A Tabaqueira, filial portuguesa do gigante multinacional do tabaco Philip Morris International (PMI), pediu ao Governo uma ajuda “vital” para se candidatar internamente a novos investimentos, revela uma carta enviada em janeiro ao gabinete do primeiro-ministro, a que o DN teve acesso. “Sendo objetivo da Tabaqueira apresentar publicamente, em breve, este programa de atração de investimento, vimos por este meio dar conhecimento da nossa intenção a Sua Excelência, o Senhor Primeiro-Ministro, e, naturalmente, sublinhar a importância vital do apoio do seu Governo a esta causa”, refere a carta, assinada por Pedro Nunes dos Santos e Marcelo Nico, respetivamente presidente do conselho de administração e diretor-geral da subsidiária portuguesa da PMI. A PMI é a maior produtora e vendedora mundial privada de tabaco, tendo tido um lucro operacional de 15 mil milhões de dólares (12,91 mil milhões de euros) em 2024. A Tabaqueira vende em Portugal algumas das principais marcas no mercado, como o Marlboro, Chesterfield, SG e Português, para além da marca IQOS (tabaco aquecido). Em Portugal, o grupo emprega mais de 1.500 pessoas. A carta enviada pela Tabaqueira ao gabinete do primeiro-ministro tem data de oito de janeiro de 2025 e cinco dias depois, a 13 de janeiro, a Tabaqueira “inundava” o Governo português com cartas de teor semelhante, enviadas ao ministro das Finanças, ao ministro da Economia, ao ministro dos Negócios Estrangeiros e aos ministros da Presidência e do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social. Até agora, a Tabaqueira ainda não apresentou publicamente qualquer programa de atração de investimento. Na comunicação ao Governo a empresa diz, no entanto que, em janeiro de 2025, “iniciará a concretização da candidatura internacional à produção de produtos sem fumo da PMI”. “Vamos competir com muitos outros países europeus que estão a fazer uma forte campanha pela atração de novos investimentos”, diz a carta, sendo neste contexto de competição entre subsidiárias da PMI que é pedida a ajuda ao Governo. A empresa não explicita na carta que auxílios gostaria de receber do Executivo, mas solicita audiências aos membros do Governo com o objetivo de apresentar mais informação sobre esta “campanha internacional” para produzir em Portugal produtos de tabaco sem fumo que, diz, “convoca um amplo apoio nacional”.Questionada pelo DN sobre eventuais desenvolvimentos no seguimento das cartas, a Tabaqueira sublinhou, em resposta oficial, que “mantém um diálogo institucional público, transparente, regular e construtivo com o Governo, como é expectável de qualquer empresa responsável que procura continuar a investir, inovar e criar valor para Portugal. As comunicações estabelecidas enquadram-se nesse relacionamento saudável e responsável e visam assegurar um ambiente regulatório estável, baseado na ciência e na evidência, fundamental para sustentar decisões de investimento com impacto económico e social”.Por outro lado, a empresa apontou o “papel estruturante” que tem na economia nacional, sendo responsável por exportações que, em 2024, ascenderam a mais de 800 milhões de euros. “E o contributo para as receitas fiscais do Estado ultrapassou os 1,19 mil milhões de euros, o que a posiciona como uma das principais entidades exportadoras e contribuintes portuguesas”, sublinhou.“Paralelamente, o Grupo Philip Morris International, do qual a Tabaqueira faz parte, escolheu Portugal para instalar o seu centro global financeiro e o segundo maior centro de tecnologia e serviços partilhados a nível mundial, com uma exportação de serviços superior a 58 milhões de euros no último ano. A breve trecho, será ainda inaugurado em território nacional um hub global dedicado à inteligência artificial”, revelou a Tabaqueira.Neste sentido, a Tabaqueira reafirmou que entende que “Portugal tem condições únicas para continuar a captar investimento industrial estratégico. A empresa tem vindo a reforçar o seu posicionamento como centro de excelência produtiva, com mais de 420 milhões de euros investidos desde a privatização da Tabaqueira, e está a avaliar novos projetos de dezenas de milhões de euros que podem consolidar empregos, promover inovação tecnológica e acelerar a transição para produtos sem combustão”.Em março passado, o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, visitou a fábrica da Tabaqueira, tendo sido recebido por Marcelo Nico, segundo as redes sociais do Diretor-Geral da empresa em Portugal. Este solicitou também, na carta ao Ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, uma audiência durante a Reunião Anual do Fórum Económico Mundial, em Davos, Suíça, não havendo indicação de que o ministro tenha acedido.Sector quer regulamentação das bolsas de nicotina Segundo as fontes do DN, um dos principais objetivos da Tabaqueira e de outras empresas do sector é a introdução da categoria fiscal de bolsas de nicotina e a sua regulamentação. São 22 os Estados-membros da União Europeia (UE) em que as bolsas de nicotina são reguladas, sendo Portugal um dos cinco em que isso não acontece. Acresce que são 15 os Estados-membros que tributam as bolsas de nicotina com impostos especiais de consumo. Atualmente, as bolsas de nicotina são comercializadas em Portugal sem regulamentação. A Tabaqueira não as comercializa. O Jornal de Notícias noticiou a existência de um ofício da Autoridade Tributária, de março de 2024, que decreta que “a importação e comercialização em território nacional de bolsas de nicotina está dependente da apresentação de uma Autorização de Introdução no Mercado”, passada pelo Infarmed que, segundo aquele diário, negou a entrada do produto “por ter efeitos farmacológicos e por todos os perigos que a sua utilização pode acarretar”. Esta é uma das situações que a Tabaqueira gostaria de ver alterada, segundo fontes do setor, até porque a venda ilegal de produtos de outras marcas já é vulgar em Portugal.Na passada segunda-feira, o Diário da República publicou um despacho do Gabinete da Secretária de Estado dos Assuntos Fiscais que determina um aumento de dois por cento da estampilha fiscal para os produtos sujeitos a imposto sobre o tabaco, que se aplica em 2026. Em 2024, com aplicação no corrente ano, este aumento tinha sido de quatro por cento. “Este aumento poderá depois ser repercutido no preço a cobrar ao consumidor final”, disse ao ECO o fiscalista António Brigas Afonso, especialista em impostos especiais sobre o consumo.