Os beneficiários finais que estão a receber mais rapidamente os apoios do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) são famílias, escolas e empresas privadas, de acordo com informações da Estrutura de Missão Recuperar Portugal, que fez o levantamento dos dados disponíveis até ao passado dia 20 de agosto.Todos estes conjuntos de beneficiários finais registam taxas de pagamento superiores a 50% do valor total que lhes foi atribuído (e aprovado).Segundo a missão do PRR, uma entidade criada pelo anterior governo do PS, em maio de 2021, "com os objetivos de negociar, contratualizar e monitorizar a execução" do Plano dos 22,5 mil milhões de euros (no caso português), a taxa de execução nacional continua relativamente baixa, mas em linha com a média europeia.Ou seja, a maioria dos países estão atrasados, seja na aprovação de metas, nas reformas e obras a fazer, seja na execução financeira propriamente dita.É por essa razão que vários responsáveis já começam a falar da necessidade de prolongar os prazos do PRR (aprovação de verbas e pagamentos efetivos de fundos) para além de 2026, caso contrário muito do dinheiro será desperdiçado ou não será usado.Em Portugal, foram pagos apenas 39% dos fundos aprovados quando falta pouco mais de um ano para o PRR terminar (final de 2026).O PRR foi criado em meados de 2021 para ajudar as economias europeias a recuperarem da destruição do tempo da pandemia covid-19 e, ato contínuo, fazerem mais reformas estruturais orientadas para as altas tecnologias e mais amigas do ambiente. Segundo o novo balanço (até 20 de agosto) da Estrutura de Missão presidida por Fernando Alfaiate, o PRR português tem um total de 22,5 mil milhões de euros para distribuir. Mas, passados quase quatro anos de Plano, só foram pagos 8,8 mil milhões de euros. Dá a referida taxa de lamento de 39%.O sector das "famílias" é o que tem recebido mais rápido. Quase 83% dos fundos inicialmente atribuídos já foram pagos, isto é, 262 milhões de euros já chegaram a estes beneficiários finais.As escolas públicas e outras, que estão a usar o PRR para se modernizarem tecnologicamente e investir em energias renováveis, por exemplo, já conseguiram receber 600 milhões de euros, o que corresponde a uma taxa de pagamento de quase 58% do total atribuído.O universo enorme das "empresas privadas" ficou com a parte de leão do PRR (foram-lhe destinados 6,4 mil milhões de euros, quase 30% do pacote total). Até 20 de agosto, receberam efetivamente 3,2 mil milhões de euros do PRR, o que corresponde a uma taxa de pagamento de 50,3%.Um pouco mais atrasadas estão as verbas para as instituições do ensino superior: dos 844 milhões de euros marcados para o setor das universidades e institutos, foram transferidos 353 milhões de euros (execução de 42%).Bem pior está o universo que congrega a maioria dos serviços públicos, incluído instituições do sistema científico e tecnológico, empresas públicas e autarquias.Nas autarquias, os atrasos de pagamentos do PRR são significativos, muito elevados, mesmo. Segundo a missão, municípios e freguesias receberam apenas 25% dos valores prometidos, cerca de 1,1 mil milhões de euros de um total previsto de 4,4 mil milhões. É o pior caso quando vê em detalhe a implementação financeira por tipo de beneficiário.O sector das empresas pública não está muito melhor. Recebeu só 875 milhões de euros, 30% dos 2,9 mil milhões de euros que viu serem aprovados pelas autoridades.As instituições do sistema científico e tecnológico estão quase na mesma: têm uma verba total a receber de 659 milhões de euros até final de 2026, mas só lhes foi pago 222 milhões de euros.Pedro Avelar, economista do BPI Research que costuma seguir este tema, confirma que "apenas 39% do montante total aprovado no PRR foi entregue aos beneficiários finais até ao final de julho de 2025"."O desenvolvimento dos projetos aparenta estar atrasado, faltando menos de um ano e meio até ao término do prazo para a sua execução", considera.Os piores casos, confirma o economista, são de facto "a execução dos projetos ao nível das autarquias e das empresas públicas, que permanece a baixo ritmo, com menos de 30% dos fundos orçamentados já entregues".Já as famílias "constituem o grupo que recebeu mais fundos em termos percentuais", mais de 80% do total aprovado.O PRR está organizado por grandes temas e tipos de reformas estruturais, as chamadas "dimensões".Segundo Pedro Avelar, "em termos de dimensões, a transição digital é a que apresenta um nível de execução mais elevado, com 45% dos fundos alocados já pagos"."Os projetos no âmbito da transição climática e resiliência apresentam uma taxa de pagamento de 40% e 37%, respetivamente".Na dimensão "resiliência", o economista diz que a componente do "Serviço Nacional de Saúde (SNS) apresenta um montante aprovado de 2 mil milhões de euros (9% do montante do PRR destinado a Portugal)", mas "no entanto apenas foram pagos 378 milhões de euros (18% da respetiva dotação) até ao final de julho de 2025". Como se explica tão grande atraso? Segundo o mesmo investigador, "de facto, existem projetos ao nível do SNS cuja concretização aparenta estar em risco, como é o caso da construção do Hospital Lisboa Oriental". Nem sequer está a ser acompanhado, tão parca é a informação que existe.Além deste enorme investimento público hospitalar, avaliado em 350 milhões de euros, dos quais 100 milhões serão financiados pelo PRR, o analista do BPI também considera que do lado dos projetos da componente habitação "também se registam atrasos na execução, devido às capacidades instaladas para dar resposta às várias solicitações de construção civil (só foram pagos 37% do total orçamentado)".Isto é, não há capacidade, empresas, máquinas e mão-de-obra suficiente para responder às necessidades de construção do país. O problema nem sequer é novo e desde há vários anos que tem vindo a penalizar o investimento público e privado.Comparação internacionalNo mesmo estudo agora publicado, questiona-se: "Mas como se compara Portugal aos outros países da União Europeia? Será este atraso apenas visível no caso português ou é algo transversal aos restantes Estados-Membros?"De acordo com o economista do BPI, o montante concedido a Portugal no âmbito do PRR (os mais de 22 mil milhões de euros) "equivale a 8,3% do Produto Interno Bruto (PIB), uma percentagem que é superior à da generalidade dos países ".É o dobro do peso médio de todos os PRR a nível europeu, que "equivale a sensivelmente 4% do PIB da União Europeia", calcula o analista."O país que mais recebeu, em percentagem do seu PIB, foi a Grécia, seguida da Croácia e Espanha."Nos montantes já entregues aos respetivos países, as verbas que são transferidas da Comissão Europeia para o governo e as entidades públicas que guardam o dinheiro das tranches até ao pagamento final, "Portugal encontra-se ligeiramente acima da média (55%), com 57% do montante acordado já entregue ao país. França já recebeu 85% do montante aprovado".Como referido, no caso do PRR de Portugal, "apenas 39% já foi efetivamente entregue aos beneficiários finais", mas "é de prever que a entrega comece a aumentar de ritmo à medida que nos aproximamos do término do prazo de execução", acredita o analista."Portugal cumpriu até à data 40% do número de objetivos a que se propôs no âmbito do PRR (111 investimentos e 66 reformas), de um total de 438 objetivos. Desta forma, Portugal situa-se na média da UE. França é o país que tem mais objetivos cumpridos (82%), seguindo-se a Dinamarca (60% de cumprimento)."O economista refere que "esta análise permite concluir que a concretização dos projetos (medida através do cumprimento dos objetivos) encontra-se aquém do desejado para a grande maioria dos países da UE, havendo 15 países com uma percentagem de objetivos cumpridos inferior à de Portugal (aliás, Portugal posiciona-se precisamente na média dos países em termos de concretização de objetivos)". "O caso mais preocupante é a Hungria, que até ao momento ainda não cumpriu qualquer objetivo que tenha proposto", diz o mesmo investigador.Razões de preocupaçãoPortugal está atrasado no PRR, mas está na média europeia, o que significa que não é o pior caso.No entanto, há razões para ficar em alerta máximo.O prazo para cumprir as metas – que depois dão acesso aos fundos que ainda faltam atribuir do PRR – está prestes a expirar (falta pouco mais de um ano para o encerramento do Plano) e o governo já percebeu que vários investimentos financiados pelo envelope dos 22 mil milhões de euros são "impossíveis de concretizar", pelo que decidiu começar a retirar vários da lista do PRR, revelou recentemente a Comissão Nacional de Acompanhamento do PRR (CNA-PRR). Na avaliação anterior a este, não constava qualquer investimento ou projeto "retirado" do PRR. Hoje, já não é assim.A comissão presidida por Pedro Dominguinhos nota agora que, no âmbito da reprogramação dos PRR (algo que acontece em muitos países da União Europeia) Portugal (o governo) optou pela a "retirada de vários investimentos ou sub-investimentos cuja execução se revelava impossível de concretizar".São eles, designadamente, "o Empreendimento de Fins Múltiplos do Crato, a Linha Violeta (Loures-Odivelas) do Metropolitano de Loures, a Tomada de Água do Pomarão, a Dessalinizadora do Algarve, bem como [a ampliacão] do edifício do Centro Científico e Tecnológico da Madeira (CITMA), na Região Autónoma na Madeira, e o investimento nos navios de transporte de passageiros e veículos na Região Autónoma dos Açores", elenca a CNA.Além disso, refere uma "redução de ambição em alguns investimentos, como o projeto da Habitação a Custos Acessíveis, a linha BRT Braga, os Vouchers para Startups, o projeto Coaching 4.0, a Rede Nacional de Test Beds e os Digital Innovation Hubs (entre outros)", acrescentam os avaliadores.A desistência ou a redenominação das fontes de financiamento (veja-se o caso da Linha Violeta, no Porto, obra que continua a andar, mas será financiada por fundos europeus clássicos em vez do PRR por serem mais fáceis de aceder e executar no tempo) reflete-se, claro está, numa série de indicadores e sinais que mostram claramente que o PRR português continua bastante atrasado e muitos investimentos em risco, alguns até em estado "crítico", segundo a CNA.Pressão para aliviar a pressãoPortugal e tantos outros países da Europa defrontam-se com este mesmo problema: a dificuldade em gastar o dinheiro do PRR, a demora no arranque de projetos e investimentos, designadamente quando envolve áreas como habitação e obras públicas grandes.Ciente disto, o Parlamento Europeu (PE) aprovou há semanas, por esmagadora maioria, uma resolução (não vinculativa) que daria aos Planos de Recuperação e Resiliência (PRR) mais 18 meses, prolongando-lhes a vida de agosto de 2026 até fevereiro de 2028.A medida estava desenhada para salvar projetos "maduros" em curso e outros grandes investimentos, além do referido limite oficial de agosto de 2026, altura em que termina o prazo para a execução das metas e etapas que depois abrem a porta ao recebimento dos respetivos fundos dos PRR, às subvenções e aos empréstimos (a serem pagos até dezembro de 2026).Problema: a Comissão Europeia (CE) – que tem a tutela dos PRR e foi a autora, em 2021, destes programas de fundos europeus para ajudar os países a combater os efeitos destruidores da pandemia – está liminarmente contra qualquer alteração às regras dos PRR neste ponto do tempo, isto é, quando falta pouco mais de um ano para o prazo final.Fonte oficial da CE explica que reprogramar, simplificar e rearranjar metas e etapas ao nível do PRR até pode ser, e está a acontecer, mas alterar as datas e os prazos combinados nem pensar.Vamos ver daqui a mais uns meses, já em 2026, quando o PRR estiver na reta final e se ainda sobrarem milhões e milhões do pacote..Foram pagos mais 48 milhões do PRR. Empresas são quem mais recebe