mário Centeno disse que “o novo edifício é uma realidade em construção e [que] à vista de todos”.

De seguida, deixou críticas à divulgação de informação confidencial.

“O banco falhou momentaneamente quando permitimos que informação confidencial e sensível fosse divulgada publicamente, quando reuniões do Conselho de Administração do banco foram transmitidas de forma truncada e [quando] dados sujeitos a sigilo foram postos expostos publicamente. Não podemos tolerar”, disse, na intervenção inicial.

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Santos Pereira critica Centeno em várias frentes

Embora nesta afirmação não tenha referido o caso do contrato assinado com a seguradora Fidelidade, a declaração foi feita nesse contexto.

Em 21 de julho, o jornal online Observador noticiou que o valor das futuras instalações será superior aos 192 milhões de euros da transação acordada, pois o valor refere-se apenas às obras estruturais (não contando com acabamentos, pinturas, pavimento final, acabamentos interiores, entre outros), estimando o jornal que o custo total possa subir para 235 milhões de euros.

O jornal noticiou ainda haver alertas de consultores do Banco de Portugal, designadamente sobre os licenciamentos e a eventual necessidade de avaliação de impacte ambiental na construção do parque de estacionamento.

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Nessa altura, numa entrevista à RTP em 25 de julho, Mário Centeno disse que o Ministério das Finanças recebeu “todas as informações” sobre a compra das novas instalações, porque o BdP enviou ao Governo “toda a lista de questões que estavam levantadas no edifício em fevereiro deste ano, juntamente com as avaliações numa data posterior quando elas foram concluídas e com o contrato de promessa de compra e venda”. Considerou “muito leviano” o leque de dúvidas levantadas no espaço público.

Na intervenção inicial desta quinta-feira, Centeno não referiu este facto, mas considerou ter sido uma falha da sua liderança ter partilhado informação com terceiros, numa referência indireta a este projeto.

“Os elevados padrões éticos do banco são parte constitutiva da sua existência e responsabilidade secular. É obrigação do banco defendê-los, respeitando todas as garantias constitucionais dos seus trabalhadores, e de todos os que dependem do banco para as suas vidas diárias, que são todos os portugueses e todos os que olham para Portugal para viver, visitar ou comerciar”, referiu.

Na audição, Centeno foi confrontado pelo deputado do PSD Alberto Fonseca sobre o facto de ter voltado a nomear o economista Álvaro Novo como seu chefe de gabinete a poucos dias de se ficar a saber se o atual governador seria reconduzido ou se o Governo optaria por nomear um novo governador.

Mário Centeno invocou as regras das comissões de serviço para dizer que não deixou “nenhum chefe de gabinete” para o sucessor.

Centeno disse ainda que foi uma “honra” ter sido governador e reclamou haver hoje maior estabilidade no sistema bancário.

"O sistema bancário concluiu com notório sucesso uma inversão do ciclo económico-financeiro iniciada há quase dez anos”, afirmou, sublinhando que, nesse processo, “merecem destaque” a venda do Eurobic ao Abanca em 2024 e “a recente proposta de aquisição do Novo Banco” pelo grupo francês BPCE.

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