A presidente do Tribunal de Contas (TdC) rejeita que a instituição seja usada como “bode expiatório” para atrasos nos contratos públicos, lembrando que, por vezes, os processos têm de ser devolvidos às entidades administrativas por não estarem “suficientemente instruídos”.Em entrevista à agência Lusa, Filipa Calvão explica que “o tribunal cumpre os tempos legais” dos 30 dias úteis para emitir um visto prévio nos processos sujeitos a fiscalização prévia e sublinha que a média de aprovação está em “12 dias úteis”.“Quando os processos não vêm suficientemente instruídos por parte das entidades administrativas, [o TdC] faz devoluções. E no período em que o processo volta para a entidade para [o] instruir de forma mais completa, a contagem do prazo para e é depois retomada. Isso faz atrasar um pouco, mas muitas vezes também atrasa porque as próprias entidades têm dificuldade em completar a informação (...) com todos os elementos necessários”, afirma.“Esta narrativa de que os atrasos da administração pública – designadamente na execução dos fundos europeus, mas também no contexto da contratação pública (...) – são imputáveis ao tribunal é claramente forçada, ou seja, o principal causador de alguma morosidade da administração pública não é seguramente o tribunal”, diz.As posições de Filipa Calvão surgem depois de o ministro Adjunto e da Reforma do Estado, Gonçalo Matias, ter anunciado em 03 de novembro que o Governo quer rever o Código de Contratos Públicos, o Código de Procedimento Administrativo e a Lei de Organização do Tribunal de Contas, prevendo a apresentação da proposta no parlamento para janeiro.Filipa Calvão sublinha que “não é necessariamente a fiscalização prévia que atrasa a administração pública”.“É certo que em relação a alguns atos de despesa pública, alguns contratos públicos, o tribunal recusa o visto. E quando recusa o visto, evidentemente isso significa que já não é por ali - através daquele contrato - que se consegue realizar o interesse que aquele contrato visava realizar. Mas isso não é causa de morosidade: é simplesmente entendimento do tribunal de que aquele contrato não está em condições de produzir efeitos porque contraria a lei”, diz.“A narrativa, criada em vários contextos, mas essencialmente no contexto político, é uma narrativa de arranjar aqui um bode expiatório”, contesta.Filipa Calvão avisa que esse argumento deve ser usado com “cautela” sob pena de, com a revisão legislativa anunciada, o poder político e administrativo deixar de poder atribuir as responsabilidades ao tribunal.“[O argumento] deve ser utilizado com cautela, diria eu, porque se matam o bode – passe aqui a expressão –, se extinguem o visto, ou a fiscalização prévia, ou se a reduzem substancialmente, deixam de ter uma explicação fácil para o atraso na prossecução do interesse público e, portanto, é preciso ter aqui também alguma cautela de quem usa esse argumento, porque se pode virar contra a própria administração pública”, afirma.A presidente do Tribunal de Contas esclarece que a instituição “não é contra” uma revisão da lei, desde que as mudanças não deixem a gestão da despesa pública “à solta”, sem controlo..TdC alerta que receita do imposto sobre lucros extraordinários dos supermercados continua retida